Entrevista com Senador Fernando Collor - Bloco 2


 

ENTREVISTADORA– Como o senhor avalia, Senador, a pressão e a proximidade da sociedade junto à Constituinte? Em 20 meses de trabalho, essa proximidade foi intensa, foi uma coisa inédita, e o que saiu da Assembleia foi fruto disso, fruto de um pacto. O senhor acha, no conjunto, que o resultado final foi adequado, que aquele foi o texto de que o Brasil precisava naquele momento, com suas qualidades e defeitos, com o engessamento e as coisas positivas que surgiram?

SENADOR FERNANDO COLLOR (Bloco Moderador/PTC - AL) – Como você disse, com as suas qualidades e defeitos, foi o que foi possível fazer. Naturalmente, desencadearam-se muitas emoções e muitas paixões na elaboração da Constituição, até porque vínhamos de uma campanha das diretas. Depois da campanha das diretas, houve as eleições de governadores e de prefeitos e, depois, eleições para Presidente, fatos que mobilizavam muito as pessoas e despertavam nas pessoas entusiasmo e paixão. Depois da eleição de governadores, desaguou na Assembleia Nacional Constituinte, em que a população entendia que se estava escrevendo algo que iria resolver o problema de cada um. Essa era realmente a boa intenção de todos aqueles que trabalharam – digo da população –, que pressionaram aqui os Constituintes para que, na Constituição, estivesse inscrito algum artigo que resolvesse a questão da sua categoria profissional ou até mesmo sua questão pessoal. E a Constituição não é bem para isso, não é exatamente para o atendimento de forma tão extensa de tantos interesses que se conflitam dentro de uma sociedade como a nossa, ainda mais uma sociedade muito jovem, democraticamente falando. Desse modo, acho que é um momento, depois de tanto tempo... Não é tanto tempo quanto deveria, porque a Constituição do Império, acho, demorou 60 anos, e a primeira Constituição republicana demorou também 40 e poucos anos, e cada uma teve uma emenda. A Constituição do Império, de 1824, teve uma emenda constitucional, e a Constituição republicana de 1891 teve uma emenda constitucional. Nós, nesta Constituição, de 1988 para cá, fizemos 105 emendas – 99 emendas e mais 6 emendas de revisão. Então, foram 105 emendas nesse período. Esse é um sinal de que alguma coisa não caminhou na direção que se imaginava.

Então, já que se fala tanto em reforma política – defendo uma reforma política ardentemente, sempre defendi, porque acredito que ela seja mãe de todas as reformas –, já que se fala tanto em reforma tributária, em reforma previdenciária, em reforma fiscal, eu acho que este seria o momento não de revisarmos, mas, talvez, de chamarmos uma nova Assembleia Nacional Constituinte, para que nós façamos um bom lifting nesta nossa Constituição e possamos ter uma Constituição mais enxuta, mais objetiva, que dê margem a menos dúvidas do que aquelas que nós estamos tendo a cada momento, sobrecarregando o trabalho do Supremo Tribunal Federal, retomando um pouco o que falei anteriormente, gerando hoje o que se chama de judicialização da política brasileira. Mas não é judicialização. O Supremo Tribunal Federal não está querendo chamar a si as atribuições do Parlamentar ou do Poder Legislativo; ele está apenas respondendo a provocações que são feitas pelo próprio Poder Legislativo, que deseja que o Supremo interprete a lei que o próprio Poder fez, que o próprio Poder elaborou.

Então, esse é um sinal de que há muitas lacunas que não foram preenchidas para a correta compreensão do que determinado artigo deseja dizer. Há também muitas incongruências, incongruências essas que estão sendo remetidas ao Supremo para que ele dê a palavra final.

Desse modo, acho que este seria um bom momento, talvez, para nós pensarmos uma nova Assembleia Constituinte, para adequarmos a nossa Constituição ao século XXI e a estes tempos extremamente modernos que estamos vivendo.

ENTREVISTADORA– Senador, na sua proposta de reforma que o senhor apresentou dois anos atrás, havia pontos que o senhor submetera a uma pesquisa, e alguns pontos foram muito bem aprovados pela população. É uma reforma muito ousada a reforma política que o senhor propôs. Eu queria mencionar alguns pontos, e a pergunta principal em relação a eles todos é a seguinte: o senhor acha possível, o senhor acha viável que o Congresso aprove uma reforma nesses termos?

SENADOR FERNANDO COLLOR (Bloco Moderador/PTC - AL) – Não.

ENTREVISTADORA– Então, o senhor já respondeu. Nem precisa citar os pontos, mas os pontos são muito interessantes.

SENADOR FERNANDO COLLOR (Bloco Moderador/PTC - AL) – Mas seria bom até citar.

ENTREVISTADORA– Então, vamos lá!

SENADOR FERNANDO COLLOR (Bloco Moderador/PTC - AL) – A assembleia a que me refiro teria de ser uma assembleia exclusiva, uma assembleia de parlamentares eleitos com o fim precípuo de elaborar uma nova Carta Constitucional sem que esses que fossem eleitos para este fim pudessem se candidatar posteriormente, por um período de dois ou três mandatos. Então, seria, nesse sentido, uma Assembleia Constituinte exclusiva.

