Economia

Brasil só terá resultado primário positivo em 2026, diz diretor da IFI

Segundo avaliação do diretor-executivo da Instituição Fiscal Independente do Senado (IFI), Felipe Salto, não terá crescimento econômico por estímulo da demanda ou políticas fiscais expansionistas

Anna Russi
postado em 26/11/2019 15:50
[FOTO1]O principal desafio econômico para 2020 será o ajuste fiscal. A avaliação é do diretor-executivo da Instituição Fiscal Independente do Senado (IFI), Felipe Salto. Os economistas da instituição prevêem, em um cenário base, que o Brasil só voltará a ter resultado primário superavitário em 2026.

;O Brasil ainda é um país desigual com nível de pobreza elevado. Então, temos que recuperar a capacidade do Estado de fazer as políticas públicas e para isso temos que controlar a Dívida Pública;, disse o economista ao participar, nesta terça-feira (26/11), do Correio Debate ;Desafios para 2020: o Brasil que nos aguarda;.

Salto explicou que o ajuste fiscal nos próximos anos se define em uma queda de dois pontos percentuais proporcional ao Produto Interno Bruto (PIB) no gasto com pessoal. ;Essa melhora nos indicadores de dívida exige um resultado primário de 1% a 1,2% do PIB para estabilizar a dívida. Ou seja, se hoje temos déficit de 1,2%, temos que transformar isso em um superávit de 1,2%. Em contexto de juros mais altos, isso poderia chegar a 2% ou 3% de superávit primário. Mas o que está por traz é uma queda expressiva do gasto com pessoal;, ressaltou.

Em um cenário otimista, a IFI projeta que o resultado primário positivo chegue em 2023. Já para um contexto pessimista, a expectativa se mantém na mesa que a do cenário base. Em 2019, o resultado primário vai registrar o sexto ano consecutivo de déficit. ;Se não transpusermos este obstáculo (ajuste fiscal), não vai haver o crescimento econômico por estímulo da demanda ou políticas fiscais estimulativas e expansionistas;, reforçou.

Segundo Salto, embora a crise tenha piorado o contexto da economia brasileira, o momento é de oportunidade para mudanças. ;O brasil passou por um período bastante obscuro de contabilidade criativa com desrespeito as metas fiscais, desrespeito às legislações, a própria lei de responsabilidade fiscal passou a ser negligenciada então vivemos um momento de oportunidade para mudanças;, garantiu.

A expectativa da instituição é de que o Teto de Gastos, principal regra fiscal do país, será descumprido em 2021. ;Mas essa é uma regra inteligentemente, porque prevê gatilho que são acionados automaticamente quando é rompido. Isso representa um ajuste brutal e significativo com o gasto de pessoal, que hoje representa cerca de 4,5%, já que se o teto for rompido no prazo esperado, e os gatilhos acionados, essa despesa pode passar de 4,5% para 2,3% até 2030. É um ajuste fiscal muito significativo mas que há de se discutir se é factível, porque uma boa redução dessa despesa significaria comprometer uma um conjunto de políticas públicas. Mas só o fato de existir a regra já é positivo porque coloca o ajuste fiscal no centro do debate então é importante;, lembrou.

Ele esclareceu que a constituição define que a se a despesa crescer acima da inflação passada o Estado fica impedido de dar reajuste e promover concurso, por exemplo. ;Isso implica em redução com gasto de pessoal no PIB. Se vai acontecer ou não é uma questão política a ser decidida, mas se não acontecer terá de substituir esses dois pontos por corte de benefícios sociais ou aumento de receitas;, analisou.

Para ele, a crise fiscal ainda levará tempo para ser resolvida, mesmo em um cenário de juros real baixo, que facilitam o controle da dívida. ;Depende da continuidade das reformas estruturais pós a previdência;, destacou. As projeções da IFI para o crescimento econômico de 2020 é de 2,2%. Já a dívida pública bruta, deverá alcançar 80,7% do PIB até 2024. ;Estamos praticamente em um cenário em que as condições de sustentabilidade que estavam distantes já estão muito mais próximas em um horizonte de curto a médio prazo. A dívida bruta este ano deve encerrar em 78,6% do PIB, de modo que o crescimento de 2 pontos (percentuais) nos próximos 4 ou 5 anos não é tão absurdo, inclusive, é uma desaceleração expressiva. Há um brutal ajuste fiscal em breve que é a devolução do dinheiro dos títulos emitidos pelo Tesouro como empréstimo ao BNDES (Banco Nacional do Desenvolvimento), que só este ano vão somar R$ 123 bilhões a 125 bilhões, e isso afeta a dívida bruta fortemente.Claro que esses fatores atípicos não recorrentes não resolvem todo o problema mas dão um fôlego para que se possa avançar no ajuste fiscal;, avaliou.

De acordo com o economista, em 2008 alguns especialistas em contas públicas, entre eles eu e o Mansueto Almeida, atual secretário do Tesouro, alertavam sobre o problema da contabilidade criativa. ;As metas fiscais começaram a ser corrompidas: uma série de gastos começou a ser abatido do resultado primário para ficar mais fácil cumpri-lo. Começou com investimento que era uma despesa nova então foi abatido, sendo à época 0,1% do PIB, quando chegou em 2013 o tamanho dos abatimentos superava a própria meta do resultado. Houve total distorção dos mecanismos de sinalização do mercado sobre o cumprimento da meta fiscal. O pilar da responsabilidade fiscal foi completamente destruído;, afirmou.

Nos últimos dois anos, o resultado fiscal parou de piorar, caidno de 3% para 1,3%. ;O sacrifício para que isso acontecesse foi nas despesas discricionárias, mas não há mais espaço para cortar nisso. Por isso precisamos avançar com as reformas, que precisam ter nome e detalhamento. A reforma administrativa combinada com as PECs (Proposta de Emenda Constitucional) emergencial e do pacto federativo pode ajudar a promover contenção significativa na despesa com o pessoal. O Estado não pode sobreviver com nível discricionária tão baixo;, acrescentou.

Salto entende que o Brasil é pródigo em criar regras fiscais, mas não em cumprí-las. ;Mas acredito que começamos a mudar isso porque desde a Lei de Responsabilidade Fiscal, a população entende a necessidade de respeito do dinheiro público e de que receitas tem que ser maiores que as despesas;, comentou.

Sobre o andamento da agenda reformista do governo pór previdência, o diretor da IFI acredita que muita gente dentro do senado preocupada com a questão fiscal. ;O congresso pode ter todos os problemas do mundo mas a crise fiscal fez com que a classe política percebesse a necessidade de se mexer;, completou. Na visão dele, o próximo ano será melhor que 2019, no entanto, o cenário ;ainda é complicado;.

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