Redação transforma aluno em jovem senador

Correio do Estado - MS (Versão para Web)

Foi a redação que elegeu Pedro Vinícius Araújo de Abreu, de 17 anos, Jovem Senador. Aluno da Escola Estadual General Malan, bicampeã em emplacar senadores pelo projeto, ele se prepara para tomar posse e levar propostas ao Congresso Nacional, em Brasília.

Filho de pai bombeiro e mãe dona de casa, Pedro é o mais velho de três filhos. Mora no Bairro Guanandi 2 e sonha em fazer Medicina. Também já acumula vitórias, como a aprovação na prova escrita do concurso para bombeiro.

Bem articulado, o garoto defende o que argumentou na dissertação selecionada. “Escrevi sobre a aplicabilidade da Constituição, mesmo ela sendo uma das mais desenvolvidas do mundo, restam desafios relacionados ao desconhecimento da população”, explica.

Pedro, que já tinha folheado a Constituição por ter cogitado seguir pelo caminho do Direito, juntou dados que reforçassem sua tese. “Eu citei que só 5,3% dos entrevistados de uma pesquisa do DataSenado declararam conhecer bastante a Constituição, então ela acaba não sendo efetiva”, avalia.

A professora responsável por incentivar ele e os demais alunos da escola é Jane Laura. Com mais de 20 anos em sala de aula, lecionando Redação, Língua Portuguesa e Literatura, Jane não tem preguiça e arregaça as mangas e inscreve os estudantes em todos os concursos que aparecerem.

Essa vontade dela de estimular os alunos fez com que, no ano passado, Amanda da Silva Duarte, à época no 3° ano do Ensino Médio na escola General Malan, fosse ao Senado. Em 2018, a escola conseguiu levar um aluno pela segunda vez. Pedro foi selecionado ao lado de 26 redações entre 190 mil textos de todo o País.

“Quando chegou este tema, achei um pouco difícil, porque eles têm um conhecimento prévio, mas não a fundo. Deixei eles à vontade para pesquisar e cada redação tem seu estilo, a do Pedro foi a que mais convenceu”, pontua a professora.

Em novembro, Pedro embarca para apresentar sua ideia legislativa dentro de uma proposta que seja inovadora para o País. “Penso em propor algo relacionado à política e à cidadania, com uma participação popular mais maciça em relação às decisões da Câmara”, sustenta.

Será uma semana de debates que vão dividir os jovens senadores em comissões para então tornar projeto de lei. “É uma responsabilidade que o jovem tem e que, muitas vezes, não é assumida. Os jovens sempre foram importantes nas questões políticas do Brasil, como a Diretas Já”, compara Pedro.

Para a professora, ver o trabalho da escola coroado pela segunda vez serve de exemplo. “Se eles seguirem orientações e levarem os estudos com afinco, vão conseguir chegar lá. Vão se dar bem em um concurso, no Enem, vão fazer Medicina. A vitória deles é da nossa escola, que por mais que seja pública, tem ensino de qualidade”, destaca.

SAIBA MAIS

Criado em 2010, o projeto é realizado anualmente e proporciona aos estudantes do Ensino Médio das escolas públicas estaduais e do Distrito Federal, de até 19 anos, conhecimento acerca da estrutura e do funcionamento do Poder Legislativo no Brasil.

A cada ano, é proposto um tema de redação como forma de ingresso. A legislatura tem duração de quatro dias e inicia-se com a posse dos jovens senadores e a eleição da Mesa. Os trabalhos são encerrados com a aprovação dos projetos e a consequente publicação no Diário do Senado. Para participar, as instituições de ensino são convidadas a promover um concurso de redação interno entre os alunos, com o tema anual, e enviar o melhor texto à correspondente Secretaria de Educação. A secretaria selecionará três redações para representar o estado na etapa nacional.

Projeto traz novas perspectivas aos estudantes

“Divisor de águas”. Assim que Amanda da Silva Duarte, hoje com 18 anos e acadêmica de Letras na UFMS, enxerga o programa. Jovem Senadora em 2017, ela foi a primeira aluna da Escola General Malan a representar Mato Grosso do Sul. “[O projeto] me trouxe novas perspectivas, achava que o Brasil era só isso aqui, com os costumes daqui. Não me atentava para essa pluralidade”, comenta.

Foi justamente a pluralidade, trabalhada na redação, que levou Amanda ao Senado. No ano passado, o tema foi a intolerância. “E eu escrevi a pluralidade brasileira e as raízes da intolerância. Tratei da perspectiva histórica de como o Brasil se construiu como este País enorme, com vários povos que descenderam de lugares diferentes, religiões diferentes e que ainda insistem em descriminar, excluir e matar aquilo que não é igual”, descreve.

No texto, ela defendeu que é preciso enxergar a existência do outro, não como ameaça e sim, como complementação.

Na vida estudantil e hoje acadêmica, a professora que coordena as inscrições em cursos, Jane Laura, é por quem Amanda nutre eterna gratidão. “Eu não sabia como começar, estruturar ou formular uma redação. E ela [professora] foi de fundamental importância na minha vida e na de todo mundo que já estudou com ela. Ela nos respeita, é paciente e compromissada. Faz com que a gente consiga argumentar, utilizando aquilo que nós já vivemos”, conta.

Como Jovem Senadora, Amanda e o grupo de 2017 propuseram, por uma das comissões formadas, um projeto que prevê a criação do portal de transparência para a saúde, em que pacientes teriam acesso à fila de cirurgia, lotação de unidade de pronto atendimento, medicamentos disponíveis na rede pública.

“Porque, se é público, é nosso sim e tem que monitorar”, frisa. A proposta aguarda tramitação no Senado.


IMPRIMIR | E-MAIL