CBIFOT010620211080bolsa

Mercado aposta na perspectiva de flexibilização da PEC da Transição

Publicado em Economia

ROSANA HESSEL

 

Em meio às incertezas sobre o tamanho do rombo fiscal que a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) da Transição — também chamada de PEC do Precipício por alguns economistas — pode causar no Orçamento de 2023, a Bolsa de Valores de São Paulo (B3) abriu a semana em queda, mas mudou o sinal com a expectativa de alguma flexibilização de duas propostas alternativas a caminho.

 

“O mercado entendeu que a PEC de Transição enviada ao Congresso vai ser flexibilizada e que a proposta chegou ao Congresso com a famosa ‘gordura'”, destacou Gustavo Cruz, estrategista-chefe da RB Investimentos.

 

Após recuar 0,83%, na parte da manhã desta segunda-feira (21/11), e atingir a mínima de 107.957 pontos, a B3 chegou ao pico de 110.235 pontos, com alta de 1,25% ao longo do dia. Contudo, pouco depois das 16h, registrava alta em torno de 0,62%, a 109.542 pontos.

 

A proposta da equipe de transição do governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT), que venceu as urnas em 30 de outubro sobre o atual presidente Jair Bolsonaro (PL) — que continua calado desde então e parou até de fazer as estapafurdias transmissões semanais pela internet –, prevê R$ 198 bilhões em gastos extras, incluindo os R$ 175 bilhões para a volta do Bolsa Família de R$ 600 mais os R$ 150 para cada criança abaixo de seis anos,  fora da regra do teto de gastos — emenda constitucional aprovada em 2016 que limita o aumento das despesas à inflação do ano anterior.

 

O senador Alessandro Vieira (PSDB-SE) protocolou, no fim de semana, uma PEC alternativa à PEC da Transição, propondo tirar do teto de gastos o limite de R$ 70 bilhões dentro da Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) para 2023 para programa permanente de transferência de renda. Vale lembrar que R$ 105 bilhões para o Auxílio Brasil, que substituiu o Bolsa Família, com valor médio de R$ 405 está previsto na Proposta de Lei Orçamentária Anual (Ploa) do ano que vem.

 

Outra proposta que vem ganhando destaque é uma PEC alternativa que está sendo preparada pelo senador Tasso Jereissati (PSDB-CE), que deverá prever R$ 80 bilhões fora do teto de gastos. O parlamentar é autor do Projeto de Lei (PL) nº 5.343, de 2020, que cria a Lei de Responsabilidade Social e estabelece metas de redução de pobreza a partir de três pilares centrais: o Benefício de Renda Mínima (BRM), a Poupança Seguro Família (PSF) e o Programa Mais Educação (PME). A relatora do PL 5.343/2020 é a senadora Simone Tebet (MDB-MS). Segundo ela, que é cotada para relatar essa nova PEC, as duas propostas “são complementares”.

 

Não à toa, pelas contas da Instituição Fiscal Independente (IFI), essa PEC da Transição abre um espaço para aumento de gastos no Orçamento de R$ 203 bilhões, ou seja, algo em torno de 2% do Produto Interno Bruto (PIB). O maior problema dessa PEC é a falta de contrapartidas em termos de corte de despesas, que poderiam ser apresentadas em vez de simplesmente abrir um espaço fiscal desse tamanho sem um prazo determinado, o que é uma temeridade em um país que já tem juros elevados.

 

A taxa básica da economia (Selic) está em 13,75% e pode subir mais se houver sinais de descontrole fiscal, como vem sinalizando o Banco Central, que deixou a porta aberta para alta antes mesmo de iniciar uma queda da Selic — algo que só deve ocorrer na segunda metade de 2023. Para cada ponto a mais na Selic, a dívida pública bruta cresce R$ 36,5 bilhões, em termos anuais, conforme dados do BC.

 

Equipe de transição

 

Os integrantes da equipe de transição da área econômica seguem sem uma perspectiva de reunião nesta semana. Até o momento, houve apenas três encontros virtuais entre os economistas Pérsio Arida, ex-presidente do Banco Central; André Lara Resende, ex-presidente do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES); o ex-ministro da Fazenda, Nelson Barbosa; e Guilherme Mello, professor da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp).

 

O clima das conversas foi “tranquilo”, segundo um dos integrantes, apesar das diferentes linhas de pensamento na área acadêmica. Fontes da Esplanada ainda contam que Barbosa, que tem fama de ser mandão e de ter tentado puxar o tapete do ex-chefe Guido Mantega quando era ministro, vem vetando nomes de economistas que criticaram Lula em algum momento.

 

Uma das preocupações do mercado é que Lula escolha o ex-ministro da Educação Fernando Haddad e candidato derrotado para o governo de São Paulo como ministro da Fazenda. Haddad é o novo homem de confiança de Lula. Viajou com ele para o Egito para o presidente eleito participar da 27ª Conferência da Organização das Nações Unidas (ONU) sobre Mudanças Climáticas, a COP27. Dizem que ele é o “petista mais à direita” do partido e está sendo preparado para substituir Lula na liderança do partido. A conferir.

 

Para analistas do mercado e até mesmo ex-integrantes de governos petistas, Lula estaria dando um tiro no pé ao indicar Haddad para a Fazenda. O mais palatável seria o Ministério do Planejamento. Com isso, o nome do ex-ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, continua na bolsa de apostas como o melhor candidato para chefiar a equipe econômica do terceiro mandato de Lula, porque traria de volta a credibilidade perdida do atual governo de que respeitará o teto de gastos ou uma nova regra fiscal.

 

Até agora, nenhum integrante da equipe de transição deu pistas do que será o novo marco fiscal que substituiria a regra do teto de gastos, que recebeu inúmeras chaminés ao longo do governo Bolsonaro. Vale lembrar que um levantamento feito pelo economista Braulio Borges, do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (FGV Ibre), revela que o governo Bolsonaro estourou o teto em R$ 795 bilhões ao longo do mandato.

 

Nelson Barbosa chegou a admitir, nesta segunda-feira, que é possível reduzir o volume de gastos extras em até R$ 136 bilhões. “Em termos do tamanho da economia, não será expansão fiscal. O gasto será igual ao efetivamente feito no último ano do governo Bolsonaro”, declarou a jornalistas no Centro Cultural do Banco do Brasil (CCBB).