Entrevista com Senador Fernando Collor - Bloco 4


ENTREVISTADORA– O senhor está defendendo, então, uma assembleia exclusiva, uma Constituinte exclusiva para 2022?

SENADOR FERNANDO COLLOR (Bloco Moderador/PTC - AL) – Hum, hum.

ENTREVISTADORA– Isso teria de ser discutido. O senhor está com a candidatura posta a Presidente da República.

SENADOR FERNANDO COLLOR (Bloco Moderador/PTC - AL) – Hum, hum.

ENTREVISTADORA– Então, na eventualidade de um novo mandato, o que o novo Presidente Collor não repetiria, se governasse com a Constituição em vigor?

SENADOR FERNANDO COLLOR (Bloco Moderador/PTC - AL) – Com a Constituição em vigor, a primeira coisa que eu proporia seria isto: a convocação de uma nova Assembleia Nacional Constituinte. Eu proporia essas mudanças que a gente já elencou, que você teve a gentileza de lembrar, e, sobretudo, uma coisa em que me permitiria mais uma vez insistir, que é a mudança de sistema de governo, para sairmos do presidencialismo para o parlamentarismo.

Se formos ver o sistema presidencialista no Brasil, vamos verificar que, de seis em seis meses, temos uma crise. Esse sistema presidencialista é um gestor de crises permanentes. O sistema presidencialista não pode conviver sem crises, é uma coisa terrível. Já o sistema parlamentarista traz consigo o antivírus de crise, porque, se há uma crise, cai o governo, mas o País continua andando. Forma-se nova maioria, elege-se o novo primeiro-ministro, e o governo continua andando.

É claro que, com o parlamentarismo, tem de haver também uma profissionalização da burocracia. Não podemos ter 27 mil ou 30 mil cargos comissionados na estrutura do Poder Público no Brasil. Essa é uma coisa absurda, absurda! Nós temos de ter uma burocracia profissionalizada, para que sejam carreiras consideradas todas elas de Estado, para que, independentemente do governo que caia ou do governo que assuma, não haja uma interrupção nos trabalhos que vinham sendo realizados pelo governo anterior. Hoje, estamos cansados de ouvir sempre isto: "Obras inacabadas! Há uma obra que não foi acabada! Aquela rodovia ou ponte também não foi adiante." Enfim, é um desperdício monumental de recursos públicos. E por que muitas dessas obras estão inacabadas? Porque o que assumiu não quer continuar, porque, se continuar, a obra vai ser creditada ao seu antecessor, e não a ele próprio.

E há investimentos, por exemplo, que urgem no campo do saneamento, do esgotamento sanitário, que tem tudo a ver com a questão da saúde, dos gastos muito altos que nós temos na saúde em função das doenças típicas de água não tratada, da falta de saneamento básico. Mas dizem que, em geral – não é o meu caso, porque fui um governador que fez uma obra grande de saneamento –, os políticos não gostam de obras que não estejam acima da superfície, de onde nós estamos pisando, porque são obras enterradas que a população não vê, porque a população, não as vendo, não haverá de dar crédito àquele que as realizou.

Mas, enfim, são essas questões que nós teríamos de debater também, como a da mudança do sistema de governo. Devemos mostrar à população as vantagens de uma mudança no sistema de governo, passando a ter um Presidente da República que não será, como alguns dizem, a Rainha da Inglaterra, sem desmerecer a figura de Sua Majestade; estou querendo dizer de um Presidente que não manda. Como temos essa cultura da colônia, de que estamos sempre em busca do el-rei, para que ele sane as dificuldades pelas quais estamos passando, nós temos sempre a ideia de que ao Presidente cabe resolver tudo. Então, nós precisamos ter uma pessoa para xingar e uma pessoa para aplaudir, e a figura ideal é o Presidente, que é a figura reeditada do el-rei.

Então, o sistema parlamentarista acaba com isso, dilui isso e traz inúmeras vantagens. Não se trata somente de dizer: "Amanhã vai ser o parlamentarismo." Não é assim. Juntamente com isso, deve vir uma série de outras medidas que fortaleçam e deem condições ao sistema parlamentar de governo de efetivamente agir em consequência.

ENTREVISTADORA– Senador, o senhor já governou e sabe que o embate com as mudanças é uma coisa difícil. Essas propostas todas que o senhor está fazendo são propostas que mais ou menos todos os candidatos têm feito e não têm conseguido tocar para frente, porque há um embate muito grande com a classe política. Enfim, o senhor sabe que não é fácil realizar mudanças profundas.

Eu pergunto o seguinte: isso é o que o senhor não fez e o que o senhor faria? Por exemplo, ao assumir o governo, proporia a mudança para o sistema parlamentarista? O senhor teria essa generosidade, sendo o senhor o Presidente?

