Um ano depois de aprovada, Lei das Sociedades Anônimas de Futebol tem balanço positivo

Da Agência Senado | 10/08/2022, 21h12

Sob pelo menos três pontos de vista, a lei que criou as sociedades anônimas do futebol (SAFs) deu bons resultados nos primeiros 12 meses de vigência. Ao permitir o equacionamento das dívidas de três grandes clubes e o início de gestões mais profissionais nessas agremiações, a Lei 14.193, de 2021, que teve origem no Senado, levou boas expectativas a 8,6% dos torcedores brasileiros, fatia representada por Cruzeiro, Vasco e Botafogo.

Os dois primeiros times fazem campanhas bem-sucedidas na Série B em 2022 e o Botafogo consegue até agora ficar fora da zona de rebaixamento depois de voltar à Série A. Ainda que tais desempenhos não estejam à altura das numerosas glórias passadas desses times, ter deixado o status de instituições falidas e com enormes dificuldades para montar elencos de alto nível já é meio caminho andado.

A SAF nasceu do PL 5.516/2019, apresentado pelo senador Rodrigo Pacheco (PSD-MG), e aprovado na forma de um substitutivo do senador Carlos Portinho (PL-RJ). Na avaliação de um ano feita por Pacheco em rede social, o novo marco regulatório do futebol tem dado esperanças de renovação a clubes centenários:

"A sociedade anônima do futebol (SAF) permitiu que clubes se transformem em empresas e está revolucionando o futebol brasileiro. No Brasil, quase todos os clubes seguem o modelo de associação civil. A legislação não era favorável e, infelizmente, esse tipo de gestão não funcionou adequadamente. Grande parte dos clubes enfrenta enormes dívidas e está muito aquém do potencial desportivo. A lei das SAFs cria um regime tributário próprio, com alíquota unificada. Permite a quitação das dívidas cível e trabalhista da pessoa jurídica original, e traz segurança jurídica na recuperação judicial".

Pacheco também destacou os aspectos de maior transparência que, no seu entender, o modelo da SAF possibilita, o que tem o potencial de atrair muito mais investimentos nacionais e estrangeiros aos clubes brasileiros:

"A lei das SAFs também traz mais transparência e governança corporativa. Obriga a existência do conselho de administração e do conselho fiscal; obriga a ter auditoria externa das contas por empresa independente; e obriga a publicação de demonstrações financeiras. O projeto equilibra o mercado, adequando os impostos à atividade, e traz segurança jurídica para a empresa que quer atuar com futebol. Inglaterra e Alemanha possuem clubes-empresas desde o século 19. Futebol gera empregos e renda. É um ativo do nosso país e a SAF irá ajudar a preservar e fortalecer os clubes brasileiros".

Otimismo

Em entrevista à Agência Senado, o senador Romário (PL-RJ), ex-jogador e campeão mundial de futebol em 1994, se diz otimista quanto à implantação do modelo da SAF. Quando jogava no Brasil, relembra o parlamentar, teve que conviver com gestões "amadoras e corruptas" em contraste com o alto desempenho sempre cobrado dos atletas por toda a cadeia que gira em torno do esporte, incluindo patrocinadores, jornalistas e torcedores.

— Não tenho dúvidas de que a SAF é uma evolução. É claro que uma mudança efetiva de gestão deve englobar, acima de qualquer modelo, o profissionalismo e a seriedade das pessoas. São elas que erram e acertam. Mas, sem dúvida, o modelo empresarial trazido pela SAF, com regras claras de governança e tratamento da dívida, representa uma oportunidade que favorece uma mudança que nosso país precisa.

Romário aprofundou-se um pouco mais sobre os problemas que enfrentou quando jogava no Brasil:

— Durante minha carreira, convivi muito no Brasil com dirigentes amadores, que tinham outras atividades e apareciam no clube de vez em quando para resolver alguma pendência. Um contraste enorme entre um ambiente desportivo cada vez mais profissional e competitivo, que já movimentava cifras altíssimas, e um ambiente de gestão totalmente amadora, baseada no improviso. Isso sem falar na corrupção que rolava solta, sem transparência e fiscalização. Foi assim que chegamos aos dias atuais, com diversos clubes endividados e quebrados. Não dá mais para aguentar isso. Espero que a SAF traga o choque de profissionalismo que o Brasil tanto precisa.

