Por Darlan Alvarenga, G1 — São Paulo


Com os governos em crise, as privatizações são necessárias para acelerar a retomada do investimento na economia brasileira, avaliam especialistas consultados pelo G1. Eles alertam, no entanto, que a escolha de projetos não deve considerar apenas as receitas extras, mas também uma melhora na eficiência das estatais e dos serviços prestados à população.

Levantamento do G1 mostra que há ao menos 238 projetos em desenvolvimento pelos governos federal, estaduais e capitais no Brasil. O objetivo é obter recursos para fechar as contas públicas e atrair investimentos privados.

Venda da Cedae aprovada na Alerj; Rio enfrenta crise fiscal e venderá ativos para ajustar contas públicas — Foto: Gabriel Barreira/G1

"Os projetos precisam ser pautados pela busca da maximização da eficiência e não como uma alternativa para solução de caixa de curto prazo", disse Rodrigo Reis, sócio fundador do Radar PPP, empresa que monitora os negócios entre governos e iniciativa privada.

Para ele, os projetos de concessão e PPP (parceria público-privada) exigem planejamento e visão de longo prazo. "É comum políticos se declararem favoráveis a projetos com o argumento de falta de recursos. Contudo, as PPPs e algumas concessões podem introduzir compromissos fiscais aos governos muito semelhantes ao dos contratos públicos tradicionais", observa.

Mais investimentos

Para o economista Cláudio Frischtak, sócio da Inter.B Consultoria, tanto as privatizações quanto as concessões são necessárias para garantir a retomada do nível de investimentos e desafogar a necessidade de aportes públicos nos caixas de estatais.

"Não vejo a nossa situação fiscal de reverter ao ponto que tenhamos recursos públicos para investimentos nos próximos 10 anos", afirma.

Levantamento da Inter.B mostra que o volume de investimentos em infraestrutura no país caiu 26% em 2017 na comparação com 2016, para R$ 90,38 bilhões, ou o equivalente a 1,37% do PIB – o pior patamar das últimas 5 décadas. Até 2015, o índice se manteve acima de 2%.

A avaliação de Frischtak é que os leilões já realizados e os em elaboração ajudarão a recuperar o nível de investimentos no país já a partir deste ano. A previsão é que o montante alcance R$ 101,5 bilhões. "Se tiver modelo consistente, regulação previsível e projetos de boa qualidade, poderemos checar a 4% do PIB daqui a 3, 4 anos", avalia.

Dificuldade de tirar projetos do papel

Dados do Radar PPP mostram que prefeituras, governos estaduais e União bateram recorde de projetos lançados em 2017, com 340 tentativas de tirar concessões ou PPPs do papel. Desse total, entretanto, apenas 3 resultaram em contratos assinados. Em 2016 a taxa de êxito foi melhor, com 13 contratos em um universo de 181 projetos anunciados.

Ferrovia Norte-Sul é um dos projetos que o governo federal quer conceder à iniciativa privada — Foto: Reprodução/TV Anhanguera

Apesar da dificuldade dos governos de tirar os projetos do papel em ano de eleições, a expectativa é de novo recorde de projetos em 2018. "Chegamos ao número de 103 contratos de assinados no Brasil [desde 2004] e há um aumento relevante e crescente da participação dos municípios brasileiros", destaca Reis.

Entre os segmentos com maior potencial de crescimento, ele cita iluminação pública, saneamento e resíduos sólidos.

"O processo de privatização não tem mais volta. O governo não tem mais condições de tirar recursos do caixa para investir em infraestrutura. E não podemos mais ter empresas estatais dependentes do Orçamento", resume o secretário especial do Programa de Parcerias de Investimentos (PPI), Adalberto Santos de Vasconcelos.

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442 estatais no país

O número de estatais no Brasil é acima da média mundial. Levantamento divulgado no ano passado pelo Observatório das Estatais da FGV, coordenado por Márcio Holland, ex-secretário de Política Econômica do Ministério da Fazenda, identificou 442 estatais no país, sendo 149 sob controle da União. Desse total, 101 são subsidiárias e 95 são controladas por Petrobras, Eletrobras e Banco do Brasil. Nos países da OCDE (Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico), a média é de 50 estatais.

"A grande maioria das 442 estatais não cumprem mais a sua função social, que é atender ao interesse coletivo com sustentabilidade e eficiência" - Márcio Holland, ex-secretário de Política Econômica do Ministério da Fazenda

O ex-secretário cita como exemplo de estatais deficitárias os Correios, as instituições financeiras de fomento e bancos estaduais como Banrisul, BDMG, Banpará e Badesul.

Márcio Holland, professor da FGV e ex-secretário de Política Econômica do Ministério da Fazenda — Foto: Reprodução/Tv Globo

Estudo da Secretaria do Tesouro Nacional mostra que as estatais geraram mais custos do que retorno para a União nos últimos 5 anos. Segundo o documento, as empresas da União custaram R$ 122,31 bilhões ao governo entre 2012 e 2016, ao mesmo tempo em que geraram um retorno de R$ 89,35 bilhões neste mesmo período.

Outro estudo, da IFI (Instituição Fiscal Independente) do Senado Federal, mostrou que somente 18 estatais dependentes do orçamento da União custaram R$ 40 bilhões ao Tesouro Nacional nos últimos 2 anos.

Lista de estatais federais, segundo último relatório do Ministério do Planejamento — Foto: Divulgação/Ministério do Planejamento

Revisão de modelos

Holland ressalta que as privatizações ainda esbarram em modelos e estudos fracos para conseguir sair do papel. "Acho que o governo Temer colocou mal a questão em meados de 2017, pois anunciou privatizações sem apresentar o modelo e estudos qualificados de seus impactos", afirma.

O economista defende uma reedição do Programa Nacional de Desestatização (PND), com maior participação de órgãos controladores como Tribunal de Contas da União (TCU) e tribunais de contas estaduais para a definição das empresas passíveis de serem repassadas para a iniciativa privada e do modelo de privatização mais adequado para cada ativo.

"A história das estatais no Brasil é de sucessivos abusos do poder controlador. É fundamental que o assunto [privatização] retorne à agenda de política econômica, mas precisa vir mais qualificado, com anúncio de programa e sua governança", resume.

Infográfico mostra projetos que estão sendo oferecidos à iniciativa privada por União, estados e capitais — Foto: Infografia: Alexandre Mauro/G1

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