Entrevista com Senador Paulo Paim - Bloco 6


ENTREVISTADORA– Eu acho que a gente já está encerrando, mas, antes, eu queria me referir a duas coisas. Primeiro, aos votos. Só retomar isso. O senhor votou a favor da legalização do Jogo do Bicho, ou melhor, contra.

SENADOR PAULO PAIM (PT -RS) – Sou contra.

ENTREVISTADORA– Votou contra a legalização do Jogo do Bicho. O senhor repetiria esse voto agora, passado tanto tempo?

SENADOR PAULO PAIM (PT -RS) – Olha, eu tenho uma enorme preocupação com os chamados jogos de azar. Por quê? Eu lido muito com a questão dos direitos humanos e vou dar esse depoimento aqui. Eu tenho o maior respeito pela polícia, como tenho também por aqueles que não são da polícia. Então, na Comissão de Direitos Humanos, seguidamente eu tenho delegações de soldados, de cabos, de sargentos, que vão lá...

ENTREVISTADORA– Eu tenho que fazer uma retificação, pois eu estava certa, ou seja, o senhor votou a favor.

SENADOR PAULO PAIM (PT -RS) – Do?

ENTREVISTADORA– Do Jogo do Bicho, da legalização.

SENADOR PAULO PAIM (PT -RS) – Eu tenho uma enorme preocupação com este tema, com os chamados jogos de azar, sempre tive uma enorme preocupação. Bom, tentaram passar aqui os jogos lotéricos. Fomos contra lá atrás e aqui também. Tentaram passar a legalização das drogas. Fomos contra lá atrás e aqui também. Lembro-me agora, estou me lembrando, que, com relação à questão especificamente do Jogo do Bicho, o que acontecia? Os argumentos mais sólidos à época – porque o Jogo do Bicho é um jogo popular: o cara vai ali, faz uma fezinha, como dizem –, os argumentos eram de que o Jogo do Bicho vai continuar existindo, não há como achar que não vai continuar existindo, porque é popular, está espalhado por tudo quanto é cidade, por tudo quanto é canto. Então, perguntaram: "Por que é que vocês não legalizam e aplicam todos os tributos?" Num Pais como o nosso, onde há pessoas que passam até fome, os grandes donos do Jogo do Bicho não pagam nada, não pagam nada, só lucram. Esse foi o argumento mais sólido que nos convenceu que legalizasse esse Jogo do Bicho, que é igual ao jogo lotérico, não é verdade? Só que alguns, quando vão jogar, já jogam no cavalo, sei lá, na galinha, no coelho, porque o número da loteria coincide com aquele que seria na prática. Então, na verdade, não é muito diferente dos jogos lotéricos.

Na época, o argumento foi esse, e convenceu a mim, que queria tanto mais dinheiro para a educação, mais dinheiro para a saúde, mais dinheiro para a habitação, mais dinheiro para a segurança pública, enfim, para melhorar a qualidade de vida do povo. E nós íamos conseguir. E com uma taxação dura, porque praticamente 50% daquilo que transita no Jogo do Bicho viriam para o investimento no social. Foi isso que nos guiou muito naquela oportunidade, tanto que, de lá para cá, esse debate nunca mais voltou aqui, porque aqueles que operam nessa área não querem ser tributados.

ENTREVISTADORA– Encerrando, o senhor contou para a gente outro dia que a sua campanha para virar Constituinte foi uma campanha muito barata.

SENADOR PAULO PAIM (PT -RS) – Com o papel do pão.

ENTREVISTADORA– Eu queria que o senhor contasse essa história. E, já emendando, se hoje em dia seria possível fazer uma campanha com papel do pão. Eu quero que o senhor conte a história do papel do pão.

SENADOR PAULO PAIM (PT -RS) – Primeiro, quero dizer que, como nós não tínhamos dinheiro para fazer campanha... Naquela época era pão de meio quilo, vocês lembram, né? Alguém aqui lembra. Eu lembro. Então, havia aquele papel branco, até bonitinho. O que nós fazíamos? Recomendávamos a todos os trabalhadores que tinham que comprar o pão todo dia que guardassem aquele papel, recortassem com a tesoura pequenas papeletas e botassem o meu número. Eu não vou dizer o meu número agora, porque o meu número já está na mão, claro, de outros Parlamentares, porque eu sou Senador. Mas que botassem lá o meu número. E assim era feito nas fábricas. As fábricas espalhavam.