Cruzeiro, Botafogo e Vasco são exemplos de equipes que passaram por crises profundas recentemente, incluindo rebaixamentos no Campeonato Brasileiro, hiperendividamento e gestões marcadas por críticas à falta de profissionalismo, além de denúncias de corrupção. Os três viram na SAF uma porta de saída para a reconstrução de suas trajetórias centenárias, durante as quais revelaram craques para a seleção brasileira e sobretudo levaram entretenimento a dezenas de milhões de torcedores.

Cruzeiro

O primeiro grande clube a aderir ao modelo da SAF foi o Cruzeiro.

Após os bicampeonatos no Brasileirão, em 2014 e 2015, e na Copa do Brasil, em 2017 e 2018, a má gestão das contas do clube e o consequentemente hiperendividamento cobraram seu preço. E ele veio de forma rápida. Após ser rebaixado para a Série B do Campeonato Brasileiro em 2019, o time de Belo Horizonte fez campanhas apenas medianas na segunda divisão em 2020 e 2021 e ficou longe de retornar à Série A. 

Com a nova lei, sancionada em agosto de 2021, a direção do clube contratou a XP Investimentos visando à transição de seu modelo associativo para a SAF. Em novembro de 2021, a XP entrou em contato com o ex-jogador e empresário Ronaldo Nazário, o "Fenômeno", que já contava com experiência na gestão de futebol. Controlador do clube espanhol Valladolid, com 80% das ações, recentemente conseguiu que esse tradicional clube retornasse à La Liga, a prestigiada primeira divisão do país, assistida em todo o mundo. Após pouco mais de 40 dias de negociações, Ronaldo assumiu a direção da SAF do Cruzeiro. Adquiriu 90% das ações, assumiu a responsabilidade pelas dívidas da equipe (como prevê a lei), e comprometeu-se em investir pelo menos R$ 400 milhões nos primeiros cinco anos de parceria.

Após um início de gestão polêmico, hoje a equipe parece colher os frutos de uma gestão mais equilibrada. Um dos objetivos de Ronaldo era enxugar a folha de pagamentos, impedindo os constantes atrasos nos salários, e ter uma maior racionalidade em novas contratações. A equipe passou a dar mais prioridade à contratação de atletas livres no mercado. Hoje o Cruzeiro lidera com folga a Série B, e parece ter pavimentado o retorno à divisão de elite. Em recente evento da XP, Ronaldo mostrou mensagens de WhatsApp da época das negociações para adquirir a SAF do clube, e explicou que a segurança jurídica foi o que mais pesou:

"Até então eu não tinha intenção de fazer aquisição aqui no Brasil, justamente por não ter segurança jurídica. Mas recebi a mensagem da XP e isso mexeu comigo, devido à minha história com o Cruzeiro", escreveu Ronaldo, que foi revelado pelo clube mineiro em 1993. "Saí bem novinho de lá, o Cruzeiro abriu as portas do mundo pra mim. Vi um potencial gigantesco naquilo, igual ao tamanho da dívida que também é gigantesca. Mas ainda assim, vi um potencial ainda maior. O conselho e a torcida esperavam que chegasse um xeique árabe pondo dinheiro, pagando a dívida, injetando dinheiro sem projetos, sem processos, de modo que o conselho pudesse se perpetuar ali dentro tomando decisões. A verdade é que chegou um xeique brasileiro, com projetos e experiências do futebol espanhol. Eu tinha que saber como comunicar isso pro torcedor, pois tinha uma resistência do outro lado. Um medo natural se daria certo, se teria os investimentos adequados. Comecei a falar diretamente através de minhas lives com o torcedor, explicando passo a passo como seria feito. Foi difícil, mas ao mesmo tempo prazeroso."

Vasco

No domingo (7), o Vasco da Gama aprovou a venda da SAF do clube à empresa norte-americana 777 Partners. Com experiência na gestão de futebol, o fundo gere clubes de tradição em outros países, como o Genoa (Itália), o Red Star (França) e o Standard Liege (Bélgica).

A venda da SAF provocou euforia na torcida, ansiosa para que possam passar as agruras sofridas pelo Vasco no século 21. Com mais de 100 anos de história, o Vasco se orgulha de ter sido um dos primeiros clubes a contratar jogadores negros, ainda na década de 1930. Isso porque, sob a falsa bandeira do amadorismo, os negros até então não tinham espaço em praticamente nenhum clube. Na prática, o futebol no Brasil passou suas primeiras décadas com fortes traços de elitismo, apartando a inclusão de jogadores advindos das classes menos favorecidas.

