Após denúncias da CPI, ANS anuncia que vai monitorar irregularidades na Prevent Senior

Da Agência Senado | 06/10/2021, 14h01 - ATUALIZADO EM 06/10/2021, 17h35

A Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) vai instaurar um regime especial de direção técnica na operadora Prevent Senior. O anúncio foi feito nesta quarta-feira (6) pelo presidente da ANS, Paulo Rebello Filho, durante depoimento à CPI da Pandemia.  Segundo Rebello, a medida será aplicada a partir de 14 de outubro por conta das “denúncias novas e extremamente graves” reveladas pela Comissão.

A ANS vai investigar a pressão indevida sobre médicos para a prescrição do chamado “kit covid” e a realização de tratamentos experimentais em pacientes com covid-19. Questionado pelo relator da CPI, senador Renan Calheiros (MDB-AL), Paulo Rebello Filho disse que a ANS apura denúncias de que pacientes da Prevent Senior teriam sido tratados com ozônio, terapia que não tem eficácia comprovada contra a covid-19.

— Na legislação há expressamente a proibição de qualquer tratamento experimental. Não há possibilidade de acontecer na saúde complementar. Em razão de indícios que a gente precisa apurar melhor, estamos encaminhando pela decretação da direção técnica na operadora — explicou Paulo Rebello Filho.

O regime especial não é uma intervenção. Um diretor técnico, nomeado pela ANS, deve acompanhar fluxos e processos adotados pela operadora. Depois de analisar as eventuais “anormalidades administrativas”, o representante da agência poderia até recomendar a liquidação do plano de saúde. Mas, segundo Paulo Rebello Filho, esse não será o caso da Prevent Senior.

— O objetivo não é a retirada da operadora do mercado, mas garantir a qualidade assistencial aos beneficiários. Uma vez encontrando problemas assistenciais, pode haver a regularização ou, no fim da linha, a liquidação extrajudicial da operadora. O que não é o caso. Muito pelo contrário: a ANS vem monitorando, e a operadora não está nem de longe numa situação como essa — afirmou.

Segundo Paulo Rebello Filho, a agência entrou em contato com 42 médicos demitidos pela Prevent Senior durante a pandemia. Eles prestaram depoimento sobre as denúncias de pressão da operadora para a prescrição do “tratamento precoce”. A ANS também solicitou o compartilhamento de informações obtidas pela CPI da Pandemia.

O senador Humberto Costa (PT-PE) elogiou a decisão da ANS. Mas afirmou que o regime especial de direção técnica deveria ter sido instaurado “há muito tempo”.

— Demorou muito. Era para ter feito isso muito antes. Mas isso vai permitir que acabe com aquela bagunça que está acontecendo ali. A Prevent Senior não tem problema de ordem econômico-financeira. Ela lucrou, do ano passado para cá, mais de R$ 400 milhões. Ninguém venha dizer que a gente vai prejudicar os usuários. Pelo contrario: o que estamos fazendo é lutar para que o usuário tenha um tratamento digno e não seja cobaia — disse Costa.

Omissão

Para o vice-presidente da CPI, senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP), a ANS se omitiu diante de acusações apresentadas por médicos da Prevent Senior. O parlamentar reproduziu durante a reunião trechos de uma denúncia encaminhada à agência em abril deste ano. Paulo Rebello Filho disse só ter tomado conhecimento das supostas irregularidades em outubro, por meio da Comissão de Inquérito.

Em uma mensagem revelada por Randolfe Rodrigues, uma médica da Prevent Senior reforça a recomendação para a prescrição de cloroquina, mesmo para pacientes ainda não diagnosticados com covid-19. “Espirrou, toma”, escreveu a profissional de saúde.

O presidente da ANS disse não ser função da agência interferir na prescrição de medicamentos. Segundo ele, a responsabilidade por julgar a conduta dos profissionais cabe aos Conselhos Regional (CRM) e Federal de Medicina (CFM). O senador Fabiano Contarato (Rede-ES) criticou esse entendimento.

— O médico não pode usar o paciente como cobaia. O médico só tem que utilizar medicação com comprovação científica. O médico não pode falar: “Tem vacina, mas você deixa de ser vacinado. Toma azitromicina, hidroxicloroquina e ivermectina”. Parece que estamos na época medieval. Estamos retrocedendo. Estamos questionando se a Terra é plana — comparou.

