Projeto levou polêmica ao Parlamento

Joseana Paganine | 31/08/2015, 18h42

Se, por um lado, levar o debate sobre a abolição para o âmbito legislativo ajudou a acalmar as ruas, por outro, no próprio Parlamento os ânimos se viram acirrados com a apresentação do projeto que redundou na Lei dos Sexagenários. A proposta foi responsável pela renúncia do presidente da Câmara, pela dissolução e formação de uma nova Assembleia Geral e pela escolha de um novo presidente do Conselho de Ministros (cargo equivalente ao de primeiro-ministro) pelo imperador dom Pedro II.

O projeto número 48 foi apresentado à Câmara dos Deputados em 15 de julho de 1884 pelo deputado Rodolfo Dantas, do Partido Liberal. A proposta dispunha sobre a emancipação dos escravos por idade igual ou superior a 60 anos, por omissão de matrícula (registro legal a ser feito pelo proprietário), por fundo de emancipação e por transgressão de domicílio (quando o escravo era levado de uma província a outra sem autorização).

Também estabelecia uma tabela de preços dos escravos, o que punha fim a controvérsias sobre o valor que um escravo precisava dispor para comprar sua liberdade. O principal ponto de discórdia, porém, não estava no teor do Projeto Dantas, mas naquilo que ele não previu: a indenização aos proprietários dos escravos alforriados.

Parte expressiva dos parlamentares se manifestou contra a medida. A indignação foi grande inclusive entre os deputados do Partido Liberal, o mesmo de Dantas . E, sobretudo, entre os do Partido Conservador, tradicionalmente contra a abolição e defensor dos interesses das elites cafeicultoras. No mesmo dia, o presidente da Câmara, Moreira Barros, demitiu-se da Presidência da Casa por não concordar com o projeto. A crise cresceu e, em setembro, a Câmara foi dissolvida pelo imperador por incompatibilidade com o gabinete de ministros.

A solução começou a se delinear quando assumiu como presidente do Conselho de Ministros, em agosto de 1885, o senador conservador João Maurício Wanderley, o Barão de Cotegipe. Ele passou a negociar na Assembleia Geral uma nova proposta apresentada pelo senador conservador José Antônio Saraiva, em substituição ao Projeto Dantas.

A principal modificação introduzida pelo Projeto Saraiva foi justamente a indenização do proprietário, que deveria ser feita pelo próprio liberto de 60 anos ou mais, obrigado a prestar serviços aos seus ex-senhores por três anos ou até completar 65 anos. Em 25 de setembro, a proposta foi aprovada pelo Senado e promulgada pelo imperador três dias depois. Ficou conhecida também como Lei Saraiva-Cotegipe.

— O Projeto Saraiva foi mais bem aceito porque respondia melhor aos interesses dos proprietários dos escravos. Ele colocava na lei o princípio da indenização, que servia de argumento para a defesa de indenização em caso de intervenção futura do Estado. Além disso, os preços dos escravos dispostos na tabela do projeto Saraiva eram maiores do que no Dantas — explicou a professora da Universidade Federal do Paraná Joseli Mendonça.

O historiador Marcos Magalhães destacou a importância da participação dos conservadores na aprovação das leis que resultaram na abolição da escravatura. Segundo ele, os projetos abolicionistas foram liberais, mas aprovados em sua maior parte por gabinetes conservadores.

— Saraiva e Cotegipe eram senadores do núcleo mais destacado do Império. Cotegipe era o líder mais destacado da reação conservadora, dos interesses escravagistas no Senado. É ele quem apresenta o projeto de lei depois da abolição, visando à indenização dos proprietários de escravos. Já Saraiva era um conversador muito afinado com os escravistas, mas também muito aberto.

Agência Senado (Reprodução autorizada mediante citação da Agência Senado)