Brasil
Group CopyGroup 5 CopyGroup 13 CopyGroup 5 Copy 2Group 6 Copy
PUBLICIDADE

Por Fabio Graner e Lu Aiko Otta, Valor — Brasília


Foi quase um mês de discussões e seguidas idas e vindas, ameaças e ataques mútuos, para que governo e Congresso finalmente se entendessem para uma saída ao impasse do Orçamento de 2021, que deve ser sancionado até a próxima quinta-feira.

A solução encontrada para a novela passou pela concordância de se fazer vetos parciais (em um total da ordem de R$ 20 bilhões, sendo pouco mais da metade de emendas do relator-geral e o restante de cortes em gastos do Executivo e outras emendas), uma das alternativas já esperadas, conforme mostrou o Valor.

A surpresa foi que esse caminho acabou sendo combinado com um expediente até poucos anos atrás utilizado no país, mas que havia sido rejeitado desde que a ortodoxia tomou as rédeas da economia brasileira: retirar partes das despesas ligadas à pandemia do resultado primário considerado para o cumprimento da meta fiscal.

Esse caminho foi permitido com a aprovação do projeto de lei do Congresso Nacional número 2 (PLN-2), que lembra o conceito PPI/PAC/Minha Casa, Minha Vida, programas que desde 2006 (até 2014) eram retirados do objetivo fiscal anual. A diferença é que naqueles anos (entre 2006 e 2014, principalmente) os gastos fora da meta eram de investimentos públicos. Agora, são para socorrer empresas e turbinar o caixa da Saúde principalmente para se adquirir vacinas. A proposta, que teve a benção do governo, curiosamente foi apresentada pelo senador petista, Rogério Carvalho (SE).

Embora algumas análises apontem que o processo representou uma derrota do ministério da Economia, na pasta a percepção é oposta. A leitura no Bloco P é que o entendimento ficou de bom tamanho, fazendo com que o orçamento tenha se tornado “exequível” e as emendas originalmente acordadas em R$ 16,5 bilhões possam ser cumpridas. As despesas obrigatórias (como Previdência), que estavam subestimadas, agora poderão ser recompostas, por meio de um novo projeto de lei. E os gastos fora das regras fiscais, na visão da Economia, são plenamente justificáveis, pois há uma segunda onda da pandemia e a reação é necessária e não pode ser tão amarrada.

Há alguma preocupação com o fato de no PLN 2 não ter se estabelecido um limite para o gasto fora das regras fiscais, mas o entendimento na pasta é que, como terá que haver Medida Provisória para autorização dessas despesas (o chamado crédito extraordinário), será possível evitar uma gastança descontrolada.

A ideia, de certa forma, lembra a chamada “PEC fura-teto”, proposta do ministro da Economia, Paulo Guedes, que veio à tona na semana passada e que foi alvo de grande polêmica e de verdadeira guerra de bastidores no governo. Guedes foi acusado de fazer aquilo de que tanto acusava aqueles que dele discordam no governo, mas o titular da Economia negava que o trecho mais polêmico, a liberação de R$ 18 bilhões para qualquer tipo de gasto fora das regras fiscais, seria de sua lavra.

Enquanto a polêmica se desenvolvia e os ataques do Congresso cresciam, principalmente de um irritado presidente da Câmara (Arthur Lira), que se mostrava agressivo principalmente com Guedes e os senadores, a nova articulação política tentava colocar panos quentes e amainar a crise. O objetivo era encontrar o caminho determinado pelo presidente Jair Bolsonaro: cumprir acordos, mas com segurança jurídica. O temor maior era deixar um orçamento que, com irregularidades e crimes fiscais (como já sinalizava o TCU), representasse mais um flanco de vulnerabilidade e risco de impeachment ou inelegibilidade do chefe do Planalto.

Com o veto parcial e a garantia de R$ 16,5 bilhões, somados à flexibilidade para lidar com a pandemia, bateu-se o martelo. O acordo, contudo, contém algumas polêmicas. Além dos gastos fora do teto e do resultado primário, ainda há dúvidas sobre detalhes, como quais emendas e quais gastos do Executivo serão efetivamente cortados. E se o acerto foi suficiente para equilibrar as contas.

Alguns economistas dizem que não.

É o caso do especialista em contas públicas, Guilherme Tinoco. Para ele, a peça orçamentária continua com um buraco da ordem de R$ 20 bilhões a R$ 30 bilhões, apesar do acordo. O desfecho mais provável é que as despesas discricionárias do governo federal estarão baixas como nunca se viu. “Ninguém cedeu”, disse ele a respeito do acordo. “Pegaram gastos e jogaram para fora da meta, mas continuamos com um buraco”, disse, avaliando que a promessa de cortes de emendas foi insuficiente.

