A forte expansão fiscal realizada pelo governo ajudou o Produto Interno Bruto (PIB) do terceiro trimestre a recuperar-se de boa parte da forte queda registrada no período de abril a junho, quando a economia foi nocauteada pela pandemia de covid-19. Aumento de crédito e a transferência de bilhões de reais às famílias impulsionaram a atividade, que cresceu 8,8% entre julho e setembro, segundo a mediana das estimativas levantadas pelo Valor Data junto a consultorias e instituições financeiras.
É uma alta expressiva, mas ainda insuficiente para compensar a queda de 9,7% no segundo trimestre, na série com ajuste sazonal. O intervalo das estimativas vai de 7,2% a 9,5%. No primeiro semestre do ano, a queda total do PIB foi de 11,9%.
Na comparação com o mesmo período do ano passado, o resultado ainda será negativo, mas as perdas devem ser menores. A mediana das projeções é de queda de 3,5%, após recuo de 11,4% no período anterior. O Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) divulga os dados das Contas Nacionais Trimestrais na quinta-feira, dia 3.
Recuperação
Segundo cálculo da Instituição Fiscal Independente (IFI), órgão ligado ao Senado, os gastos do governo no combate aos efeitos da pandemia devem chegar a R$ 496,8 bilhões ou 7% do PIB neste ano. “Foi uma expansão fiscal muito significativa. Nem o governo esperava uma demanda de 65 milhões de pessoas [pelo auxílio emergencial]. O aumento da massa de renda impulsionou a economia, mesmo com a queda forte do emprego”, afirma Rodrigo Nishida, economista da LCA Consultoria. A LCA estima aumento de 8,3% no PIB do terceiro trimestre sobre o segundo.
Nishida chama atenção para a revisão da série do PIB feita tradicionalmente pelo IBGE no terceiro trimestre, que num período atípico como o atual pode ser um fator decisivo no resultado.
Sob a perspectiva da demanda, as transferências permitiram que o consumo das famílias aumentasse 9,8%, segundo a mediana das estimativas. Cálculo do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (Ibre-FGV) mostra que a massa ampliada de renda das famílias cresceu 3,2%, mas sem as transferências teria caído 6% na pandemia.
A LCA estima um crescimento ainda mais significativo, de 14,3%. Já o investimento avançou 18,7% no terceiro trimestre, segundo a mediana, em grande parte por causa da base deteriorada de comparação, já que no segundo trimestre caiu 15,4%. Mas, à frente, as incertezas fiscais devem manter pressionada essa linha do PIB, que está cerca de 30% abaixo de seu melhor momento, em 2013. O consumo do governo deve ter crescido 4,1%.
O UBS atribui a maior parte da retomada da economia brasileira à expansão fiscal, que calcula em 8,3% do PIB. A instituição tem uma das projeções mais otimistas e estima alta de 9,5% no PIB do terceiro trimestre sobre o segundo e queda de 3,1% na comparação com o mesmo período do ano passado.
A indústria, que agrega transformação, segmento mineral, construção, produção e distribuição de água, luz, gás e construção civil, deve ter crescido 13,9% no terceiro trimestre, após ter caído 12,3% no segundo, na série com ajuste sazonal, segundo estimativa da XP Investimentos. “Pelo lado da oferta é o setor que vai puxar o crescimento do PIB no período, junto com o comércio”, afirma o economista Vitor Vidal, que destaca o desempenho do segmento de transformação, que se recuperou acima dos níveis pré-pandemia.
No PIB de serviços, o comércio deve puxar a alta do setor, estimada em 7,8% pela XP Investimentos. “A indústria de transformação e o comércio foram justamente os segmentos que se beneficiaram da pandemia, puxados pelo auxílio emergencial, pelo crédito e pela própria impossibilidade de se consumir serviços no período”, lembra Vidal.
Ainda nos serviços, a categoria “outros”, que inclui os serviços prestados às famílias e os fornecidos pela administração pública, como saúde e educação, deve ter crescido sobre o segundo trimestre, mas registrado um desempenho ainda muito fraco na comparação com 2019 por causa das medidas de isolamento social, que foram relaxadas, mas não totalmente.
“É um segmento que depende de aglomeração, de contato entre as pessoas, e por isso vai ficar longe de compensar as perdas”, diz Nishida, da LCA. Na comparação com o mesmo período do ano passado, depois de recuar 23,6% no segundo trimestre, essa categoria “outros” -- que responde por metade do PIB dos serviços - deve ainda cair outros 17%, estima a LCA.
Este conteúdo foi publicado originalmente no Valor PRO, serviço de informações em tempo real do Valor.