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Opinião

Deterioração das contas públicas exige resposta urgente do governo

Situação fiscal crítica mostra que Executivo e Legislativo não podem mais protelar agenda de reformas

Cada dia que o Brasil passa sem aprovar reformas que tragam fôlego às contas públicas, a situação fiscal se deteriora e nos aproxima de um abismo trágico. O último relatório da Instituição Fiscal Independente (IFI), publicado esta semana, revela a gravidade do problema, que precisa estar no topo da agenda do governo.

É verdade que os indicadores melhoraram em relação à última análise, publicada em junho. Mesmo assim, o quadro é crítico. A recessão prevista para 2020 será de 5%, em vez de 6,5%. O déficit primário ficará em torno de R$ 780 bilhões, ou 11% do PIB, não mais em R$ 878 bilhões, ou 13%. O gasto primário do governo somará 27,4% do PIB este ano (ante 20% em 2019). Só com a pandemia, serão gastos 7% do PIB, ou quase R$ 500 bilhões, dos quais R$ 268 bilhões destinados ao auxílio a vulneráveis e R$ 35 bilhões ao benefício de preservação do emprego.

O gasto do governo com pessoal, 4,5% do PIB este ano, continuará a pressionar o custo do Estado para a sociedade. Apenas em 2022 poderá voltar ao patamar de 4,3% registrado no ano passado. Queda, só a partir de 2023. Isso supondo os efeitos de algum ajuste. A versão edulcorada de reforma administrativa encaminhada ao Congresso não mexe nos funcionários públicos da ativa e mal faz cócegas no Orçamento nos próximos anos. Mesmo que o Congresso aprove a PEC Emergencial, que prevê gatilhos (como congelamento de reajustes e contratações) para evitar romper o teto de gastos, o risco permanece altíssimo.

Para cumprir o teto em 2021, as despesas discricionárias do governo teriam de ser cortadas a irrisórios R$ 113 bilhões, ou 1,5% do PIB, o menor patamar desde pelo menos 2008. É inverossímil, já que qualquer programa de renda básica teria impacto imediato. Pagar R$ 300 mensais a 45 milhões ao longo de 2021, calcula a IFI, implicaria gastar mais R$ 118 bilhões.

Não é à toa que não se vislumbra superávit primário até 2030 ou, na hipótese otimista, até 2026. A relação entre dívida e PIB, prevê a IFI, crescerá para 93% este ano e chegará, no cenário base, a 100% até 2024. “Até lá, dificilmente serão alcançadas condições de sustentabilidade”, diz o relatório. O esforço fiscal necessário para isso seria da ordem de 3,9 pontos percentuais do PIB.

“O reequilíbrio das contas públicas”, afirma a IFI, “exigirá responsabilidade fiscal e reversão, ainda que gradual, do déficit primário que já persiste desde 2014, num ambiente bastante desafiador de pressões por novos gastos e baixo crescimento econômico”. O quadro exige do presidente Jair Bolsonaro e do Congresso um grau de dedicação às reformas que não temos visto. A proximidade do abismo fiscal comprova que não dá para adiar mais um segundo a agenda de reformas.