Participantes de audiência afirmam que não há apoio da OIT à reforma trabalhista

Da Redação | 19/06/2017, 17h57

Convidados de audiência pública na Comissão de Direitos Humanos (CDH), nesta segunda-feira (19), apontaram como falsas as afirmativas de que o projeto da reforma trabalhista (PLC 38/2017) obteve a chancela da Organização Internacional do Trabalho (OIT). Para os convidados, além de nunca ter existido manifestação de apoio de qualquer instância da OIT à proposta, as linhas da reforma colidem frontalmente com princípios consagrados nas convenções internacionais criadas a partir dos esforços dessa agência, braço da Organização das Nações Unidas (ONU) para questões de trabalho.

Foi lembrado que a OIT, por meio de sua Comissão de Peritos, divulgou relatório após a recente Conferência de Genebra no qual condena a aplicação da negociação coletiva com o objetivo de flexibilizar direitos definidos em lei, na linha que estaria sendo seguida pela reforma brasileira. De acordo com o representante do Ministério Público do Trabalho, Renan Bernardi Kalil, o comitê deixou claro que a negociação coletiva foi concebida para estabelecer condições de trabalho mais favoráveis do que aquelas estabelecidas em lei, “não para rebaixar direitos”.

- Cria-se uma situação em que trabalhadores não vão mais querer usar a negociação coletiva. O instrumento terá sua credibilidade afetada diante da sociedade, ficando prejudicado o processo de pacificação social, que é, afinal, o que se deseja – criticou.

A vice-presidente da Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho, Noemia Aparecida Garcia Porto, foi enfática ao dizer que o projeto afronta tanto a Constituição como as Convenções da OIT, a exemplo da Convenção 98, que trata do direito de organização e de negociação coletiva. Observou que o texto acaba com o sistema obrigatório de financiamento dos sindicatos, mas sem definir transição ou soluções alternativas. Na prática, concluiu, haverá o desmantelamento da representação dos trabalhadores, uma “ofensa à liberdade sindical”.

- Preponderaria, sem dúvida, um sistema anômalo, muito mais grave para a liberdade sindical do que o atualmente vigente - afirmou.

Para Noemia,  o resultado geral da reforma é a descaracterização do "caráter protetivo" do Direito do Trabalho no Brasil. Como exemplo, destaca a precarização das normas relativas à segurança e saúde no trabalho, com a admissão da possibilidade de negociação sobre o grau de insalubridade, o pagamento por produtividade e a prorrogação da jornada em ambientes insalubres sem licença prévia dos órgãos competentes.

Críticas a relator

A audiência foi sugerida pelo senador Paulo Paim (PT-RS), que também dirigiu os trabalhos. O objetivo foi debater as reformas previdenciária e trabalhista, esta com base em princípios definidos em diversas convenções da OIT. Logo no início foi lembrado que a suposta chancela da OIT ao projeto da reforma trabalhista constou do relatório do senador Ricardo Ferraço (PSDB-ES) à Comissão de Assuntos Econômicos (CAE), onde a matéria já foi aprovada. Ferraço também é o relator na Comissão de Assuntos Sociais (CAS), que deve votar a proposta nesta terça-feira (20).

Antônio Lisboa, da Central Única dos Trabalhadores (CUT), disse que habitualmente a OIT relaciona casos para debate durante suas conferências e que, a partir de denúncia feita pelas centrais sindicais, a reforma trabalhista brasileira chegou a ser cogitada para entrar na lista desse ano, mas acabou ficando de fora dos 24 casos finalmente abordados. A seu ver, por “ignorância ou estupidez”, o relator Ferraço interpretou que essa exclusão significou o arquivamento do caso e uma espécie de aval da entidade ao projeto.

- O que posso assegurar é que a imagem do governo brasileiro, se já era ruim, piorou ao se expor a organização internacional desse modo – afirmou.

Lisboa reconheceu que, de todo modo, a reforma em debate no país motiva atenção no exterior. Segundo ele, o “capital internacional” tem profundo interesse na aprovação, pois o que passar no Brasil servirá de modelo para outras partes do mundo. Mas salientou que as centrais sindicais continuam firmes no propósito de derrubar a reforma, inclusive renovando a denúncia já feita à OIT caso o projeto seja aprovado.

Álvaro Egea, da Central dos Sindicato Brasileiros também condenou a afirmativa de que a OIT apoia a reforma trabalhista. Disse que a proposta tem “vício de origem”, pois não passou pelo “diálogo social”. Segundo ele, as mudanças só atendem ao empresariado, interessado em acabar com as leis trabalhistas para restabelecer o “regime de escravidão” no país.

Greve geral

Paim, em diversos momentos, disse que o presidente Michel Temer não tem credibilidade para liderar reformas que afetam tão profundamente os direitos dos brasileiros. No caso da Previdência, voltou a condenar os argumentos de que o sistema seja deficitário, apontando como problema maior os desvios e a falta de gestão. Pediu para que os eleitores pressionem os senadores de seus estados para rejeitar a proposta, além de pedir apoio à próxima greve geral contra as reformas, programada para 30 de junho.

- Temer é quem está capitaneando as duas reformas. Faz delas seu ‘cavalo de Troia’, vendendo uma imagem bonita para liquidar os interesses do povo, tanto de quem trabalha quanto de quem um dia quer se aposentar – acusou Paim.

Para Alexandre Caso, da Intersindical - Central da Classe Trabalhadora, o que está acontecendo no país é continuidade de um “golpe”. Observou que os brasileiros que elegeram a chapa da presidente Dilma Rousseff não votaram no programa de reformas que agora Temer, o vice “traidor”, trabalha para aprovar.

Agência Senado (Reprodução autorizada mediante citação da Agência Senado)