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PIB e inflação melhoram contas públicas, que devem voltar ao azul em 2025, diz IFI

Teto de gastos ficará ameaçado apenas em 2027, mas antes disso, o próprio presidente da República poderá, em 2026, alterar a regra de correção do teto

Por Idiana Tomazelli
Atualização:

BRASÍLIA - O maior crescimento da economia brasileira em 2021 e o aumento da inflação vão contribuir para uma melhora nas contas públicas neste e nos próximos anos, aponta a Instituição Fiscal Independente (IFI) do Senado. O órgão divulgou nesta quarta-feira, 16, novas projeções para atividade, resultado primário e dívida pública e prevê um cenário mais benigno, mas alerta que o desafio fiscal está longe de ser totalmente superado.

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Além de a dívida bruta cair em relação a estimativas anteriores, o governo deve voltar a ter contas no azul mais cedo, em 2025, e o teto de gastos (a regra que limita o avanço das despesas à inflação) ficará ameaçado apenas em 2027. Antes disso, porém, o próprio presidente da República poderá, em 2026, alterar a regra de correção do teto.

Nas contas da IFI, o PIB deve ter um crescimento real de 4,2% em 2021, mais que os 3% previstos anteriormente pelo órgão. Em um cenário otimista, esse avanço poderia chegar a 5,4%.

Já a dívida bruta deve encerrar o ano em 85,6% do PIB. Em maio, a IFI projetava que esse patamar seria de 91,3% do PIB. Antes dos maiores sinais de retomada, economistas chegaram a estimar que a dívida ultrapassaria a barreira dos 100% do PIB, o que acabou não se concretizando.

O teto de gastos está fortemente pressionadopelo aumento dos gastos obrigatórios e pelo desejo do Congresso Nacional de turbinar obras e fortalecer políticas sociais. Foto: Arquivo/Agência Brasil

Segundo a IFI, uma redução equivalente a 0,9 ponto porcentual virá do menor rombo fiscal, projetado para o ano em R$ 197 bilhões. Outros 3,0 pontos porcentuais de diminuição vêm do PIB maior. Há ainda fatores como a devolução adicional de recursos pelo BNDES e redução de gastos com juros que contribuem para o cenário mais favorável.

As projeções de PIB e dívida consideram um aumento nominal do PIB de 12,6%. Esse dado é influenciado pelo deflator, uma medida do efeito de preços sobre o cálculo da renda gerada pela economia no ano. Com o PIB nominal avançando 15%, a dívida bruta cairia a 83,1% do PIB em 2021. O cálculo dá uma ideia de sensibilidade da dívida em relação ao PIB nominal. O cenário otimista da IFI, porém, é menos favorável que isso, com dívida bruta em 83,9% do PIB ao fim do ano.

Segundo o órgão do Senado, a trajetória da dívida voltou a ficar próxima do pré-crise, mas em um nível maior, o que mostra a “cicatriz” deixada pela pandemia de covid-19 nas contas públicas. No entanto, a estabilização da dívida no médio prazo deve ser uma tarefa mais fácil. O indicador deve ficar em 87,1% do PIB entre 2025 e 2026, baixando a 85,5% do PIB em 2030. A IFI observa, porém, que o desafio fiscal não se anula.

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Além disso, segundo o órgão, o quadro mais benigno deve ser encarado com cautela, pois um ajuste fiscal por meio de alta de preços é “concreto, mas não sustentável”.

“A estratégia de ajustar as contas públicas com mais inflação é arriscada, porque pode levar à alta do custo médio da dívida e colocar a perder os ganhos de curto prazo”, diz a IFI. Segundo os economistas da instituição, a persistência de pressões inflacionárias poderia levar à necessidade de elevar juros, que seria precificada antecipadamente pelo mercado, afetando o custo da dívida e pondo a perder os ganhos observados em 2021.

Felipe Salto, diretor executivo da Instituição Fiscal Independente do Senado. Foto: Dida Sampaio/Estadão

"Ajuste em cima de inflação é perigoso. Se o efeito produzido pela inflação a curto prazo for mal interpretado, o risco é caminharmos para um quadro fiscal combinado com inflação média mais alta e, consequentemente, juros crescendo ainda mais. Isso levaria para o ralo os ganhos que hoje aparentam ser muito grandes", diz o diretor-executivo da IFI, Felipe Salto.

