Entrevista com Senador Raimundo Lira - Bloco 3


ENTREVISTADORA – Como é que o senhor via a disputa política, então? O senhor acha que fez parte? Havia, naturalmente, uma disputa entre as diversas lideranças, inclusive nas questões relacionadas a tempo de mandato, ao Presidente Sarney, aos cinco anos, à questão do Centrão. Como é que foi viver aquele momento do Centrão, por exemplo, para o senhor?

SENADOR RAIMUNDO LIRA (Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PSD - PB) – Olha, vou lhe falar uma coisa, ouviu? Existia uma corrente dentro do PMDB, que era um partido imenso na época, contra o Presidente Sarney. Então, queriam fazer uma constituição que inviabilizasse o Estado por conta do Governo. Por exemplo, tiraram a ilha de Fernando de Noronha do Governo, para ele não poder nomear um Governador. Houve coisas pontuais, coisas desse tipo. Então, eu acho que o que aconteceu naquele momento foi exatamente esse tumulto de ideias, ideias preconcebidas, ideias que iam surgindo na cabeça de pessoas, e essas pessoas iam formando grupos.

Eu gosto de dizer o seguinte: eu tive uma nota que era equilibrada na época, que foi a mesma nota do Senador Mário Covas, que era um ícone da esquerda, mas que era um homem de um bom senso extraordinário. Era exatamente isto: eu aproveitava as coisas boas do Centrão e aproveitava as coisas boas da ala mais à esquerda. Então, eu consegui me firmar aqui como um Parlamentar progressista. Isso me deu realmente uma condição de trabalho muito boa, mas era boa dentro de uma limitação que a Constituição marcava. Eu não tive, logicamente, maiores condições de me expandir mais, porque não havia muito espaço. Eu apresentei vinte e poucas emendas, tive nove emendas aprovadas e duas aprovadas parcialmente, o que considero um resultado satisfatório, e tudo na área econômica.

ENTREVISTADORA – O senhor se recorda de alguma em particular, a que o senhor atribua maior importância, ou alguma luta em particular?

SENADOR RAIMUNDO LIRA (Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PSD - PB) – Eu considero a mais importante das minhas emendas aquela que propôs ao Senado Federal a condição de aprovar os diretores do Banco Central, que eram nomeações exclusivamente do Presidente da República.

ENTREVISTADORA – Por quê, Senador?

SENADOR RAIMUNDO LIRA (Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PSD - PB) – Porque você deu essa competência ao Presidente, ou melhor, ao Senado Federal, então, você tirou um pouco a dependência dos diretores do Banco Central do Governo Federal. Então, você precisou dar uma independência relativa ao Banco Central dando ao Senado Federal essa condição de nomeá-los.

ENTREVISTADORA – Melhorou o equilíbrio entre os Poderes.

SENADOR RAIMUNDO LIRA (Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PSD - PB) – Melhorou o equilíbrio.

Agora, por falar em equilíbrio: nós temos hoje também uma quantidade enorme – foi uma cópia que nós fizemos de outros países – de agências de controle, e essas agências de controle não estão controlando coisa nenhuma. Elas não estão controlando, as agências de controle não estão controlando aquilo que deviam controlar. A agência de controle foi criada, instituída, exatamente para controlar aqueles agentes que trabalham em suas respectivas áreas, e isso não está acontecendo.

ENTREVISTADORA – Senador, o senhor defendeu de forma veemente... O senhor é contra a reeleição. Hoje, qual é o tamanho do mandato que o senhor considera ideal para um Presidente da República? É possível mudar isso na Constituição?

SENADOR RAIMUNDO LIRA (Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PSD - PB) – Eu acho que o mandato seria de cinco anos. Você tem o ano da entrada, você tem os três anos no meio, e você tem o ano da saída. Eu acho que os cinco anos seriam o ideal para um Presidente da República.

ENTREVISTADORA – Esse é um voto que o senhor repetiria, então?

SENADOR RAIMUNDO LIRA (Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PSD - PB) – É um voto que eu repetiria, que eu dei a Sarney naquele momento.

ENTREVISTADORA – O senhor pensaria em parlamentarismo neste momento?

SENADOR RAIMUNDO LIRA (Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PSD - PB) – Não, não pensaria em parlamentarismo, porque... Você vê como está funcionando o sistema político, e você implementar o parlamentarismo no País não vai dar certo.

ENTREVISTADORA – Senador, houve algum momento que lhe deu maior preocupação em relação ao que estava sendo discutido?

SENADOR RAIMUNDO LIRA (Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PSD - PB) – Uma das coisas que mais me preocuparam foi exatamente a aprovação que eu considerei exótica na época porque a inflação no Brasil era relativamente grande. Então, quando se estabeleceu o juro de 12% ao ano – que nunca foi cumprido, nunca foi mantido –, para mim representou uma medida realmente exótica.

ENTREVISTADORA – E nessa área do sistema financeiro o senhor acha que a organização que a Constituição estabeleceu é adequada? Ela fez bem ao País? Favoreceu o crescimento ou não? O que o senhor acha?

