O teto de gastos será a principal restrição fiscal em 2022, destaca a Instituição Fiscal Independente (IFI), vinculada ao Senado, no Relatório de Acompanhamento Fiscal (RAF) de setembro, divulgado nesta quarta-feira. A inflação e os precatórios (dívidas judiciais) são os fatores que pesam contra o cumprimento da regra, observa.
“Até meados deste ano, as perspectivas eram favoráveis ao cumprimento da regra, mas a resiliência da inflação e o crescimento atípico dos gastos com sentenças judiciais e precatórios reverteram rapidamente as expectativas”, diz o documento.
O Projeto de Lei Orçamentária Anual (PLOA) de 2022 foi enviado ao Congresso no fim de agosto sem uma solução para a questão dos precatórios. O valor a ser pago pelo governo com precatórios no ano que vem é de R$ 89,1 bilhões, o que comprime ainda mais o espaço para outras despesas.
A IFI analisa as medidas em discussão para lidar com o problema, como o parcelamento dos pagamentos e a retirada dessas despesas do teto de gastos, e conclui que qualquer uma dessas soluções, mesmo incorporada na Constituição, “não anularia os efeitos negativos sobre as expectativas dos agentes econômicos e, consequentemente, sobre a taxa de câmbio, a inflação e os juros”.
Nas contas da instituição, seria possível cumprir o teto de gastos no ano que vem com despesas discricionárias em R$ 104 bilhões e o pagamento integral dos precatórios. Sobrariam ainda R$ 14 bilhões para expandir o Bolsa Família ou seu substituto, o Auxílio Brasil.
“O quadro seria de risco moderado de rompimento do teto, na classificação da IFI, mas muito próximo de saltar a elevado”, já que o nível mínimo de despesas discricionárias para a máquina pública não paralisar (shutdown) é estimado em R$ 103 bilhões.
O documento afirma ainda que, com Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) de 8% e Índice Nacional de Preços ao Consumidor (INPC) de 8,3% em 2021, a folga inicial no teto de gastos seria de R$ 17,2 bilhões em 2022.
Se o IPCA e o INPC ficarem em 9% e 9,3%, respectivamente, esse espaço cairia para R$ 4,9 bilhões. Neste caso, o Bolsa Família só poderia ser ampliado em pouco menos de R$ 2 bilhões.
A IFI destaca que o quadro fiscal é desafiador: “O risco fiscal, particularmente, materializa-se nas tentativas de mudar a Constituição para ampliar espaço orçamentário em ano de eleições gerais e no avanço da reforma do Imposto de Renda, cujo efeito seria negativo ao erário.” Além disse, há apreensão quanto à contratação de gastos permanentes com base em aumentos cíclicos de receita.
O balanço de riscos contempla fatores como o aprofundamento da crise hídrica e energética, a alta dos juros, o quadro ainda grave da pandemia e o avanço de uma agenda de reformas que pode piorar o sistema tributário e turvar as regras fiscais. “Há ainda o risco político-institucional, mais difícil de precificar nos cenários preditivos.”
Projeções
O Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro deve crescer 4,94% em 2021 e 1,67% em 2022, projeta a IFI no relatório. O PCA deve acumular alta de 8% neste ano, caindo para 3,90% no ano que vem.
“O quadro de baixo crescimento aparentemente contratado para o segundo semestre e a pressão inflacionária corrente mais generalizada (que se traduz em maior inércia para o próximo ano) estão promovendo uma nova rodada de revisões nas expectativas de mercado para o desempenho do PIB e do IPCA em 2021 e 2022”, diz a IFI.
Para a instituição, a piora do risco fiscal e a “intensificação do risco político associados à estabilidade das instituições democráticas” geram incerteza adicional à trajetória prospectiva da inflação e do PIB.
O documento destaca que a probabilidade de estagnação é alta na segunda metade do ano. “A IFI mantinha uma projeção de 4,2% para o PIB de 2021, já com viés de alta desde o RAF de agosto, e passou a 4,9% agora, mas em um contexto de piora evidente do quadro prospectivo. Isto é, a revisão seria maior, não fosse o novo futuro que se desenha.”