A forma tradicional de lidar com esse problema é cortar em despesas discricionárias do governo. Elas estão estimadas em R$ 112 bilhões. “Para compensar o rombo, teriam de recuar para perto dos R$ 80 bilhões”, disse. “É um nível muito baixo, pontuou”, completou. A situação, disse, pode ser amenizada se, a exemplo do que ocorreu no ano passado, as despesas com o Bolsa Família puderem ser contadas como sendo do Auxílio Emergencial (que está fora do teto).

Pode também haver alguma “surpresa”, nas despesas obrigatórias, com gastos menores do que o esperado. O especialista, porém, acha pouco provável que isso ocorra.

O diretor-executivo da Instituição Fiscal Independente (IFI), Felipe Salto também aponta que o desequilíbrio do Orçamento de 2021 ainda não foi resolvido. É possível que, ao longo do ano, o governo tenha de contingenciar (bloquear) mais recursos destinados a financiar emendas do relator.

Pelas contas da IFI, a peça orçamentária aprovada em março “estoura” o teto em R$ 31,9 bilhões. Ou seja, com os ajustes anunciados, da ordem de R$ 20 bilhões, ainda faltariam cortar perto de R$ 10 bilhões.

Para suprir essa diferença, haverá três opções sobre a mesa: cortar ainda mais as despesas do Executivo, o que colocaria a máquina em risco de shutdown (paralisação); cortar ainda mais as emendas do relator; ou descumprir o teto. “Das três, a mais forte é o teto”, diz. Trata-se de uma regra prevista na Constituição. Como as despesas discricionárias do governo já estão fortemente comprimidas, a solução mais provável é cortar emendas do relator, avalia Salto. “É onde tem excesso”, justificou.

Outro ponto polêmico é que, no PLN2, foi aprovada uma permissão para se bloquear despesas discricionárias para se recompor gastos obrigatórios sem precisar de um projeto de lei.

Salto interpreta que o texto permite ao governo contingenciar as emendas do relator para se cumprir a regra do teto de gastos e não para cumprir a meta fiscal de resultado primário, como tem sido tradicionalmente acionado, o que seria uma novidade no arcabouço das contas públicas.

“O acordo resolveu parte do problema e jogou água na fervura, mas os problemas continuam presentes”, disse, ao ser questionado se o provável contingenciamento das emendas do relator não reeditaria a atual crise política entre o Congresso e o governo, mais particularmente com a equipe econômica.

Para o consultor de orçamento do Senado, Vinícius Amaral, com esse mecanismo, o governo quer empurrar para frente a decisão de enviar um projeto de lei recompondo os gastos obrigatórios, administrando até ter uma clareza maior sobre o cenário para essas despesas, sendo a principal delas Previdência.

Apesar de não enxergar um grande problema em retirar algumas despesas do teto de gastos e do resultado primário, Amaral afirma que a solução encontrada e todo o processo de impasse do orçamento derivou do “negacionismo sanitário” do governo, que não planejou adequadamente sua atuação nesse ano e, por isso, teve que correr para construir uma saída que gera alguma incerteza.

 — Foto: USP Imagens
— Foto: USP Imagens
Mais recente Próxima Anvisa pede ao STF suspensão do prazo para autorizar vacina Sputnik V

Agora o Valor Econômico está no WhatsApp!

Siga nosso canal e receba as notícias mais importantes do dia!

Mais do Valor Econômico

A expectativa é que o governo encaminhe o principal texto da regulamentação da reforma nesta quarta-feira

Presidente da Câmara ainda atribuiu ao Congresso louros por bom ano de Lula em 2023

Lira admite erro ao chamar Padilha de desafeto pessoal

O veículo atualmente pertence a Robert McFagan, um fã de Ayrton Senna, e está disponível para compra no site Auto Trader

Carro que pertenceu a Senna é colocado à venda por R$ 3,2 milhões

A PEC concede aumentos salariais de 5% a cada cinco anos de trabalho para membros de Judiciário e Ministério Público, ministros do TCU, defensores públicos e delegados da Polícia Federal, entre outros

PEC dos quinquênios teria impacto de pelo menos R$ 81,6 bi até 2026, diz consultoria do Senado

O ex-deputado, filho de imigrantes brasileiros, tentava retornar à Câmara dos EUA após ter o mandato cassado no ano passado

George Santos desiste de candidatura nos EUA após não conseguir arrecadar dinheiro

A companhia reportou lucro líquido de R$ 1,127 bilhão, no período; a receita líquida somou R$ 11,020 bilhões

Lucro da Neoenergia cai 7% no 1º trimestre

O impacto fiscal do programa será limitado a R$ 15 bilhões de renúncia de receita ou até dezembro de 2026, o que ocorrer primeiro; texto segue para análise do Senado

Câmara aprova projeto que restringe renúncia fiscal pelo Perse a até R$ 15 bi