Por Gustavo Garcia e Sara Resende, G1 e TV Globo — Brasília


A Instituição Fiscal Independente (IFI), órgão ligado ao Senado, prevê uma retomada “lenta” da economia e um “risco elevado” de rompimento do teto de gastos em 2021. As projeções constam do Relatório de Acompanhamento Fiscal de novembro, divulgado nesta segunda-feira (16).

De acordo com o diretor-executivo do órgão, Felipe Salto, o Brasil só deve retornar ao patamar econômico registrado antes da pandemia do coronavírus daqui a dois anos, em 2022. A análise diverge das declarações do ministro da Economia, Paulo Guedes, que vem falando sobre uma retomada "em V".

“A recuperação [econômica] vai ser muito lenta. É um processo diferente do que aconteceu na crise de 2008-2009, em que a recuperação em ‘V’ aconteceu de forma mais clara", afirmou Salto.

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"Sobretudo, porque havia uma formalização no mercado de trabalho, tinha uma relação de preços relativos entre os setores de serviços e de indústria que favorecia o crescimento dos serviços e, portanto, contratação de mão de obra – mesmo a mão de obra pouco qualificada – de maneira mais intensa, o que, agora, não se verifica”, prosseguiu.

O termo "retomada em V" faz referência ao desenho do gráfico de desempenho da economia e indica uma queda acentuada, seguida de uma retomada acentuada e imediata. Seria diferente de um gráfico "em U", quando o trecho de queda se estende por mais tempo, ou em "L" – uma queda seguida de estagnação.

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Teto de gastos

No mesmo relatório, a IFI projeta um “risco elevado” de descumprimento do teto de gastos em 2021, apesar de melhora no cenário em relação à análise feita em junho.

“Risco de descumprimento do teto em 2021 continua elevado, mas cenário melhorou em relação à avaliação de junho. Neste novo cenário, para cumprir o teto de gastos em 2021, as despesas discricionárias do Executivo deverão ir a R$ 112,7 bilhões ou 1,5% do PIB, patamar historicamente baixo para esse conjunto de gastos”, diz trecho do relatório divulgado.

O teto de gastos é uma regra criada em 2016 para segurar as despesas públicas do governo federal. Na prática, ele impede que os gastos do governo cresçam mais que a inflação do período, o que prejudicaria o controle da dívida brasileira.

O órgão ligado ao Senado avalia que há “pouco espaço” para novas despesas primárias, em especial, para um novo programa de transferência de renda – algo que tem sido estudado pelo governo federal.

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“Com o gasto total atingindo o teto e gastos discricionários tão baixos, há muito pouco espaço para novas despesas primárias em 2021, especialmente um novo programa de transferência de renda ou de investimento em infraestrutura, que naturalmente teriam impacto fiscal relevante”, diz o documento.

“Eventual acréscimo dessas despesas deveria ser compensado com o corte de outras despesas primárias sujeitas ao teto. Esses fatores combinados fazem com que, na visão da IFI, o risco de descumprimento do teto em 2021 permaneça elevado”, completa o relatório.

O governo Jair Bolsonaro tenta viabilizar um programa social chamado Renda Cidadã para incorporar e substituir o Bolsa Família, aumentando o repasse por família. Mas, sob o teto de gastos, o governo ainda tenta encontrar a melhor forma de encaixar os custos adicionais no orçamento.

Outras projeções

Entre outras projeções, a IFI revisou a previsão de queda do PIB em 2020 de 6,5% para 5%. O relatório afirma que o quadro é "mais positivo" que o esperado há alguns meses, mas cita o peso de "quase R$ 500 bilhões" de estímulos econômicos como o auxílio emergencial de R$ 600.

"Obviamente, isso tem um impacto importante sobre a demanda agregada. E se coloca também a discussão da retirada desses estímulos, não só do ponto de vista social, mas do ponto de vista da recuperação da economia no ano que vem”, afirmou Salto.

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Para 2021, a expectativa da instituição é de um crescimento do PIB de 2,8%.

A previsão para a inflação (IPCA) também mudou. Antes, no cenário base, a projeção era de 1,4%. Agora, é de 3%.

A taxa básica de juros deve permanecer, segundo a IFI, em 2% até o fim de 2021.

Desemprego

De acordo com a instituição, o Brasil deve fechar 2020 com uma taxa de desemprego média de 13,8% da força de trabalho. O resultado, se confirmado, representaria uma queda de 8,8% da taxa de ocupação em um ano.

Para 2021, a previsão da IFI é pouco animadora: recuperação de apenas 1,8% da taxa de ocupação até dezembro.

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“O mercado de trabalho passou por uma deterioração importante que não aparece tão claramente na taxa de desemprego oficialmente calculada em razão de uma questão simples. As pessoas que perdem emprego muitas vezes deixam de procurar trabalho e isso afeta a força de trabalho em relação à população em idade ativa e, portanto, afeta a taxa de desemprego”, disse o diretor-executivo da IFI.

“Mas uma forma de a gente olhar essa precariedade é que a população ocupada deve terminar o ano caindo quase 9%, 8,8%, e a ocupação cresce, em cima dessa queda de 8,8%, menos de 2% no ano que vem. Isso significa que muita gente vai ficar a descoberto, em termos de emprego e/ou benefícios sociais”, acrescentou Salto.

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