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Mais dúvidas sobre a meta fiscal

Acórdão do STJ deixa claro que governo terá de rever gastos para garantir credibilidade da política fiscal

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Por Notas & Informações
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O Superior Tribunal de Justiça (STJ) publicou o acórdão de um caso muito relevante para a União. No julgamento realizado no fim de abril, o tribunal acatou uma tese defendida pela Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN) e decidiu que as empresas não podem usar benefícios fiscais oriundos de um imposto estadual, o ICMS, para reduzir a base de incidência de tributos federais como o Imposto de Renda e a CSLL.

Com a vitória, o Ministério da Fazenda estimou um aumento de receitas de até R$ 90 bilhões anuais, recursos fundamentais para a meta fiscal deste e dos próximos anos. No acórdão, no entanto, o STJ esclareceu pontos que poderão fazer muita diferença nesse cálculo, entre os quais o uso de subvenções enquadradas nos requisitos da Lei Complementar 160/2017.

Tal legislação equiparou as subvenções de custeio às de investimentos, determinou o registro desses valores como reserva de lucros e estabeleceu requisitos para a aplicação desses recursos. Pelo acórdão do STJ, essas reservas deverão ser tributadas se forem distribuídas a acionistas na forma de dividendos ou juros sobre capital próprio, mas ficarão isentas se servirem para reinvestimentos ou dedução de prejuízos. Caberá à Receita Federal fiscalizar o cumprimento desses critérios caso a caso.

A decisão do STJ gerou entendimentos opostos, que permaneceram mesmo após a publicação do acórdão. Para especialistas na área tributária, a sentença garantiu que a ampla maioria das empresas continue não sendo tributada. O Ministério da Fazenda concluiu o oposto, ou seja, que uma minoria ficará livre de impostos – certeza esta que manteve inalterada a previsão do governo de arrecadar até R$ 90 bilhões em razão da decisão.

Qualquer informação mais firme sobre o assunto dependerá da divulgação dos dados oficiais da arrecadação. Mas, antes mesmo de o acórdão tornar-se público, a Instituição Fiscal Independente (IFI) do Senado já havia feito um alerta sobre as incertezas acerca dos efeitos de decisões judiciais nas receitas da União.

Segundo a IFI, o julgamento em questão renderia R$ 7,1 bilhões neste ano – uma quantia importante, mas bem mais modesta que a esperada pela Fazenda. Na hipótese de que o governo não esteja enganado, para arrecadar este montante, ele ainda dependerá da iniciativa das empresas de regularizar sua situação de forma voluntária até o fim de julho.

O arcabouço deixou claro que o governo apostava mais no incremento de receitas do que no corte de despesas para atingir a meta. Mas, se o acórdão do STJ foi incapaz de desfazer convicções de quaisquer dos lados desta contenda, ele reforçou dúvidas sobre o cumprimento da meta fiscal.

Sem esse reforço extra, o objetivo de reduzir o déficit a 0,5% do Produto Interno Bruto (PIB) deste ano e a zero em 2024 será inviável. Não há mágica. Se quiser assegurar a credibilidade de sua política fiscal, o governo terá de rever gastos e enfrentar interesses, a começar pelos subsídios, que somaram escandalosos R$ 581,5 bilhões, o equivalente a 5,86% do PIB do ano passado.