O acordo do Vasco com a 777 Partners passa 70% da SAF do clube para a empresa americana. Em carta aberta à torcida, a direção lembrou o passado do clube na luta pelo profissionalismo, fazendo uma alusão com o tempo presente:  

"Não há dúvidas de que a SAF adapta o futebol vascaíno à nova realidade do futebol mundial. Dos 30 clubes mais ricos do mundo, 28 são empresas. O Vasco sempre foi pioneiro. Fomos um dos primeiros clubes brasileiros a abraçar o profissionalismo no futebol. Chegou a hora de profissionalizar também a gestão do futebol".

Desde que o Campeonato Brasileiro passou a ser disputado por pontos corridos (em 2003), o Vasco passou a viver na gangorra, com constantes idas e vindas entre as Séries A e B. E o pior é que, pela primeira vez, o clube, depois de ser mais uma vez rebaixado em 2020, não conseguiu voltar à elite no ano seguinte. Ainda na Série B, o planejamento da 777 Partners é garantir o acesso agora ao final de 2022, e incrementar os investimentos para 2023. O acordo prevê que a 777 assuma a dívida do clube (R$ 700 milhões), invista outros R$ 700 milhões no departamento de futebol nos próximos três anos e faça reformas nos dois centros de treinamento (CTs).  

Botafogo

O outro caso de maior repercussão de SAF no Brasil, no primeiro ano de vigência da lei, é o Botafogo.

A tradicional equipe carioca voltou a disputar a Série A em 2022, mesmo ano em que passou seu departamento de futebol ao empresário norte-americano John Textor, controlador da Eagle Holdings, em março. Ele adquiriu 90% das ações da SAF e comprometeu-se a investir pelo menos R$ 400 milhões no time. Esses investimentos já começaram, com a contratação de alguns jogadores badalados, como Patrick de Paula (que jogava no Palmeiras) e Lucas Piazon (que veio por empréstimo do Braga, de Portugal).

Após a euforia inicial da torcida, que viu a criação da SAF como uma verdadeira "tábua de salvação", o desempenho do Botafogo nesse início de parceria tem sido mediano. Hoje o time está na 12ª colocação Campeonato Brasileiro, para desagrado de parte expressiva dos torcedores. Mas a mensagem de Textor aos aficionados é que a SAF tem planos também de médio e longo prazos para o clube, num modelo de gestão mais estruturado e experimentado em países europeus. Textor também controla o tradicional clube inglês Crystal Palace, além de outros times na Bélgica e nos EUA.

Nova era

Em entrevista à Agência Senado, o CEO (diretor executivo) da empresa de consultoria de gestão desportiva Win The Game (ligada ao banco BTG Pactual), Claudio Pracownik, faz um balanço de um ano da Lei das SAFs.

Pracownik atua há mais de 30 anos na gestão de instituições financeiras, tendo sido COO (diretor operacional) dos bancos Pactual, Bozano Simonsen, Santander e Plural, e também CEO da Ágora Corretora e da Genial Investimentos. Advogado formado na Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ), foi vice-presidente de Finanças do Flamengo.

Em recente relatório, a Win The Game, que já tem como parceiros clubes de tradição como Fortaleza, Bahia e Guarani, indicou que a lei das SAFs movimentou, só no primeiro ano de vigência, mais de R$ 1,5 bilhão.  É "o início de uma nova era", segundo a empresa. Mas que só deve se consolidar após a criação de uma liga de futebol brasileiro nos moldes de outras já vigentes há décadas em mercados mais avançados, como os da Inglaterra, Alemanha, Espanha e França.

A criação da liga brasileira (Libra) vem sendo estudada por grandes clubes. O que se espera é que uma gestão profissionalizada administre torneios como o Campeonato Brasileiro, hoje nas mãos da CBF.

Além de Cruzeiro, Vasco e Botafogo, outros clubes que disputam o Campeonato Brasileiro também já criaram SAFs e buscam agora captar investimentos. São eles Coritiba, Cuiabá e América-MG. Na mesma situação estão outros times tradicionais, como Paraná e Figueirense. No total, 24 times já criaram SAFs.

