Por Alexandro Martello, g1 — Brasília


A aprovação da PEC dos precatórios pelo Congresso Nacional no fim do ano passado abriu um espaço adicional de R$ 113,1 bilhões para novas despesas no orçamento deste ano, segundo informou a Instituição Fiscal Independente (IFI) no Relatório de Acompanhamento Fiscal (RAF) de janeiro. O órgão é vinculado ao Senado Federal.

Os precatórios são dívidas da União reconhecidas pela justiça em decisões das quais não cabem mais recursos. Ao defender a mudança nas regras no ano passado, o governo informou que o objetivo seria espaço fiscal no Orçamento de 2022 para bancar o Auxílio Brasil, programa sucessor do Bolsa Família.

Porém, parte dos valores também foi destinado às emendas secretas, ao fundo eleitoral e ao reajuste de servidores (veja mais abaixo).

Com as novas regras para os precatórios, o Auxílio Brasil recebeu mais R$ 54,6 bilhões, elevando a dotação total do programa, em 2022, para R$ 89,1 bilhões, contra R$ 34,7 bilhões previstos anteriormente (valores do antigo Bolsa Família, que foi extinto no fim de 2021).

Além disso, outros R$ 27,5 bilhões foram destinados ao reajuste de benefícios previdenciários, por conta da alta maior da inflação.

No ano passado, segundo a IFI, foram gastos R$ 17,2 bilhões com o Bolsa Família, R$ 62,6 bilhões com o Auxílio Emergencial e R$ 9,2 bilhões com o Auxílio Brasil (a preços de dezembro de 2021). "Ao todo, esses gastos somaram R$ 90 bilhões [em 2021], valor quase idêntico aos R$ 89,1 bilhões previstos com o Auxílio Brasil em 2022", informou.

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Emendas de relator

Porém, de acordo com os cálculos da IFI, o espaço adicional para gastos aberto com a PEC dos Precatórios também foi utilizado para inflar em R$ 16,5 bilhões o valor das as chamadas emendas de relator em 2022, conhecidas como "orçamento secreto".

A transparência desses recursos é questionada em ações no Supremo Tribunal Federal (STF) e no Tribunal de Contas da União (TCU). O pagamento das emendas, no último ano, não exigiu identificação de quais parlamentares que solicitaram a verba e também não foi feita uma distribuição igualitária entre deputados e senadores — favorecendo os aliados do governo Bolsonaro.

"É o terceiro ano consecutivo em que o Congresso inclui a identificação das emendas de Relator no Orçamento. A modalidade parece se consolidar, a despeito das controvérsias em torno da transparência dada ao uso desses recursos. O valor de 2022 é menor do que o previsto em 2020 (R$ 30,1 bilhões) e em 2021 (26 bilhões), mas ainda representa montante expressivo, muito próximo do total destinado às emendas impositivas no Orçamento de 2022 (R$ 16,8 bilhões)", informou a IFI, no relatório.

Fundo eleitoral

Além disso, as mudanças nas regras de pagamento das sentenças judiciais (precatórios) também possibilitou ao Congresso Nacional elevar, em R$ 2,8 bilhões, o valor destinado ao fundo eleitoral, para a campanha de 2022, de acordo com números da IFI.

O valor aprovado para o fundo eleitoral, que irá custear as campanhas dos candidatos às eleições de 2022, foi fechado em R$ 4,93 bilhões. O montante de recursos para essa finalidade gerou embate até a véspera da votação. Na proposta de Orçamento do governo, enviada em agosto deste ano, o valor estava estimado em R$ 2,1 bilhões.

De acordo com a IFI, esse valor poderá subir ainda mais, uma vez que a Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) de 2022, que serve de referência para o orçamento deste ano, contempla R$ 5,7 bilhões para o fundo eleitoral.

"Na Proposta Orçamentária enviada pelo Executivo, em agosto, o valor previsto era de apenas R$ 2,1 bilhões. No Congresso, por meio de emenda do Relator Geral, no valor de R$ 2,8 bilhões, os recursos chegaram a R$ 4,9 bilhões, ainda inferiores ao montante definido seguindo a regra da LDO. Essa será mais uma fonte de pressão sobre o Orçamento durante a execução", acrescentou a IFI.

Reajuste a policiais

Os números da IFI mostram que a aprovação da PEC dos Precatórios também possibilitou a autorização, no orçamento deste ano, de R$ 1,8 bilhão para reajuste da Polícia Federal (PF), da Polícia Rodoviária Federal (PRF) e do Departamento Penitenciário Nacional (Depen).

O reajuste somente para essas carreiras está gerando protestos na administração pública. Nesta terça-feira (18), servidores federais fizeram uma manifestação em Brasília para pedir a reestruturação de carreira e reajuste salarial. Estavam presentes, entre outros, servidores do Banco Central e de agências reguladoras.

A manifestação faz parte de um pacote de reivindicações que reúne funcionários públicos federais, convocado pelo Fórum Nacional Permanente de Carreiras Típicas de Estado (Fonacate).

Também na terça, o vice-presidente Hamilton Mourão disse que o espaço orçamentário para conceder aumento a diferentes categorias de servidores é "muito pequeno" e que o presidente Jair Bolsonaro ainda não bateu o martelo sobre o reajuste a agentes de saúde e segurança.

Rombo maior nas contas públicas

Com as mudanças nos precatórios, liberando um espaço adicional para despesas, a Instituição Fiscal Independente também calcula que o rombo (déficit primário) nas contas do governo federal ficará em R$ 106,2 bilhões neste ano, acima dos R$ 79,4 bilhões que estão estimados no orçamento de 2022.

"A IFI prevê um deficit ainda maior, da ordem de R$ 106,2 bilhões (1,1% do PIB), em cenário que combina queda da arrecadação, em proporção do PIB, e despesas primárias relativamente estáveis, com gastos do Auxílio Brasil substituindo em boa medida a redução nas despesas extraordinárias para enfrentamento da covid-19", informou, no documento.

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