Dou o exemplo da reforma política. Como a gente vai colocar em votação uma reforma política e mudar o sistema atual, se os Deputados e Senadores eleitos dizem "estou eleito, estou exercendo meu mandato de acordo com as regras que estão em vigência e não sei por que eu deveria mudar essas regras"? Então, naturalmente, não somos nós, detentores de mandato atualmente, que deveremos ser aqueles que irão fazer essa reforma, sobretudo a reforma política. Teria de haver uma assembleia exclusiva para isso.

ENTREVISTADORA– O que o senhor apresentava era a redução do número de Deputados e de Senadores, o que foi aprovado por 91% dos entrevistados, no caso dos Deputados, e por 88% dos entrevistados, no caso dos Senadores. Eu já havia perguntado se seus pares aprovariam, mas o senhor já me explicou que o senhor quer uma Constituinte exclusiva.

SENADOR FERNANDO COLLOR (Bloco Moderador/PTC - AL) – Sim.

ENTREVISTADORA– O voto facultativo foi aprovado por 70% dos entrevistados; a redução do tempo de campanha foi aprovada por 66% dos entrevistados; o limite de gastos na campanha foi aprovado por 88%...

SENADOR FERNANDO COLLOR (Bloco Moderador/PTC - AL) – Esses dois últimos, inclusive, foram votados, a redução do tempo de campanha e o limite de gasto de campanha.

ENTREVISTADORA– O fim do horário político em anos não eleitorais foi aprovado por 72%.

SENADOR FERNANDO COLLOR (Bloco Moderador/PTC - AL) – Perfeito.

ENTREVISTADORA– Apenas uma reeleição para cargos legislativos obteve 55% de aprovação; a eleição para suplente de Senador obteve 84% de aprovação.

Se o povo demonstra querer a reforma política, por que 30 anos depois ninguém conseguiu realizá-la?

SENADOR FERNANDO COLLOR (Bloco Moderador/PTC - AL) – Porque os maiores interessados em não mudar isso somos nós que aqui estamos. Quer dizer, excetue-me a mim e a outros que entendo estejam aqui, mas não interessa mexer nisso, porque tudo isso vai mexer com seus próprios interesses.

Nesse elenco de questões, ainda há outra questão, que é a introdução do sistema parlamentar de governo. Eu sou particularmente um parlamentarista. Infelizmente, em 1993, quando houve o plebiscito que estava previsto nas Disposições Transitórias da Constituição de 1988... Eu tinha muita confiança, muita fé em que, em 1993, com o plebiscito, poderíamos mudar o sistema de governo, mas meu mandato não pôde ser completado. Em 1993, eu já não era Presidente.

Em relação a esse tema, acredito que a população só vai dar atenção à mudança do sistema presidencialista para o regime parlamentarista se, no exercício do seu mandato, no momento em que for convocado o plebiscito para tratar desse tema, o Presidente, ele próprio, advogue a tese de que o parlamentarismo é o melhor sistema de governo, dizendo: "Eu estou exercendo a Presidência da República dentro do sistema presidencialista, estou vendo que esse sistema não dá certo, que esse sistema é a carroça da política brasileira, que precisamos rapidamente evoluir para o sistema parlamentar de governo."

ENTREVISTADORA– Ou seja, esses Senadores e Deputados que serão eleitos neste ano, em seus próximos mandatos, já poderiam começar a enfrentar esse assunto da reforma política e da convocação de um plebiscito?

SENADOR FERNANDO COLLOR (Bloco Moderador/PTC - AL) – Não, não, eu acho que isso...

ENTREVISTADORA– O senhor acha que eles poderiam, pelo menos, prever isso para uma próxima Legislatura?

SENADOR FERNANDO COLLOR (Bloco Moderador/PTC - AL) – Não. Acho que temos de tratar de votar e aprovar a convocação de uma Assembleia Constituinte na eleição de 2022, depois de passada a eleição de 2018. Ou seja, temos de votar para que a Assembleia Nacional Constituinte se reúna em 2022, com uma eleição exclusiva. Deveria haver a eleição de Parlamentares aqui e a eleição exclusiva de pessoas, de brasileiros e brasileiras, para que formassem a Assembleia Nacional Constituinte que formularia a nova Carta Constitucional.

ENTREVISTADORA– Seria uma emenda constitucional votada...

SENADOR FERNANDO COLLOR (Bloco Moderador/PTC - AL) – Votada por este Congresso.

ENTREVISTADORA– Por este Congresso.

SENADOR FERNANDO COLLOR (Bloco Moderador/PTC - AL) – Votada pelo Congresso eleito em 2018.

ENTREVISTADORA– O senhor já apresentou essa emenda, Senador?

SENADOR FERNANDO COLLOR (Bloco Moderador/PTC - AL) – Não, não apresentei essa emenda ainda.

ENTREVISTADORA– Quando vai apresentar?

SENADOR FERNANDO COLLOR (Bloco Moderador/PTC - AL) – Apresentei a proposta. (Risos.)

É a tal coisa: isso é para não dizer que não ficou, de alguma maneira, registrado isso que coincide com aquilo que eu penso. Mas isso aí está perfeitamente de acordo com o que o povo também pensa e espera.

Então, foi por isso que apresentei essa série de sugestões, que é um incentivo para que todos nós pensemos na necessidade da convocação de uma Assembleia Constituinte exclusiva com esse objetivo.