E, claro, eu dormia dentro de um fusquinha amarelo. Se não me engano, o Heck era o dono. O Jorginho, que já faleceu, era motorista. Nós três dormíamos no posto de gasolina. De manhã, chegava à fila do posto, tomava banho, trocava a roupa, o que era possível, e ia para as atividades. Cansávamos no meio da caminhada e, às vezes, parávamos – confesso isso – para pegar uma laranja ou uma maçã, mas, muitas vezes, o pessoal também nos dava. Isso é verdadeiro. Mas a gente pegava no meio da estrada e tal.

E há outro episódio, que é muito bonito, que era onde nós fazíamos a refeição. Normalmente era nas igrejas. Chegava à igreja, e o Padre dizia: "Não, você é o Paim, a gente está sabendo da sua história. Venha, jante aqui. Se chegar a tal cidade, vai lá, procure a paróquia que você vai ter lá a refeição". E foi assim, porque não tinha dinheiro nenhum. Eu era um operário, um metalúrgico e aprendi a fazer campanha sem muito dinheiro.

Quando eu digo que, mesmo para o Senado, gastei em torno de 400 mil de doações, porque havia aquelas doações – um dava R$10, dava R$20, dava R$5 –, ninguém acredita: "Não, mas uma campanha dessa é em torno de 30 milhões". Eu agora, só como exemplo, vou fazer a tal campanha de novo, da vaquinha, enfim. E é assim que a gente chegou ao Parlamento, com uma campanha bem pé no chão. Acredito que é possível, sim. Claro que as redes sociais têm um peso muito grande. É inegável que as redes sociais não decidem, mas têm peso. Quem tem um aparato de homens e mulheres à disposição para trabalhar dia e noite, é claro, terá uma certa vantagem. Mas eu tenho muito orgulho. Quando eu falo, inclusive, do Grupo Tramontina, algumas pessoas pensam que eu sou funcionário. E falo com orgulho, elogio o Grupo Tramontina, porque, por exemplo, quando eu trabalhava lá, voltando...

ENTREVISTADORA– O senhor citou um nome.

SENADOR PAULO PAIM (PT -RS) – Grupo Tramontina.

ENTREVISTADORA– Não. Depois do Tramontina, o senhor citou o nome de uma pessoa. Eu não interrompi na hora.

SENADOR PAULO PAIM (PT -RS) – Eu acho que foi o Selvino Heck e o Jorginho, que faleceu, que viajavam comigo. Por que eu viajei no Grupo Tramontina? Porque a Tramontina Forjasul Canoas tinha, no fundo da fábrica, uma granja. Ali tinha salada, pepino, tomate e todo dia, quando eu saía da fábrica, eu levava aquela cesta de verduras para casa. Isso eu nunca vou esquecer. Deve haver até hoje lá na Forjasul Canoas, que é do Grupo Tramontina. Então, essa vida minha foi muito sofrida, mas foi gostosa. Nas minhas férias do colégio, eu não ia para a fazenda, como a gente sonha, mas eu ia para a colônia de amiguinhos meus do colégio, que me levavam lá em Caxias do Sul.

Enfim, eu falo tudo isso para mostrar que foi uma vida de um menino pobre. Sabe qual é o rio mais poluído de Caxias do Sul? É o chamado Rio Tega. Nasci à beira do Rio Tega, fui Constituinte, enfim, virei Vice-Presidente do Senado por um período. E a minha campanha para Constituinte, para Deputado foi nessa linha que estou aqui falando, muito na base do carinho, do amor, da solidariedade das pessoas, que até botavam gasolina no carro para eu poder sair de uma cidade para outra. Isso eu lembro com muito orgulho, muita satisfação e muita emoção.

ENTREVISTADORA– Marcou a sua vida e fez a sua carreira, por tudo o que o senhor contou.

O senhor quer falar mais alguma coisa?

SENADOR PAULO PAIM (PT -RS) – Só dizer que achei muito bonita a iniciativa aqui do Senado. Acho que essas histórias têm que ser contadas para que as gerações futuras vejam, independente da história de cada um, que, numa época tal, aconteceu isso no Brasil e que muitos chegaram lá de uma forma ou de outra, mas deram a sua contribuição para um Brasil melhor para todos.

Vida longa à Pátria querida chamada Brasil!

ENTREVISTADORA– Obrigada, Senador. Agradecemos muito.

SENADOR PAULO PAIM (PT -RS) – Mas, se tiver tempo ainda, Nelson Jobim tem que ser lembrado também. Foi parceirão nosso lá. Mas fale a sua parte.