Economia

Henrique Meirelles: explosões no front econômico

Henrique Meirelles: explosões no front econômico

O ministro da Fazenda chegou ao cargo com jeitão de candidato óbvio à Presidência da República. Agora, parece ser o homem com o pior emprego do mundo

LUÍS LIMA E MARCOS CORONATO
28/07/2017 - 19h40 - Atualizado 29/07/2017 01h02
O ministro da Fazenda Henrique Meirelles (Foto:  ARMANDO PAIVA/AGIF/ESTADÃO CONTEÚDO)

Parece fazer 1.000 anos que se considerava aposta certa: Henrique Meirelles, no governo Michel Temer, percorreria o caminho aberto por Fernando Henrique Cardoso no governo Itamar Franco – o de ministro da Fazenda que cumpre uma missão difícil e chega à Presidência da República. Continua possível apostar no sucesso de Meirelles, mas ele se torna mais difícil a cada dia. Muita coisa precisará dar muito certo num período muito curto, para que o brasileiro sinta que a atual política econômica o salvou da crise. E, nos últimos dias, não foi nessa direção que as coisas caminharam.

Na semana que passou, Meirelles precisou manter o discurso de sempre – perseguição obstinada da meta das contas públicas, corte de gastos, reforma da Previdência –, enquanto ruídos variados soavam mais alto. Ele integra agora o governo mais impopular de que se tem registro. Houve boato no mercado financeiro de que ele sairia do governo. Um site divulgou os milhões de reais que ele recebeu por seu trabalho no setor privado nos últimos anos e acrescentou que ele manteve parte do dinheiro no exterior – nenhuma acusação de ilegalidade, mas um constrangimento para um homem público que prega confiança no Brasil. Ao mesmo tempo, Temer coloca a própria sobrevivência política como prioridade máxima, acima do reajuste de contas.

Às vésperas da votação, na Câmara, da denúncia que o acusa de corrupção passiva, num governo que precisa desesperadamente encolher e economizar, Temer criou mais cargos de confiança – foram 500 adicionais desde maio, segundo a ONG de fiscalização Contas Abertas. Ele também acelerou a liberação de dinheiro de emendas que deputados e senadores fazem ao Orçamento. O valor total empenhado (cuja liberação de recursos foi prometida) aumentou de R$ 102 milhões, entre janeiro e maio, para R$ 4,1 bilhões, entre junho e 19 de julho, um salto de 40 vezes. De acordo com a Contas Abertas, que fez o levantamento, os parlamentares que devem defender Temer no julgamento esperado para o próximo dia 2 de agosto receberam, em média, R$ 1 milhão a mais. Essas emendas são recursos previstos no Orçamento, cuja aplicação é indicada pelo parlamentar. Geralmente são destinadas a pequenas obras nas bases eleitorais dos parlamentares e ganham impulso em anos pré-eleitorais, como o atual.

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Essas promessas de gasto ocorrem num momento em que o mercado de trabalho, a atividade econômica e a arrecadação ainda não reagiram com força. O ajuste, prioridade absoluta de Meirelles, continua seriamente ameaçado. A resistência da crise política fez a votação da reforma da Previdência, principal pilar para o equilíbrio das contas públicas, ser adiada para data indeterminada. Por se tratar de uma emenda à Constituição, precisa do aval de três quintos dos 513 deputados, ou 308, um número ainda distante de ser consolidado. Sem ela, o teto de gastos – uma solução emergencial criada por Meirelles – será rompido até 2022, segundo o cenário traçado pela Instituição Fiscal Independente (IFI), órgão do Senado. Antes disso, porém, a combinação entre o descontrole do Orçamento e o limite imposto pelo teto total de gastos levará os serviços públicos a uma paradeira geral, enquanto o governo registra recordes seguidos de pior desempenho fiscal da história. No primeiro semestre, o descompasso entre receitas e despesas resultou em um rombo de mais de R$ 56 bilhões, o maior em 21 anos, desde que o Tesouro Nacional começou a organizar os dados.

