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Economia

Policiais do DF, que tiveram reajuste de até 25% aprovado, já ganham mais que os de outros estados

Levantamento mostra que mediana dos salários dos PMs no Distrito Federal era de R$ 7.879 e a dos civis era de R$ 14.133, quase o dobro da nacional
Sessão remota do Congresso Nacional, que aprovou reajuste dos policiais do DF Foto: Jefferson Rudy / Agência Senado
Sessão remota do Congresso Nacional, que aprovou reajuste dos policiais do DF Foto: Jefferson Rudy / Agência Senado

RIO E BRASÍLIA - O reajuste nos salários dos policiais militares e civis do Distrito Federal, aprovado pelo Congresso Nacional na noite de quarta-feira, aumenta ainda mais a disparidade dos ganhos dessas categorias frente aos profissionais de outros estados.

Estudo dos pesquisadores Cláudio Hamilton Matos dos Santos, André Brito, Diogo Cavalcante e Felipe Martins, do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), mostra que a remuneração desses servidores na capital federal já é a maior do país, em comparação aos dos outros entes.

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O texto autoriza aumento de 8% para policiais civis e de 25% para PMs e bombeiros.

Segundo o levantamento, em 2016, a mediana dos salários dos policiais militares do Distrito Federal era de R$ 7.879, enquanto a dos civis era de R$ 14.133. Os valores são quase o dobro da média nacional de vencimentos, de R$ 4.527 e R$ 7.031, respectivamente.

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Ganho mesmo na crise

Os pesquisadores analisaram as remunerações de 2,48 milhões de servidores estaduais. Foram considerados os dados da Relação Anual de Informações Sociais (Rais), do Ministério da Economia, e dos portais de transparência dos estados, analisados em conjunto com a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad), do IBGE.

Em São Paulo, esses profissionais recebiam, considerando a mediana, R$ 3.716 e R$ 5.940 por mês, respectivamente. Já no Rio de Janeiro, segundo maior estado com servidores dessas categorias, a remuneração chegava a R$ 4.333, para militares, e R$ 8.230, para policiais civis.

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Segundo Cláudio Hamilton Matos dos Santos, um dos autores do estudo, uma das explicações para o salário maior é o fato de o Distrito Federal ter renda per capita superior à dos demais entes da federação.

Além disso, como o Fundo Constitucional do Distrito Federal, fonte do pagamento desses servidores, aumentou desde o início dos anos 2000, forem concedidos sucessivos reajustes salariais. Frente a 2005, esses servidores mais que dobraram seus ganhos, já descontada a inflação.

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Nem a crise econômica segurou os reajustes. Enquanto a remuneração média mensal de todos os servidores públicos perdeu valor real em 2018, frente a 2014, os militares tiveram ganho no período.

Em 2019, dos R$ 14 bilhões do fundo do Distrito Federal, R$ 13,5 bilhões foram para pagar pessoal. O custo estimado do aumento aprovado na quarta-feira é de R$ 505 milhões por ano.

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— Os gastos com pessoal já são enormes com relação à receita. Você não consegue comprar um respirador, não consegue comprar teste, pois não tem dinheiro, não consegue investir — diz Hamilton. — Não é contra categoria A ou B, o problema é isso acontecer no meio de uma pandemia, com muitos brasileiros perdendo emprego, em grave situação social. Deveria existir um movimento de solidariedade.

Segundo Felipe Salto, diretor executivo da Instituição Fiscal Independente (IFI), do Senado, o custo do reajuste dos policiais do Distrito Federal equivale a manter 3.507 pessoas em leitos de UTI alugados do setor privado por 90 dias, considerando uma diária de R$ 1.600 por paciente.

O pesquisador do Ipea avalia ainda que a pandemia agravará a situação financeira dos estados, reforçando a necessidade de reforma dos sistemas previdenciários locais.

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O entorno do ministro da Economia, Paulo Guedes, ainda não decidiu se vai pedir ou não o veto para o reajuste de policiais civis e militares do Distrito Federal. Um dos argumentos que estão sendo usados dentro do governo é que o aumento já havia sido negociado e prometido desde o fim do ano passado.

Mesmo assim, técnicos têm se queixado de que a aprovação da proposta com o amplo apoio do governo manda um sinal muito ruim neste momento. Para essa ala do ministério, enquanto a pasta se esforça para congelar salários de todos os servidores do país, inclusive médicos e enfermeiros, um reajuste de 25% é incongruente com o discurso oficial.

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Além disso, dizem que outras categorias poderão pressionar o Congresso para derrubar o eventual veto do presidente à permissão para conceder reajustes.

‘Farra eleitoral’

Na quinta-feira, ao participar de videoconferência do presidente Jair Bolsonaro com empresários, Guedes afirmou que os recursos que serão repassados a estados e municípios para o combate à pandemia não podem ser usados para reajustar o funcionalismo. Ele disse ainda que servidores que pedem reajuste querem “assaltar” o Brasil.

— O dinheiro da saúde não é para virar aumento salarial . É demagogia, é farra eleitoral se for nessa direção. O que o presidente está garantindo é que justamente esse dinheiro que ele está dando para estados e municípios vá para a saúde. E não para proselitismo eleitoral, não para aumento de salários — disse Guedes.

O ministro ainda fez uma distinção entre os servidores:

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— O funcionalismo público brasileiro está preparado para contribuir. Temos recebido em redes sociais apoio do funcionalismo. Agora, o militante típico, o sujeito que está a fim de tocar fogo no circo, esse está aproveitando que o gigante caiu e eles estão indo lá para assaltar o Brasil, para tirar dinheiro do Brasil.

Ele disse que Bolsonaro está disposto a vetar o aumento, mas ressaltou que, se o Congresso derrubar o veto, haverá um “suicídio fiscal”.