Entre os grandes clubes que já estudam oficialmente o modelo, estão Flamengo, Corinthians, Palmeiras, São Paulo, Atlético-MG, Athletico-PR, Fluminense, Santos, Grêmio, Internacional de Porto Alegre e Bahia. No caso do Bahia, que é assessorado pela Win The Game, as negociações com o grupo City estão em estágio avançado. O City controla dez times ao redor do globo, entre eles Manchester City (Inglaterra), Palermo (Itália), Girona (Espanha) e Bolívar (Bolívia).

Para a Win The Game, a criação de outras SAFs também podem vir através de investimentos em equipes de médio porte, visando a exportação de revelações brasileiras para mercados de todo o mundo.

Agencia Senado -  Quais as vantagens que o sr. observa no novo modelo das SAFs, em relação ao modelo associativo tradicional de gestão que marca a história do futebol brasileiro?

Claudio Pracownik - Entendo que o novo modelo das SAFs é benéfico para a profissionalização do futebol. Mas lembro que as SAFs são um meio, não um fim. Ela não é determinante para que um clube seja bem-sucedido, mas oferece pela primeira vez em nossa história um caminho que traz, acoplado a ele, o acesso ao capital privado.

A maior parte das legislações anteriores versava sobre redução de dívidas e refinanciamentos. A Lei das SAFs inova ao apontar caminhos para a gestão profissional, de práticas de governança e compliance. São essas práticas que são partilhadas por investidores internacionais e nacionais. A lei também trata da reestruturação de dívidas e da recuperação judicial, que é uma prática muito segura e relevante para este mercado.

Só acho sempre importante reiterar que virar SAF não garante sucesso. Gestões irresponsáveis também podem ocorrer, se as práticas recomendadas não forem seguidas ou se a gestão for incompetente. Qualquer empresa ou empresário está sujeito a inadimplemento e falências.     

Agencia Senado - Mas neste 1 ano de vigência da Lei das SAFs, o sr. avalia que ela já produziu alguns bons resultados? 

Claudio Pracownik - Ainda é cedo para julgar os resultados concretos dessa lei. Mas avalio que um resultado concreto ela já trouxe, importante para a sociedade e o mercado esportivo brasileiro. Trazer à tona a discussão envolvendo a gestão profissional do esporte, práticas de governança e compliance. É a consolidação dessas práticas que vai transformar o esporte neste país.

Os clubes que viraram SAFs ainda não tiveram tempo para demonstrar a efetividade das ações que irão tomar a partir da conversão. Mas ainda estamos no início de uma maratona. Antigamente os torcedores protestavam quando empresários demonstravam interesse em adquirir os clubes para os quais torciam. Mas hoje é o contrário, os torcedores fazem manifestações para que seus clubes mudem suas práticas tradicionais de gestão e governança, abrindo-se para novos investimentos. Ou seja, a Lei das SAFs atende a um reclame social, e efetiva meios para que investidores estrangeiros e brasileiros enxerguem o potencial do produto "futebol brasileiro", gerando mais empregos, renda e crescimento do PIB.

Expectativas

De acordo com José Francisco Manssur, especialista em Direito Desportivo e sócio da Ambiel Advogados, o balanço de um ano supera muito as expectativas iniciais. Já são 24 clubes com SAFs constituídas e registradas na junta comercial em onze estados, segundo o levantamento da empresa, e mais dois por serem confirmados.  O advogado chama a atenção para o fato de que esses clubes foram aconselhados por advogados e ou consultorias econômicas, que deram aval a essas sociedades no sentido de verificarem a segurança jurídica da lei.

— Quero dizer que o trabalho do presidente do Senado, Rodrigo Pacheco, e do relator Carlos Portinho, foi algo que revolucionou o futebol brasileiro. O Congresso Nacional fez o seu papel e trouxe um ambiente seguro pra que o futebol brasileiro pudesse receber novos investimentos, retomar seu papel de protagonismo. Essa iniciativa do nosso Congresso já mostra o que vai fazer a virada do futebol brasileiro para que ele volte ao protagonismo do qual nunca deveria ter saído — avalia Manssur.

Segundo ele, a SAF já se incorporou ao repertório do futebol, tanto quanto as substituições dos treinadores e "um ou outro erro da arbitragem". O torcedores sabem do que se trata e estão envolvidos nas discussões sobre essa transformação, que não está se limitando aos três grandes times com sociedades anônimas a pleno vapor:

— Tem outros times tão relevantes quanto discutindo internamente [a constituição de SAFs] e que já até superaram o debate interno, como o América Mineiro, como o Atlético Paranaense, como o Curitiba. O fato de esses clubes estarem assessorados por advogados, e também por consultorias econômicas de grande porte, mostra que não é só um entendimento de quem fez a lei. Todo o mercado está enxergando a Lei da SAF como um instrumento seguro, sólido pra que os clubes constituam a sociedade anônima e possam receber investimentos, terem mais recursos, montarem equipes melhores, atraírem mais torcedores, disputarem em outro patamar, dentro do âmbito brasileiro e até internacional.

