Os gastos decorrentes das medidas de combate à crise causada pelo coronavírus e a piora do quadro macroeconômico vão elevar a dívida bruta brasileira ao equivalente a 84,9% do Produto Interno Bruto (PIB) neste ano, segundo estimativa da Instituição Fiscal Independente (IFI).
A projeção anterior, de novembro, apontava para uma relação dívida/PIB de 79,3%, após marcar 75,8% em 2019. O cenário base da instituição também prevê que até 2030 a dívida bruta terá chegado a 100,2% do PIB.
Assim, o horizonte de estabilização da dívida como proporção do PIB não ocorre mais em 2024, como esperado anteriormente e sim num período após 2030. E isso ainda dependerá de uma melhora do resultado primário por pelo menos mais três anos a partir daquela data.
A projeção da IFI para o déficit primário do governo central em 2020 subiu de R$ 124,1 bilhões para R$ 514,6 bilhões, ou 7% do PIB. As medidas tomadas para mitigar a crise explicam R$ 282,2 bilhões do aumento de R$ 390,5 bilhões esperado. Já o setor público consolidado, que inclui Estados, municípios e estatais, deve registrar déficit primário de R$ 546 bilhões, ou 7,5% do PIB.
Dos R$ 282,2 bilhões em medidas para mitigar os efeitos da crise, R$ 69,7 bilhões referem-se à redução de receitas (diferimento e redução de impostos) e R$ R$ 212,5 bilhões são aumento de gastos, como a transferência de R$ 600 a trabalhadores informais, compensação de redução de salários, transferências a Estados e municípios, créditos extraordinários para a Saúde, entre outros.
O déficit primário também vai se alargar com a contração da economia, que vai reduzir a arrecadação. A instituição espera queda de 2,2% no PIB de 2020.
No conjunto de fatores que não afetam a projeção de déficit primário, mas afetam a dívida bruta, a IFI relaciona três principais: o programa de crédito a micro e pequenas empresas, com lastro no Tesouro Nacional, no valor de R$ 34 bilhões em 2020, ou 0,5% do PIB; a interrupção dos fluxos de pagamentos de juros sobre as dívidas dos estados, no valor inicial de R$ 19,8 bilhões em 2020, ou 0,3% do PIB e a venda de reservas internacionais, no total de US$ 49,8 bilhões, entre janeiro e dezembro de 2020, ou 3% do PIB.
Na trajetória apresentada pela IFI em novembro passado, a dívida bruta crescia até um pico de 80,7% do PIB em 2024, para então estabilizar-se e iniciar lenta trajetória de queda. Em 2030, chegaria a 75,5%. Agora, não há redução nesse horizonte de dez anos, embora a alta perca força ao longo do tempo. Entre 2020 e 2021, a alta na dívida é de 2,4 pontos do PIB, e, entre 2029 e 2030, há um crescimento de apenas 0,7 ponto.
Assim, uma eventual melhora nesse cenário base dependeria de um maior esforço fiscal e agenda de reformas. “Mesmo que se possa vislumbrar um horizonte de estabilização para o pós-2030, o quadro de alta ininterrupta da dívida bruta exigirá atenção redobrada”, diz a instituição em seu relatório.
A IFI ainda estima que o déficit nominal – resultado primário negativo mais o pagamento de juros - deve atingir 11,7% do PIB em 2020, de 5,91% em 2019, e diminuiria a 6,4% do PIB até 2030. Os riscos de curto prazo para este cenário são de alta no déficit, diz a instituição. Isso porque ainda que o cenário base contemple medidas adicionais de combate à crise no montante de R$ 60 bilhões em gastos primários, incluindo possíveis transferências para Estados e municípios, outras ações podem ser necessárias para debelar a covid-19. O risco para o PIB também é de baixa.
A IFI ainda calculou um cenário otimista, em que a dívida bruta estabiliza-se em 82,7% do PIB em 2023 e encerraria em 71,7% em 2030. Nesse cenário, o déficit nominal passaria de 10,3% do PIB, em 2020, para 2,1% do PIB até 2030.
Em um cenário pessimista, com um transbordamento de ações contra a crise nos próximos anos, a dívida bruta atingiria um patamar de 138,5% do PIB, de 88,5% em 2020, numa trajetória considerada insustentável pela IFI. O déficit nominal saltaria a 12,6% do PIB em dez anos.
(Conteúdo publicado originalmente no Valor PRO, serviço de notícias em tempo real do Valor)