SENADOR RAIMUNDO LIRA (Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PSD - PB) – Eu acho que não, acho que não favoreceu o crescimento econômico. Eu acho que a queixa, a minha decepção foi exatamente quanto a isso, porque o Centrão esticou muito para um lado, a esquerda esticou muito para o outro e terminaram prevalecendo as ideias mais à esquerda. Então, ficou um País misto, um País democrático, mas com a Constituição muito focada para o lado da esquerda. Depois foram mudando paulatinamente essas quase cem emendas à Constituição. Elas, na sua maioria, têm a conotação exclusivamente econômica.

ENTREVISTADORA – Mas inviável não tornou, não é? Porque se dizia na época que essa Constituição tornaria o País inviável. Não foi isso, não é?

SENADOR RAIMUNDO LIRA (Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PSD - PB) – Não tornou o País inviável; tornou o País subdesenvolvido de forma permanente. O País melhorou, sim, melhorou a democracia, melhorou aquilo que o Ulysses Guimarães chamava de Constituição cidadã. Melhorou esse aspecto, cidadania a Constituição proporcionou a todos nós de forma equânime. Então, com relação a isso não existe queixa. Ela fez com que o Brasil ficasse um país permanentemente subdesenvolvido. Eu não acredito que o Brasil seja um país desenvolvido nos próximos cem anos.

ENTREVISTADORA – Meu Deus, Senador! Do que este País precisa?

SENADOR RAIMUNDO LIRA (Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PSD - PB) – O País precisa mudar o sistema político, precisa melhorar o sistema financeiro, precisa melhorar essa questão da reeleição juntamente com o sistema político. Aí, a gente vai encontrar o nosso caminho. Agora, um país só chega hoje ao pleno desenvolvimento se tiver um sistema de ensino adequado.

Então, se quiserem adotar hoje um sistema de ensino adequado, nós vamos levar 30 anos para aperfeiçoar esse sistema. Para que eles realmente engrenem e dê certo, 30 anos. Por quê? Porque, para um país ser desenvolvido hoje, ele tem que ter esse sistema educacional plenamente evoluído e desenvolvido e ter uma indústria que proporcione as exportações. Sem exportação...

Nós temos hoje, por exemplo, esse valor de duzentos e tantos milhões, mas não é um valor expressivo. Já era para o Brasil ter, no mínimo, US$500 milhões de exportação. O Brasil tem 65 milhões de capital externo que se investe no País, na área de produção, e era para ter uns US$150 a US$180 milhões. Então, seria esse o perfil do nosso País se nós quiséssemos, naquele momento, criar um país plenamente desenvolvido hoje, na década atual.

ENTREVISTADORA – Senador, mas é a Constituição que emperra a questão da valorização da educação, quando foi ela mesma que estabeleceu incentivo para a educação? Eu não entendi, desculpe. Tem a ver com a Constituição essa dificuldade da...?

SENADOR RAIMUNDO LIRA (Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PSD - PB) – Não, veja bem, o Brasil estabelece normas para a sua educação, mas isso não funciona. O que é que vai fazer funcionar? Eu não sei o é que vai fazer funcionar. Então, é nesse sentido que eu falo que, quanto ao sistema educacional brasileiro, hoje eu considero que o sistema universitário público tem uma qualidade muito inferior a que havia na época em que eu me formei.

ENTREVISTADORA – Senador, 30 anos passados e, com toda a sua experiência tanto como empresário, quanto como político, que nota o senhor dá à Constituição hoje, à nossa Constituição hoje, de um a dez?

SENADOR RAIMUNDO LIRA (Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PSD - PB) – Eu daria uma nota sete.

ENTREVISTADORA – Senador, de qualquer maneira, eu imagino que tenha sido uma experiência importante participar da Constituinte para o senhor. O senhor diria que isso lhe marcou a vida como político e cidadão?

SENADOR RAIMUNDO LIRA (Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PSD - PB) – Eu acho que marcou, porque, de qualquer maneira, todo esse trabalho que você fez, que eu fiz na Constituição eu acho que foi um trabalho produtivo, um trabalho eficiente. Agora ele não teve, no seu resultado global, como no meu não teve – eu falei a palavra eficiente, mas não seria a palavra certa –, ele não teve, no seu resultado global, aquela Constituição ideal que nós deveríamos ter feito, para que hoje o Brasil fosse um país plenamente desenvolvido.

O Brasil... Como você pode ver, nós estamos completando 30 anos. Então, a Coreia do Sul se desenvolveu em 35 anos; a Austrália se desenvolveu em 30, 40 anos; o Canadá se desenvolveu em 30, 40 anos. Então, é um tempo... A China, por exemplo, se transformou no segundo PIB do mundo em menos de 30 anos. Então, nós não precisamos de 40, 50, 100 anos para atingirmos o objetivo de sermos uma nação plenamente desenvolvida. Então, eu acho que o Brasil hoje tem grandes dificuldades de se tornar um país desenvolvido.

ENTREVISTADORA – Senador, muito obrigada pela entrevista.

SENADOR RAIMUNDO LIRA (Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PSD - PB) – Muito obrigado.

Estou aqui à disposição de vocês.

Uma boa noite a todos!

ENTREVISTADORA – Boa noite, Senador!