E já há sinais fortes, conforme o especialista, de que o padrão financeiro está mudando de fato pra quem está com SAF em andamento:

— O Cruzeiro e o Botafogo fizeram uma virada na forma de gestão financeira. O Cruzeiro cortou os gastos de forma bastante dura, e mesmo assim está conseguindo liderar a série B e está muito próximo e voltar a série A. Já o Botafogo recentemente também divulgou a notícia de que conseguiu renegociar as dívidas trabalhistas

Novo Projeto.jpgA propósito, Manssur nota que não se deve olhar para a SAF apenas do ponto de vista do dinheiro que entra pelos investidores, mas também do que sai para a satisfação de credores que tinham recursos comprometidos em times em pésssima situação:

— A SAF de forma nenhuma pode se caracterizar como uma espécie de calote nos credores.

Apesar do otimismo, o advogado rejeita a fantasia que algumas pessoas fazem da SAF como uma "varinha mágica" capaz de resolver todos os problemas de um clube:

— A constituição da SAF não é uma solução em si, mas um instrumento pra que os clubes de futebol possam adotar novas práticas de governança, de gestão, e, se tiverem responsabilidade financeira, voltarem a uma vida econômica saudável. A médio prazo, o que eu enxergo é uma convivência entre os clubes que desejaram e que vieram a constituir SAFs e outros clubes que decidiram se manter como associações. Vai haver um comparativo de desempenho. As próprias coletividades, os torcedores vão comparar o desempenho dos que instituíram a SAF com os clubes que se mantiveram como associações sem fins lucrativos, com seus processos políticos internos, e isso vai gerar uma discussão interna em vários outros clubes que nesse momento sequer pensam em constituir a SAF.

A longo prazo, Manssur espera que o futebol brasileiro que seja capaz de atrair muito mais receita do que atrai hoje e que seja capaz de se posicionar como segmento econômico relevante, que emprega pessoas, faz a economia girar, que cria empregos diretos e indiretos. No fim, a ideia é que possa retomar o seu protagonismo mundial, "não perdendo tão rapidamente os melhores atletas" e até disputando competições com equipes europeias, de igual pra igual:

— Precisamos fazer com que os nossos jovens voltem a se interessar primordialmente pelos nossos clubes, voltem a vestir a camisa dos nossos clubes e deixem  de ter tanto afeição pelos clubes do exterior. Porque nós somos o futebol pentacampeão do mundo e não fomos chamados de "o país do futebol" por todos esses anos à toa. Existe uma lista grande de investidores procurando clubes no Brasil. Então muito em breve os clubes vão encontrar esses investidores e vão poder fazer aí a esse casamento.

Esporte-educação

Por mais que o êxtase dos estádios seja a vitrine da SAF, a lei não veio apenas para alimentar os anseios de torcidas sempre ávidas de títulos. O marco regulatório estabelece que cada sociedade anônima do futebol deve instituir um programa de desenvolvimento educacional e social (PDE) para, em convênio com uma escola pública, adotar ações em prol do desenvolvimento da educação através do futebol, e do futebol através da educação.

As SAFs poderão investir na reforma ou construção de uma escola pública, ou na manutenção de quadras ou campos de futebol; na criação de um sistema de transporte de alunos qualificados à participação no convênio; na alimentação de alunos durante os períodos de treinamento e recreação; na contratação de psicólogos, nutricionistas e preparadores físicos, para o acompanhamento do convênio; e na compra de equipamentos necessários à prática desportiva.

Somente poderão participar do convênio alunos regularmente matriculados na escola conveniada e que mantenham o nível de assiduidade às aulas regulares e o padrão de aproveitamento definidos no convênio. Num país em que as mulheres têm por vezes de recorrer à Justiça para jogar em times, O PDE deve oferecer, igualmente, oportunidades de participação às alunas matriculadas nas escolas públicas, visando realizar o direito de meninas terem acesso ao esporte.

Agência Senado (Reprodução autorizada mediante citação da Agência Senado)