O pato contra  os impostos na FIESP,ficou mais fácil criticar  a equipe econômica (Foto:  FELIPE RAU/ESTADÃO CONTEÚDO)

Tem sido difícil para o ministro pensar no médio prazo, porque os problemas emergenciais se acumulam. Já em 2017, está difícil conter o saldo primário (receitas menos despesas, sem contar o gasto com juros da dívida pública) num déficit de até R$ 139 bilhões. Para atingir esse objetivo, a equipe econômica vem cortando investimentos e deslocando verba de uma Pasta para outra. Meirelles se recusa a mudar a meta e sabe que seu cumprimento depende de mais de R$ 57 bilhões em receitas incertas, extraordinárias, a entrarem até o fim do ano. O cálculo da trajetória do déficit foi atrapalhado por outros reveses sofridos pelo ministro nas últimas semanas. Diante de um governo vulnerável, os congressistas não se dispõem nem a preservar medidas que garantam aumentos de receita. Os deputados desfiguraram um projeto que parcela dívidas de grandes devedores com a Receita Federal, o Refis, e adiaram para o ano que vem o retorno da cobrança sobre a folha de pagamentos para dezenas de setores, a chamada reoneração. A solução encontrada por Meirelles e sua equipe para remendar as contas foi velha e imediatista: elevar tributos. Subiram PIS e Cofins sobre combustíveis. Em uma ação complementar e mais estratégica, na semana passada o governo anunciou também um Plano de Demissão Voluntária (PDV) de servidores federais, o primeiro desde Fernando Henrique Cardoso, com o objetivo de economizar R$ 1 bilhão por ano. O efeito é pequeno e não imediato, mas indica a direção correta, em meio à guerra que se tornou a proteção do Tesouro Nacional.

A crise será longa. Os atos de Meirelles e os resultados obtidos por ele terão efeito para muito além do governo atual

Assim como diminuem as chances de o ministro conseguir construir um legado sólido apoiado no tremelicante governo Temer, o cidadão vê encolherem as expectativas de fim da crise econômica. Meirelles, como face mais visível da política econômica, tornou-se alvo fácil de críticas da oposição, da ala política do próprio governo e de parte do empresariado. Após o anúncio do aumento do PIS e Cofins sobre combustíveis, o presidente da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), Paulo Skaf, reagiu com “indignação” e botou para desfilar, em Brasília e em São Paulo, o pato gigante que se tornou símbolo da luta contra os impostos altos. Skaf classificou como “muito devagar” o ritmo de corte da taxa básica de juros, que caiu em mais 1 ponto, para 9,25%, na quarta-feira, dia 26. O presidente da Confederação Nacional da Indústria (CNI), Robson Braga de Andrade, disse que a alta tributária punirá as empresas. Outras entidades, como a Frente Nacional dos Prefeitos (FNP) e a Confederação Nacional de Dirigentes Lojistas (CNDL), também condenaram a medida.

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Meirelles enfrenta condições de trabalho péssimas e alheias a sua vontade. Em parte, porém, o próprio ministro contribuiu com a criação desse ambiente. A equipe econômica se concentrou demais em apenas duas reformas impopulares, a da Previdência e a trabalhista. Por comparação,  pareceu pequeno o empenho em outras frentes, como reformar a administração pública perdulária, reduzir a burocracia para as empresas (o que facilitaria a retomada da atividade) e corrigir falhas do mercado de crédito, que trabalha com juros dos mais altos do mundo. O brasileiro deve torcer pelo sucesso da política econômica de Meirelles, a única rota de saída da crise. A dificuldade na implementação dessa política, porém, fará com que seus resultados, na melhor hipótese, demorem a aparecer – e isso facilitará, na campanha de 2018, o surgimento de propostas alternativas irresponsáveis. Os atos de Meirelles e os resultados obtidos por ele terão efeito para muito além do governo atual – esteja o ministro ou não entre os postulantes à Presidência no ano que vem.

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