O relator da CPI, senador Renan Calheiros, anunciou nesta quarta-feira que vai incluir o presidente do CFM, Mauro Luiz de Britto Ribeiro, no rol de investigados da Comissão. A Comissão aprovou em abril um requerimento para a convocação de Ribeiro, mas o depoimento não chegou a ser marcado.

— Em função dos fatos verificados na investigação, eu queria elevar à condição de investigado Mauro Luiz de Britto Ribeiro pelo apoio ao negacionismo, pela maneira como deu suporte à prescrição de remédios ineficazes e os defendeu publicamente e pela omissão diante de fatos evidentemente criminosos — justificou Calheiros.

Reclamações

A ANS acompanha 736 planos de assistência exclusivamente médica. São mais de 48 milhões de beneficiários atendidos, com mais de 1,5 bilhão de procedimentos por ano. Segundo o presidente da agência, o número de reclamações dos usuários cresceu durante a pandemia. A Prevent Senior, que tem 540 mil beneficiários, ocupa a 29ª posição entre as operadoras com mais reclamações registradas na ANS.

— Houve um número expressivo de reclamações. A partir de janeiro de 2020 até setembro de 2021, houve 284 mil reclamações. Não apenas sobre covid. Elas foram sanadas pelas operadoras num percentual de 91%. Quando restringe para a covid, em torno das 93% das questões foram sanadas — disse.

Questionado pelo presidente e pelo vice-presidente da CPI, senadores Omar Aziz (PSD-AM) e Randolfe Rodrigues (Rede-AP), Paulo Rebello Filho disse que os atuais usuários da Prevent Senior podem migrar para outros planos de saúde, sem a exigência de carência para a cobertura de tratamentos.

— Eles têm o direito de migrar e passar para outro plano. Pode colocar as características do plano para onde quer “portar”. Uma vez feito isso, é emitido um protocolo, e a operadora tem que fazer essa portabilidade em dez dias. Não estamos estimulando, nem motivando as pessoas a fazer isso. Até porque a operadora continua prestando serviços aos seus beneficiários. Não há qualquer problema no atendimento desses pacientes — explicou.

Ricardo Barros

Paulo Rebello Filho negou que o líder do Governo na Câmara, deputado Ricardo Barros (PP-PR), tenha sido responsável pela sua indicação para a ANS. No entanto, questionado pelo senador Renan Calheiros, admitiu que atuou como chefe de gabinete de Barros no Ministério da Saúde. O parlamentar ocupou a pasta entre 2016 e 2018.

— Ricardo Barros não teve nenhuma participação na minha indicação para a ANS. A minha indicação partiu do ministro à época, Gilberto Occhi. Foi ele que fez minha indicação — disse Rebello.

O senador Marcos Rogério (DEM-RO) destacou que o nome de Paulo Rebello Filho para ANS foi aprovado pelo Senado. O parlamentar lembrou ainda que o presidente Jair Bolsonaro chegou a retirar a indicação. No dia da votação, o líder do Governo, senador Fernando Bezerra Coelho (MDB-PE), informou que o Palácio do Planalto desistiu da retirada.

— Por escolha do Senado, Vossa Senhoria foi sabatinado e aprovado. Forçaram o presidente Bolsonaro a reconsiderar a indicação do vosso nome. Não sei quais foram as razões para que o presidente retirasse sua indicação naquele momento. Mas toda a narrativa é construída a partir de uma premissa falsa. Foi o Senado que decidiu peitar o presidente da República e manter a vossa indicação — afirmou Marcos Rogério.

Para o senador Fernando Bezerra Coelho, a ANS colaborou de forma efetiva na resposta brasileira ao coronavírus”.

— A agência adotou medidas como a previsão de cobertura de exames para detecção da covid-19, a viabilização da telesaúde, a alteração dos prazos de atendimento priorizando os casos de covid-19, a prorrogação dos prazos de obrigações das operadoras, dentre outras iniciativas — disse.

Agência Senado (Reprodução autorizada mediante citação da Agência Senado)