Economia

Para analistas, cumprir meta sem aumentar impostos é tarefa difícil

Receitas com concessões e privatizações são consideradas incertas
Rombo recorde nas contas públicas Foto: Pixabay
Rombo recorde nas contas públicas Foto: Pixabay

SÃO PAULO - O governo ainda tem condições de cumprir a meta fiscal deste ano, que prevê um déficit de R$ 139 bilhões, mas, a cada dia, a conta fica mais difícil de fechar. Especialistas ouvidos pelo GLOBO avaliam que um novo aumento de impostos deve acontecer, já que diversas receitas do governo vêm sendo frustradas. Outras ações pontuais pelo lado das despesas, como adiamento do reajuste do funcionalismo, venda de ativos e elevação da contribuição previdenciária dos servidores são fundamentais, dizem os especialistas. Ontem, o ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, afirmou que a meta fiscal vem sendo analisada, mas que o número atual está mantido.

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O ex-presidente do Banco Central Gustavo Loyola avalia que a meta ainda é factível, embora a situação esteja ficando cada vez mais complicada, porque as receitas do governo vêm crescendo num ritmo menor do que as despesas:

— Nas nossas simulações, está ficando mais difícil cumprir a meta. Mesmo considerando receitas excepcionais, como a devolução aos cofres públicos dos precatórios com mais de dois anos que não foram sacados pelos beneficiários. Serão precisos mais cortes de despesas. Impossível não é, mas o fechamento da conta ficou mais difícil.

Ele afirma que não se pode descartar novo aumento de impostos, já que o governo enfrenta dificuldades no Congresso para ter receitas extras, como no caso do Refis, em que os deputados mudaram a proposta, dando descontos generosos em multas e juros. O governo tem pelo menos R$ 300 bilhões a receber de impostos de empresas.

O PESO DA PREVIDÊNCIA

José Márcio Camargo, professor da economia da PUC/RJ e sócio da consultoria Opus, avalia que, apesar de o cenário estar muito apertado, é possível que o governo cumpra a meta fiscal. Para Camargo, o governo vem sinalizando com medidas importantes, pelo lado do corte de despesas, como o aumento da contribuição previdenciária dos funcionários públicos e o adiamento do reajuste do funcionalismo:

— É difícil, mas é possível. O cenário político não está afetando a economia. Tanto que o presidente Temer autorizou aumento de impostos (PIS/Cofins sobre combustíveis), uma medida impopular, com o objetivo de alcançar a meta. E talvez até tenha que aumentar mais tributos.

Ele aponta o déficit da Previdência como principal problema das contas do governo, lembrando que, sem esses desembolsos, o país teria superávit primário:

— O rombo da Previdência equivale a 2,5% do PIB. Por isso, a reforma é importante.

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Fábio Klein, especialista em contas públicas da consultoria Tendências, avalia que as ações pontuais do governo podem ajudar a melhorar o quadro fiscal, mas que é difícil afirmar se a meta será cumprida. Uma das alternativas, diz, é buscar alguma medida que traga recursos a partir de receitas não tributárias (não derivadas de impostos e contribuições):

— As vendas de ativos e de participações acionárias, assim como as tentativas para tirar concessões públicas do papel, podem ajudar, mas são ações de tiro curto. Há cortes que podem ser feitos na rotina dos ministérios, como compra de maquinário e venda de bens imóveis, mas é uma iniciativa que, normalmente, não resolve o problema porque o efeito é pequeno. O reajuste de PIS/Cofins dos combustíveis ajudou a compensar as frustrações de receitas, mas “ficou mais ou menos elas por elas”.

Outra opção, na opinião de Klein, seria a venda de ações do Banco do Brasil detidas pelo Fundo Soberano do Brasil:

— Isso ajuda a compor receita primária, mas tem que ser devagar para não mexer muito com o preço das ações no mercado. E também não dá para atropelar a gestão de empresas estatais para fazer caixa.

Klein projeta um déficit primário de R$ 148 bilhões, parecido com o número de Instituto Fiscal Independente (IFI), do Senado, que estima um déficit em torno de R$ 144 bilhões. Mas as iniciativas do governo para melhorar o cenário fiscal podem fazer com que ele reveja sua projeção para algo mais próximo dos R$ 139 bilhões mantidos pelo governo.

DESCONFIANÇA FUTURA

Para o economista-chefe da Austin Rating, Alex Agostini, alterar a meta seria “muito indigesto” para o ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, do ponto de vista da credibilidade construída junto ao mercado. Mas, segundo Agostini, o controle de Meirelles sobre o cumprimento da meta tem um limite, que pode ser rompido pela pressão política, enfraquecendo sua sustentação. O economista considera a alternativa de reajuste de outro imposto, mas ressalta que seria mais um ingrediente de depreciação da já combalida popularidade do presidente Michel Temer:

— O não cumprimento da meta é uma questão mais moral do que econômica, mas pode gerar uma desconfiança futura.