SENADOR FERNANDO COLLOR (Bloco Moderador/PTC - AL) – Sem dúvida! Mas eu fiz isso. Quando Presidente da República – tenho diversos artigos publicados –, começando em 1990 – tenho várias coisas escritas –, eu defendi o parlamentarismo ardentemente, defendi o parlamentarismo publicamente. É por isso que, como eu estava dizendo antes, somente com um Presidente que seja realmente comprometido com a tese do parlamentarismo, porque convencido de que esse é realmente o melhor sistema de governo em benefício da população, teríamos condições de aprovar o sistema parlamentarista. Poderia ir à televisão e dizer: "Nós vamos votar, daqui a dois meses, num plebiscito, o sistema de governo, a forma de governo. O parlamentarismo é melhor por isso e por aquilo."

Inclusive, havia um grupo de Parlamentares que eram parlamentaristas e que conversavam comigo, sem data fixa, mas com alguma frequência, para tratarmos de como faríamos essa campanha do parlamentarismo, todos, inclusive eu, conscientes de que, sem a participação do Presidente, as chances de o parlamentarismo ser aprovado seriam mínimas.

Então, sou inteiramente engajado nisso, sem dúvida. É aquilo que já coloquei aqui. Quero dizer para a população: "Sou o Presidente e estou exercendo meu mandato num regime presidencialista. Quero dizer a vocês que esse sistema presidencialista, no meu entender, não está dando certo. No meu entender, o melhor sistema é o sistema parlamentarista, que seria uma maneira muito mais fácil, muito mais ágil e muito mais direta de nós podermos resolver os problemas que nos afligem no momento do que o sistema presidencialista." Eu faria isso sem dúvida.

ENTREVISTADORA– Não teria ocorrido o seu impeachment se fosse um regime parlamentarista?

SENADOR FERNANDO COLLOR (Bloco Moderador/PTC - AL) – Não, porque eu não estaria no governo.  (Risos.)

ENTREVISTADORA– O senhor seria só o chefe de Estado, não é?

ENTREVISTADORA– Senador, nós estamos falando de uma possibilidade, de uma luta na qual o senhor pretende se empenhar na campanha que o senhor fará, naturalmente, se o senhor vier a ganhar. Mas, na verdade, o que permite isso é esta Constituição que está em vigor.

SENADOR FERNANDO COLLOR (Bloco Moderador/PTC - AL) – É.

ENTREVISTADORA– Não é verdade?

SENADOR FERNANDO COLLOR (Bloco Moderador/PTC - AL) – É.

ENTREVISTADORA– A Constituição está fazendo 30 anos, o senhor viveu aquele momento histórico. A gente gostaria de saber, falando um pouco de emoção: como cidadão, como homem público, como um homem que vem de uma família de políticos, qual é a sua sensação, o que lhe vem, como foi ter vivido aquele momento histórico?

SENADOR FERNANDO COLLOR (Bloco Moderador/PTC - AL) – Foi um momento de muita emoção, como você disse. E eu não estou aqui, em nenhum momento, execrando a Constituição que nos rege. Não! Fui eleito por essa Constituição, exerci meu mandato por essa Constituição e jurei cumprir a Constituição. Essa é a nossa Carta Magna, é o que nós temos. Agora, com todo o respeito que nós devemos à vetusta Carta de 1988, acho também que temos espaço para criticar pontos em que nós achamos que ela não se adapta a um momento ou, a mais do que um momento, a uma inspiração do que seria uma Carta Constitucional. Então, estamos vivendo debaixo do que diz a Carta de 1988 e estamos respeitando-a, mas sem deixarmos de fazer essas considerações que julgo importantes.

No momento em que ela foi outorgada, eu estava aqui no Congresso, eu estava na arquibancada. Nem é arquibancada o nome que a gente usa no plenário. Mas eu estava na parte de cima.

ENTREVISTADORA– Nas galerias.

SENADOR FERNANDO COLLOR (Bloco Moderador/PTC - AL) – Nas galerias. Eu estava nas galerias com outros Governadores, assistindo àquele momento histórico, com Dr. Ulysses brandindo a Constituição na mão, falando da Carta cidadã. Foi um belo discurso o que ele fez! E tudo aquilo era uma emoção que todos nós estávamos sentindo, porque todos nós acreditávamos que realmente aquela nova Carta, primeiro, marcava uma ruptura com o ancien régime, marcava essa ruptura, marcava o início de um processo democrático. Tudo isso, com as eleições para Presidente da República, dava-nos uma alegria muito grande de reencontro com o processo democrático brasileiro.

Então, foi um momento de muita emoção, sem dúvida. Nós a recebemos com aplausos. Quer dizer, eu, se fosse Parlamentar, na época, teria subscrito a Constituição. Mas isso não me teria impedido de, hoje, se eu a tivesse subscrito naquela ocasião, se Parlamentar fosse, tecer as mesmas considerações que me permito fazer neste momento.

ENTREVISTADORA– Senador, muito obrigada.

SENADOR FERNANDO COLLOR (Bloco Moderador/PTC - AL) – Obrigado a vocês.