"De fato, há uma melhora que deve ser registrada, mas a forma como o governo reagirá a ela definirá o futuro da economia e da consolidação das contas públicas. Ainda estamos com dívida superior à dos emergentes em mais de 30 pontos de PIB", acrescenta.

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Teto ganha sobrevida

O cenário mais benigno para as contas públicas afastou os riscos mais imediatos de rompimento do teto de gastos. A dinâmica mais favorável das despesas deu “sobrevida” ao teto, que ficará sob alto risco de estouro apenas em 2027. 

Criado em 2016, ainda no governo Michel Temer, a emenda constitucional do teto dá ao presidente da República autorização para modificar a regra de cálculo por meio de um projeto de lei complementar a partir do 10º ano de vigência do limite, o que ocorrerá em 2026. Hoje, o limite é corrigido pela inflação acumulada em 12 meses até junho do ano anterior.

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Na prática, o cenário atual da IFI indica que, no ano em que há maior risco ao teto, seu cálculo já poderá ter sido modificado. Antes disso, em 2025 e 2026, o risco ao teto é considerado “moderado” pelo órgão do Senado.

Na avaliação de Salto, a sobrevida do teto mostra que a PEC emergencial, aprovada para permitir o acionamento dos gatilhos de ajuste em despesas obrigatórias, “não servirá para nada em termos de aprimoramento de mecanismos de ajuste estruturais”. O texto prevê o disparo dessas contenções quando a despesa obrigatória chegar a 95% do gasto total. Com a trajetória mais benevolente, isso pode levar mais tempo, até que eventualmente o teto tenha sua regra alterada pela lei complementar.

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“Isso já estava claro nas versões anteriores dos cenários da IFI. Agora, mais ainda. A inflação é o fator preponderante, ao lado de medidas de contenção da despesa que não têm lastro, como é o caso do não reajuste salarial. Note que militares tiveram reajustes, por exemplo”, diz Salto.

Ele observa ainda que o teto de gastos se beneficiará de um ponto de partida mais folgado devido à inflação em maior. Para 2022, ano eleitoral, a IFI calcula uma folga líquida de R$ 47 bilhões no teto, que poderá ser “integralmente gasta” em programas como o Bolsa Família turbinado e despesas discricionárias, que incluem investimentos.

As despesas discricionárias devem subir de 1,5% do PIB em 2021 para 1,9% do PIB em 2022, calcula o órgão.

O governo tem uma estimativa mais conservadora e prevê que a folga no teto será de R$ 25 bilhões em 2022.

Contas no azul em 2025

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Em seu novo cenário fiscal, a IFI prevê que as contas públicas voltarão ao azul em 2025, quando o governo deve registrar um superávit de R$ 10 bilhões, ou 0,14% do PIB. A partir daí, as contas continuariam melhorando até oscilar em torno dos 0,9% do PIB em 2030.

No cenário anterior da IFI, o superávit voltava apenas em 2030. Isso significa que a dinâmica recente de crescimento e inflação pode antecipar em meia década o reequilíbrio das contas. Os economistas do órgão alertam, porém, que essa estratégia não é sustentável no longo prazo e que é preciso persistir na agenda de ajustes.

Em um cenário otimista, com PIB maior e inflação mais branda, o superávit retornaria antes, em 2024, equivalente a 0,59% do PIB. No cenário pessimista, as contas ficam mergulhadas no vermelho até o fim da década.

Paulo Guedes, ministro da Economia de Jair Bolsonaro Foto: Dida Sampaio/Estadão

Para este ano, a IFI projeta déficit primário de R$ 197 bilhões. A estimativa considera um gasto de R$ 54 bilhões com o auxílio emergencial, com prorrogação do benefício por mais dois meses. Ao Estadão/Broadcast, porém, o ministro da Economia, Paulo Guedes, já afirmou no início da semana que a extensão deve ser de três meses.

Segundo a IFI, as despesas discricionárias também podem ficar maiores devido a revisões nas obrigatórias. O órgão tem estimativas menores de algumas despesas em relação ao número sustentado pela equipe econômica, como INSS (-R$ 2,3 bilhões), pessoal (-R$ 2,7 bilhões) e Benefício de Prestação Continuada (-R$ 0,7 bilhão), além de custeio e capital de outros poderes (-R$ 3,9 bilhões).