CBPILU040820150299PIB Crédito: Danilson Carvalho/CB/D.A Press.

Crise política pode fazer PIB desacelerar para perto de 1% em 2022

Publicado em Economia

ROSANA HESSEL

Enquanto o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) insiste em criar uma crise institucional, a confiança no país e no governo derrete em meio à crise política e a piora no cenário econômico. As estimativas de crescimento do país estão sendo revisadas para baixo e tudo indica que haverá um crescimento pífio do Produto Interno Bruto (PIB) em 2022, cada vez mais perto de 1% do que de dos 2,05% atualmente previstos na mediana das projeções do mercado coletadas no boletim Focus, do Banco Central.

 

“Esse crescimento mais perto de 1% pode ocorrer se continuarmos nessa situação política de crise em 2022. Por enquanto, estamos com 1,8% (de previsão para o PIB do ano que vem), mas com viés de baixa”, alertou o economista-chefe da MB Associados, Sergio Vale. Para o PIB de 2021, as estimativas da consultoria são de crescimento de 4,7%, o que coincide com as estimativas de analistas que reconhecem que as chances de o PIB crescer acima de 5% estão diminuindo, apesar dos avanços na vacinação contra a covid-19, porque ainda há muitas incertezas em relação aos impactos da variante Delta, devido à série de riscos no caminho, como inflação, crise hídrica e desemprego elevado, que contribuem para retomada mais lenta do que o previsto pelo governo.

O especialista da MB alertou para os riscos que estão aumentando em relação ao teto de gastos — emenda constitucional que limita o aumento das despesas à inflação do ano anterior e  única âncora fiscal em vigor –, que está sendo burlado pela Proposta de Emenda à Constituição (PEC) dos precatórios elaborada pelo Ministério da Economia, como bem apontou o relatório da Instituição Fiscal Independente (IFI), divulgado ontem (10/8).

“O efeito de uma medida que preconiza produzir espaço fiscal, mas à custa das regras do jogo, causará uma turbulência relevante sobre as expectativas do mercado. O ganho que se observa na superfície será rapidamente suplantado pelo prejuízo causado ao quadro fiscal agregado, via juros e dívida pública”, escreveram os economistas e diretores da IFI Felipe Salto e Daniel Couri no relatório.

Sergio Vale reforçou o alerta para o aumento do risco fiscal, especialmente, com o casamento de conveniência entre o Centrão e o governo Bolsonaro, que acabaram resultando nos pacotes anunciados do novo Bolsa Família e da PEC dos precatórios, que levantaram mais dúvidas do que certezas sobre a capacidade do governo conseguir evitar um descontrole nas contas públicas e o respeito a teto de gastos.  “Os valores que estão sendo colocados para o novo Bolsa Família serão difíceis de caber no teto ano que vem. Mas, como a solução é político-eleitoral, o fiscal sairá perdendo. É mais um tiro no pé que vemos um presidente dar. E, dessa vez, é ainda pior, porque se coloca um risco à democracia que não existia antes”, explicou.

O economista-chefe do Banco Fator, José Francisco de Lima Gonçalves, reforçou que as incertezas estão aumentando enquanto Bolsonaro insiste na crise institucional e em ameaças ao regime democrático. “O clima está horroroso e o cenário é de juros altos, câmbio valorizado e de economia para baixo. A PEC dos precatórios é o cúmulo da incompetência e mostra que a questão fiscal só vai piorar e, com isso, o Banco Central ainda terá mais trabalho, pois a economia brasileira não deverá crescer acima de 5%, neste ano, e dificilmente crescerá acima de 2% no ano que vem”, alertou. Ele contou que está revisando as estimativas e reconheceu que o dólar não deverá ficar abaixo de R$ 5 tão cedo nessa atual conjuntura e, com a inflação cada vez mais elevada, o brasileiro ainda precisará conviver com o encolhimento da renda e com o desemprego elevado.

Conforme dados do Banco Central divulgados nesta quarta-feira (11/08) sobre o questionário feito pré-Copom, o percentual de economistas prevendo viés de queda nas projeções do PIB de 2022 passou de 24% para 29%. Já os que tinham viés de alta, encolheu de 17% para 12%.

Cenário previsível

Apesar de manter em 5,4% as projeções do PIB brasileiro de 2021, Marcos Ross Fernandes, economista-chefe do banco Haitong, atualmente prevê 1,5% de expansão da economia em 2022 — uma das mais pessimistas no mercado atualmente. De acordo com ele, o fato de o Banco Central sinalizar um aumento mais forte na taxa básica de juros (Selic) e por um período mais longo deve contribuir para esse cenário de PIB mais fraco no ano que vem.

O  economista do banco chinês também reconheceu que a deterioração das expectativas e queda da confiança também são dos ingredientes adicionais para um PIB mais fraco. “O agravamento da crise institucional e a aproximação das eleições presidenciáveis tenderão a aumentar as incertezas e possivelmente pesarão nas decisões de consumo e investimento dos agentes econômicos”, explicou. “O crescimento global tende a ajudar, mas incertezas persistem por conta da pandemia: apesar da vacinação rápida e do maior controle da pandemia, ainda acreditamos que os efeitos negativos da pandemia podem pesar em 2022. O exemplo recente da variante Delta é ilustrativo. Esse cenário pode se agravar se os países não conseguirem atingir níveis maiores de vacinação”, alertou.

“Já tínhamos uma visão de que o BC iria levar o ciclo pra mais longe. Enquanto o Focus estimava 6,25% a 6,5% para a Selic, antevíamos 7.25%. Agora, o Focus está prevendo Selic em 7,25% e nós estamos com 7,75%. O efeito defasado da política monetária vai pegar o Brasil mais em cheio no primeiro semestre de 2022. Nesse sentido, acredito que o setor manufatureiro, que tem uma centralidade grande na cadeia produtiva brasileira e que sustentou a recuperação entre o fim de 2020 e começo de 2021, será um dos setores que mais sofrerá com essa normalização”, explicou Fernandes.

Na avaliação do analista, outros fatores que devem contribuir para essa desaceleração no PIB será a oferta de crédito mais restritiva. “O  endividamento das famílias está no seu ponto mais alto. Com juros subindo e com o fim de todas as políticas de renda e de suporte a crédito, a inadimplência, possivelmente, vai subir e isso vai limitar a oferta de crédito. Os bancos também, aos poucos, vão aumentando as provisões. Isso possivelmente vai acontecer a despeito do Open Banking e da maior competição bancária associada a isso”, acrescentou.