O plenário do Senado Federal aprovou nessa quarta-feira por 57 votos a 17 o projeto do novo arcabouço fiscal. O texto terá que voltar para a Câmara para que os deputados analisem as emendas feitas pelos senadores, antes de ser enviado à sanção. Em função das festas de São João e da viagem do presidente Arthur Lira (PP-AL) para Portugal, a votação da nova regra pelos deputados só ocorrerá daqui a pelo menos duas semanas.
A principal mudança em plenário foi sugerida em emenda do líder do governo no Congresso, senador Randolfe Rodrigues (sem partido-AP), para evitar corte de R$ 32 bilhões no projeto de lei orçamentária anual (Ploa) de 2024. Esses R$ 32 bilhões são a diferença entre o projeto original do governo, que considerava a inflação até dezembro para corrigir o piso de despesas, e a proposta aprovada pela Câmara, que faz o cálculo com base na inflação dos 12 meses até junho.
Randolfe argumentou que a emenda é necessária para “garantir investimento em rodovias e saneamento, além de despesas correntes como emissão de passaportes e funcionamento do INSS e serviços assistenciais” como o Bolsa Família e aposentadorias. A ministra do Planejamento e Orçamento, Simone Tebet, esteve pessoalmente no plenário para pedir aos senadores a aprovação da emenda. Do contrário, as despesas poderiam ser elevadas no fim do ano, se houvesse alta da inflação, mas o Ploa teria que ser encaminhado em agosto com o corte dos R$ 32 bilhões. Após a aprovação da medida, Tebet disse que a mudança viabiliza o novo Programa de Aceleração do Crescimento (PAC).
O relator do projeto, senador Omar Aziz (PSD-AM), inicialmente tinha rejeitado a emenda, mas mudou de ideia após apelos de Randolfe e do senador Weverton Rocha (PDT-MA). “Mas tem que explicar o que está acontecendo. Não é à toa que não está contemplado na votação da Câmara”, afirmou. Ele destacou que o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, não havia pedido a mudança e que a proposta pode se voltar contra o próprio governo se não houver a alta esperada na inflação porque, aí, será necessário cortar gastos programados.
Na justificativa da emenda, Randolfe destacou que esse risco só existe se a inflação no fim do ano ficar abaixo de 4%, taxa registrada nos últimos 12 meses, “o que não é previsto por qualquer agente econômico”. A proposta aceita pelos senadores, inclusive os de oposição, diz que as despesas “condicionadas” constarão no Ploa, mas dependerão dessa alta da inflação na comparação entre junho e dezembro. Essa alteração precisará ser confirmada pelos deputados em julho.
Eles terão também que avaliar outras mudanças feitas pelos senadores e que já constavam do texto aprovado na Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) ontem pela manhã. O Senado decidiu excluir da regra de controle dos gastos o Fundo Constitucional do Distrito Federal (FCDF), o Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica (Fundeb) e as despesas com ciência, tecnologia e inovação.
Aziz ainda acatou de última hora na CAE emenda que inclui “a alienação de ativos e a privatização de empresas estatais” entre as possíveis medidas de ajuste das contas públicas. O senador Oriovisto Guimarães (Podemos-PR) destacou que há 187 empresas estatais que podem ser utilizadas para reduzir a dívida.
O funcionamento e os parâmetros da regra não foram alterados no Senado. O arcabouço continua prevendo metas anuais de resultado primário e crescimento real das despesas primárias da União entre 0,6% e 2,5% por ano, que será equivalente a 70% do incremento das receitas.
Tebet afirmou em audiência na Câmara que o arcabouço precisará de R$ 150 bilhões em “incremento de receitas” para “dar certo”. Segundo a ministra, esse incremento será alcançado “sem aumento de impostos”, mas revendo decisões do passado para evitar sonegação e contencioso tributário.
Líder da oposição no Senado, Rogério Marinho (PL-RN) criticou a proposta. “Vai alterar a nossa dívida em pelo menos 13 pontos percentuais a mais do que em janeiro de 2023. Quem está dizendo isso é o IFI, a Instituição Fiscal Independente do Senado, que é independente”, afirmou. “Isso significa simplesmente que todo o esforço feito pela sociedade brasileira na mudança da estrutura previdenciária em 2019 vai por água abaixo em quatro anos”, disse.
O líder do governo no Senado, Jaques Wagner (PT-BA), rebateu que a proposta é mais flexível do que o atual teto de gastos, mas que foi o governo Bolsonaro (PL) que modificou a regra fiscal várias vezes para poder gastar mais na eleição. “Não há pretensão deste governo, do qual sou líder, de furar a responsabilidade fiscal”, afirmou.
Conteúdo originalmente publicado pelo Valor PRO, serviço de notícias em tempo real do Valor Econômico