Governo teve R$ 90 bi em receitas atípicas nas contas de 2017  

Foi a maior contribuição de verba extraordinária desde 1997, diz instituição vinculada ao Senado

O presidente Michel Temer sentado à mesa em reunião do Conselho da República e do Conselho de Defesa Nacional
O presidente Michel Temer em reunião do Conselho da República e do Conselho de Defesa Nacional - Marcos Corrêa/PR
Mariana Carneiro
Brasília

O governo contou com R$ 90,5 bilhões em receitas extraordinárias no ano passado e, dessa forma, conseguiu reduzir o rombo fiscal.

A estimativa, feita pelo IFI (Instituição Fiscal Independente), vinculada ao Senado federal, mostra que se tratou da maior contribuição de verba não recorrente ao Orçamento desde 1997 e representou 1,4% do PIB.

O número é superior ao de 2010, quando o governo contou com volumosos recursos da Petrobras, capitalizada com recursos da cessão onerosa, para alavancar receitas. Naquele ano, as receitas não recorrentes somaram 1,3% do PIB.

Sem essas receitas, o deficit do setor público (que inclui governo federal, estatais, Estados e municípios) teria sido maior e alcançaria 3,1% do PIB. O rombo orçamentário, entretanto, ficou em 1,7% do PIB ou R$ 110 bilhões.

O Refis, programa de refinanciamento de dívidas com o fisco, foi a principal fonte de receitas atípicas em 2017 e contribuiu com R$ 38,5 bilhões para as contas do governo, aponta a IFI.

Ao aderir ao Refis, as empresas tinham que desembolsar uma entrada do valor devido, que poderia ser de 20% para dívidas acima de R$ 20 milhões. Para as dívidas menores que este valor, o sinal era de 5%. Além do Refis do ano passado, o governo recolheu tributos referentes aos programas de refinanciamento de 2009, 2013 e 2014, além do chamado Refis das autarquias (dívidas com agências reguladoras, por exemplo) e o voltado a Estados e municípios, com o objetivo de regularizar a situação dos governos locais com a Previdência.

A segunda principal contribuição veio das concessões e outorgas, que somaram R$ 32,1 bilhões, segundo o IFI. Nesta conta, entraram as receitas obtidas com a privatização das hidrelétricas da Cemig e de campos de exploração de petróleo no pré-sal.

Segundo Gabriel Leal de Barros, diretor da IFI, o aumento da tributação de PIS/Cofins sobre combustíveis, recurso usado pelo governo para ampliar receitas no segundo semestre do ano passado, recolheu mais R$ 6,2 bilhões aos cofres do governo de maneira extraordinária.

Sua projeção é que o governo pode voltar a arrecadar volumosos recursos atípicos em 2018. O Refis deverá contribuir com mais R$ 24 bilhões e outros R$ 20 bilhões com concessões. O cenário mais provável, traçado pela IFI, é que o governo poderia recolher R$ 72,7 bilhões em verbas não recorrentes neste ano.

Em um cenário otimista, em que sairiam a privatização da Eletrobrás (R$ 12,2 bilhões) e o leilão de áreas hoje sob cessão onerosa da Petrobras, o governo poderia recolher mais R$ 40 bilhões, o que alçaria a verba extraordinária a R$ 112,7 bilhões. Este, no entanto, não é o cenário mais provável.

A IFI não vê riscos para o cumprimento das metas fiscais neste ano. Em 2019, de acordo com Felipe Salto, diretor-executivo da IFI, há risco de o teto de gastos -- que limita o crescimento das despesas à inflação -- não ser cumprido. Isso porque a margem de despesas passíveis de compressão se restringiria a cerca de R$ 20 bilhões, margem incapaz de cobrir despesas crescentes com salários do funcionalismo e com a Previdência.

Para tanto, frisou Salto, é preciso alterar regras sobre gastos obrigatórios. O pagamento de servidores, a Previdência e programas de transferência consomem 76% do Orçamento, frisou ele. Sem atuar sobre esses gastos, sobra pouco espaço de atuação ao governo.

Os reajustes dos servidores em 2017, sancionados pelo presidente Michel Temer em 2016, logo após assumir a Presidência, fizeram com que os gastos com folha do governo federal crescessem mais do que as despesas com a Previdência.

Pelos cálculos da IFI, os gastos com pessoal aumentaram 6,5% -- mais R$ 18 bilhões em despesas. Já com a Previdência, o crescimento foi de 6,1% (outros R$ 32 bilhões a mais em gastos).

Esse aumento foi compensado por cortes em despesas com investimentos, como o PAC (-26,6%) e com subsídios com os empregados no programa de moradia popular Minha Casa, Minha Vida (-56%).

Na divulgação do relatório mensal, nesta segunda-feira (19), em Brasília, os técnicos da IFI também mostraram que o governo apresentou estimativas infladas de despesas no fim do ano passado. Como consequência, gastos ficaram limitados e as contas fecharam com um retrato menos negativo do que o esperado -- o deficit do governo federal ficou R$ 30 bilhões abaixo do previsto.

Segundo levantamento da IFI, até novembro, as despesas de alguns órgãos já indicam que as despesas seriam bem menores do que projetava o governo, o que permitiria o aumento de despesas que estavam comprimidas.

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