O pacote de medidas anunciado pelo governo nesta terça-feira (5) teve reação discreta do mercado financeiro, enquanto economistas repercutiram as propostas com cautela. A avaliação de analistas ouvidos pelo G1 é que as medidas são positivas e devem ajudar a reordenar as contas públicas, mas a dimensão do pacote gera dúvidas em relação ao que pode ser aprovado pelo Congresso.
O governo apresentou nesta quarta um pacote batizado de Plano mais Brasil, dividido em três Propostas de Emenda Constitucional (PEC). Elas foram entregues mais cedo ao Senado Federal, e inclui pontos como a distribuição e gastos de recursos pela União, estados e municípios, redução de despesas obrigatórias e exclusão de fundos públicos.
Na avaliação do economista-chefe da MB Associados, Sergio Vale, o plano apresentado é “ousado”, mas há uma incerteza sobre a capacidade política do governo para aprovar todas medidas. Em 2020, haverá eleição municipal, o que deve dificultar a tramitação de propostas que exijam um elevado números de votos. Para ser aprovada, uma PEC precisa de 308 votos na Câmara dos Deputados e de 49 no Senado.
“É um plano ousado, com itens difíceis de serem aprovados, como a diminuição dos municípios, e uma conjunção muito grande de PEC para serem aprovadas”, afirma Vale.
Em razão dessas incertezas, Jason Vieira, economista chefe da Infinity Asset, diz que “avaliar o quanto esse pacote vai gerar de economia é bem difícil”.
“O pacote traz pontos importantes – e vários polêmicos –, mas ele é muito grande. Isso traz dúvidas sobre o quanto disso vai passar no Congresso”, diz Vieira.
Para Felipe Salto diretor-executivo da Instituição Fiscal Independente, órgão ligado ao Senado, as medidas vão “na direção correta”.
“O país passa por um desequilíbrio fiscal há vários anos, a dívida vem escalonando e contra isso não adiantam reformas como a da Previdência, que têm efeitos no longo prazo. É preciso medidas emergenciais”, diz Salto. “Agora precisa ver como isso vai ser recebido pelo Congresso."
Apesar do tempo político mais apertado, o economista-chefe da INVX Global Partner, Eduardo Velho, avalia que o governo pode ter alguma margem de manobra para negociar as reformas, dado o quadro de melhora da economia – os juros estão em queda, e atividade econômica, segundo ele, dá sinais de melhora na margem.
“Não são medidas fáceis de serem aprovadas, mas, mesmo não tendo uma base formal, o governo mostrou que tem um número razoável de votos”, afirma Velho.
Mesmo com as dúvidas em torno da aprovação, o economista Roberto Luis Troster vê o plano como um avanço na reorganização das contas públicas, pois pode “corrigir algumas distorções”.
“O Brasil estava numa dinâmica de dívida pública em alta, mas o ponto de inflexão ficou mais próximo. Se esse pacote for aprovado, ficou mais próximo ainda”, diz Troster.
Veja os efeitos práticos do pacote econômico do governo e a repercussão no mercado
Mais reformas esperadas
Analistas relacionam as dúvidas em relação à aprovação do novo plano com a expectativa em torno de outras reformas que eram esperadas para depois da Previdência – especialmente a tributária e a administrativa.
“Existe uma grande quantidade de coisas ainda pelo caminho, como a reforma tributária e a administrativa. Uma série de temas que exigem um grande esforço congressual”, comenta Jason Vieira. “Em termos de reformas, o clima é favorável, mas é exatamente a dimensão do pacote que faz com que exista muita dúvida ainda.”
Na avaliação de Sérgio vale, o governo sinaliza, ao propor um novo pacote, que a equipe econômica deve deixar a reforma tributária “em segundo plano”. Mas, para o economista, ela deveria ser “o foco de discussão”.
Destaques
Do novo plano, Salto destacou como positivas as medidas da PEC emergencial. Segundo ele, o texto cria gatilhos que já estavam previstos na regra de ouro, mas que, na prática, a proibição do governo de emitir dívida para bancar despesas correntes (como gastos administrativos) “vem sendo descumprida há dois anos”.
Para o economista, também é interessante, dentro do Pacto Federativo, a proibição que o Tesouro avalize empréstimos tomados pelos municípios junto aos bancos – pela proposta, só poderá dar aval para crédito de organismos multilaterais. “Aumenta a responsabilidade dos governos locais em relação à dívida que eles fazem.”
Já Vieira considera importantes as medidas que trazem um "alerta em relação à redução do Estado", como a diminuição dos municípios. Por outro lado, o economista vê com preocupação que um trecho da proposta possa, "de alguma maneira, abrir uma brecha para o Congresso se sentir confortável para mexer na regra de ouro".
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