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Economia Previdência

Análise: Bolsonaro antecipa concessões antes de tramitação do texto da reforma

Presidente indica possíveis mudanças em projeto, como idade mínima menor para mulheres, e surpreende equipe econômica
PesidenteJair Bolsonaro no Palácio do Planalto na tarde desta quinta-feira Foto: Daniel Marenco / Agência O Globo
PesidenteJair Bolsonaro no Palácio do Planalto na tarde desta quinta-feira Foto: Daniel Marenco / Agência O Globo

BRASÍLIA - Numa única tacada, o presidente Jair Bolsonaro conseguiu enfraquecer a recém-nascida proposta de reforma da Previdência preparada pela equipe do ministro da Economia, Paulo Guedes. O texto foi enviado ao Congresso há apenas nove dias e, como já era de se esperar num tema sensível como o regime de aposentadorias, não faltou quem quisesse alterar a proposta. Houve críticas, por exemplo, às mudanças sugeridas pela área econômica no pagamento de benefícios assistenciais para idosos pobres (BPC) e nas aposentadorias dos trabalhadores rurais. Na prática, o presidente antecipou concessões antes mesmo que o texto começasse a ser esmiuçado no Congresso.

Mas enquanto a equipe fazia reuniões com bancadas e lideranças para explicar a importância da reforma, uma surpresa veio diretamente do Palácio do Planalto. Em café da manhã com jornalistas nesta quinta-feira, o próprio Bolsonaro - que avalizou a proposta e foi pessoalmente colocá-la nas mãos do presidente da Câmara, Rodrigo Maia - disse que poderia aceitar as mudanças no BPC. E ainda acenou com uma redução da idade mínima de aposentadoria das mulheres, de 62 para 60 anos, e nas regras de pensão. Para essas, nem havia uma demanda forte do Legislativo ainda.

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Técnicos do governo não entenderam as declarações do presidente. E admitiram que falar em ceder assim tão cedo dentro do processo de negociação que envolve uma reforma da Previdência não é boa coisa. O governo ainda não tem uma base de apoio clara e mesmo dentro do partido do governo, o PSL, há quem diga que a reforma "não passa como está". Até o filho do presidente, senador Flavio Bolsonaro, já veio a público defender alterações. Ele sugere uma aposentadoria diferenciada, igual a de policiais , para guardas municipais.

As mudanças no BPC geram uma economia de pouco mais de R$ 28 bilhões aos cofres públicos em dez anos , segundo cálculos da Instituição Fiscal Independente (IFI). Mas a alteração da idade mínima tende a ser mais expressiva e pode acabar sendo combinada com outros ajustes que geram perdas para a reforma.

Para justificar a atitude do presidente, os técnicos dizem - sem muita convicção - que ele tem a sensibilidade política para tratar do assunto. Essa também é a avaliação de parte do Palácio do Planalto, que diz que isso pode facilitar a interlocução com o Congresso. O mercado, por outro lado, não entendeu o movimento de Bolsonaro dessa forma. As declarações do presidente ajudaram a Bolsa brasileira a amargar perdas nesta quinta-feira. A reforma da Previdência é o elemento que assegura a boa vontade dos investidores com o governo.

Enquanto isso, o ministro Paulo Guedes tem preferido não falar. Transferiu a tarefa para o secretário especial de Previdência e Trabalho, Rogério Marinho, e sua equipe, que passam os dias em entrevistas e reuniões com parlamentares.

Talvez seja o momento de Guedes conversar com o chefe para afinar o discurso e alertá-lo de que, mesmo com a necessidade de um ou outro ajuste no texto que viabilize sua aprovação, a reforma precisa trazer aos cofres públicos uma economia de R$ 1 trilhão em um década. Isso é o que foi prometido no dia em que ela foi anunciada. E é isso que vai ser cobrado do presidente que gosta de dizer que missão dada é missão cumprida.