Órgãos de controle defendem eficácia da fiscalização financeira no país

Da Redação | 10/05/2017, 16h06

Para os senadores, um saldo da Operação Lava Jato é que o sistema de controle de atividades financeiras do país é frágil e ineficaz, porque não detectou o grande volume de recursos movimentado pelos agentes da corrupção. Participantes de audiência pública na Comissão de Transparência, Governança, Fiscalização e Controle e Defesa do Consumidor apontaram a necessidade de aliar a eficácia dos órgãos de controle à transparência à participação da sociedade civil no combate à corrupção. A audiência, realizada nesta quarta-feira (10) discutiu atual o modelo de fiscalização de movimentações financeiras no Brasil.

O presidente da comissão, senador Ataídes Oliveira (PSDB-TO), falou, no início da audiência, que a operação mudou completamente o patamar com que se enxerga o fluxo de dinheiro ilícito no país.

— Oficialmente, só o montante de corrupção já formalmente reconhecido e contabilizado pela Petrobras foi de R$ 6,2 bilhões. Mas um laudo pericial da Polícia Federal estima um prejuízo total de R$ 42,8 bilhões. E isso é só a ponta do iceberg, nós sabemos disso — afirmou o senador.

— O modelo de fiscalização de movimentações financeiras ilícitas no Brasil está em xeque: a Operação Lava Jato tem demonstrado que um enorme volume de recursos tem circulado de forma ilícita, à revelia dos órgãos fiscalizadores tributário, bancário, cambial e do mercado mobiliário. Diante disso, o cidadão fica intranquilo: como é que tanto dinheiro circula entre agentes da ilicitude, dentro do País e para o exterior? Como é que ninguém percebeu? — indagou Ataídes.

Mas, para os representantes dos órgãos de controle, o sistema de fiscalização funciona bem no país. Eles acreditam que algumas melhorias na legislação e a participação da sociedade civil podem ajudar o sistema a melhorar ainda mais.

Prevenção à lavagem

O presidente do Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf), do Ministério da Fazenda, Antonio Gustavo Rodrigues, afirmou que o sistema de prevenção à lavagem de dinheiro segue um padrão internacional e é bastante completo.

Mas, segundo Antonio Gustavo Rodrigues, um dos principais problemas é a dificuldade causada pelo uso do dinheiro em espécie. Este meio é o preferido para a lavagem de dinheiro, porque não é rastreável em geral. Para Antonio Gustavo Rodrigues, o país deveria tentar restringir ao máximo o uso do dinheiro em espécie, acabando, por exemplo, com a emissão de notas de alto valor, a exemplo do que foi feito na Índia.

O presidente do Coaf justificou que foi em virtude do controle que existe hoje no Brasil, que se iniciou a Operação Lava Jato. Ele informou que o Coaf já produziu 681 relatórios relacionados à Lava Jato. Mesmo afirmando que o sistema atual funciona, ele acredita que seriam necessárias medidas legais que apoiem o esforço da fiscalização.

— O que a gente pode dizer com orgulho é que o sistema funcionou. Se o senhor me perguntar se o sistema é perfeito, eu não vou dizer que é, não, porque tem um monte de falhas. Agora, há coisas que têm que se fazer também, aí eu diria, criar projetos de lei, etc, que apoiem esse esforço — afirmou.

De acordo com a chefe do Departamento de Supervisão de Conduta do Banco Central do Brasil (BC), Andreia Vargas, a instituição avalia de forma sistemática os controles internos adotados pelas entidades supervisionadas e, desde 2012, disponibilizou 106 tipos de sinais de alerta das operações para uso das instituições financeiras.

— De 1998 a 2016, foram quase 8 milhões de comunicações de alerta ao Coaf, 670 mil caracterizadas como situações atípicas e 7,3 milhões relativas a operações em espécie acima de R$ 100 mil — afirmou Andreia.

Empresas de fachada

Ao responder questões do senador Ataídes Oliveira sobre a ausência de ação da Receita no combate à corrupção e a capacidade que tem de identificar operações suspeitas de empresas como a Odebrecht, o subsecretário de Fiscalização da Receita Federal, Iágaro Jung Martins, lembrou que foi a própria Receita, em 2014, que identificou o primeiro uso de empresas de fachada para a aquisição de navios-sonda. Além disso, a maior parte das operações da empresa foi feita no exterior, lembrou.

Essas “falsas empresas” só existem no papel, para emitir notas fiscais e inflar artificialmente o balanço de despesas de grandes corporações, e são chamadas de “noteiras”, explicou. A alteração nas normas da Receita está permitindo que essas noteiras sejam consideradas inidôneas mais rapidamente, impedindo a emissão de notas fiscais e dificultando o mascaramento da contabilidade.

— Na Odebrecht, no caso da Lava Jato, existem aproximadamente 100 noteiras. A partir desse aprendizado, identificamos no Brasil outras cinco mil — informou.

Iágaro disse que a partir de 2018 o Brasil vai ser municiado com dados financeiros importantes de contas de residentes tributários dos diversos signatários do acordo Padrão de Declaração Comum (Common Reporting Standard - CRS), do qual o Brasil começou a fazer parte no fim de 2016. Haverá um intercâmbio automático de informações financeiras para fins tributários. O Brasil receberá dados sobre qualquer tipo de operação financeira ou contas que os seus residentes tributários mantenham em um dos 103 países do acordo, assim como enviará informações de operações feitas em território brasileiro sobre os residentes tributários de outros países. China, Hong Kong, Bélgica, Reino Unido, Espanha, Mônaco e Suécia são alguns deles

— Vamos ter, a partir do ano que vem, informações do calendário ano-base 2017, uma seleção dedutiva; vou pegar os casos mais relevantes e vou identificar. Os instrumentos de controle serão mais violentos, mais fortes. Eles vão ter que escolher uma praça que não faça parte dos países de primeira linha, pois eles estão sujeitos ao CRS. Vai ter que escolher um país que não esteja, o Iraque, por exemplo, e correr o risco de não conseguir sacar o dinheiro — explicou.

Já de acordo com o superintendente de Relações com Empresas, da Comissão de Valores Mobiliários (CVM), Fernando Vieira, não é possível classificar a CVM de “omissa” em relação aos últimos episódios de corrupção identificados no país, como questionou Ataídes Oliveira, já que o seu principal ativo é a transparência de dados e acessibilidade de informações das 650 empresas registradas, e nisso não houve falhas.

— A CVM não falhou, mas, em minha opinião, está sempre evoluindo, e todos esses casos contribuem para que fazermos revisão e vermos se há algo mais a fazer. Isso é continuo, e como já se falou aqui, a criatividade do criminoso é infinita — disse.

Sonegação

Para Luiz Henrique Franca, do Sindicato Nacional dos Auditores Fiscais da Receita Federal (Sindifisco Nacional), é preciso combater a cultura da sonegação no Brasil, incentivada pela falta de punição criminal, segundo a Lei 9.249/1995.

— A manutenção desse absurdo no ordenamento legal, ao longo desses mais de 20 anos, não só torna a sonegação um excelente negócio no nosso país, como fragiliza o sistema de fiscalização tributária — afirmou.

Participação popular

De acordo com Manoel Galdino, da ONG Transparência Brasil, somente com a participação da sociedade civil, a corrupção poderá ser combatida. Ele disse que é impossível para o Estado fiscalizar tudo e que a população pode ajudar nesse processo, conseguindo informações mais ricas sobre as instituições.

Manoel Galdino apontou a necessidade de uma definição legal para o beneficiário final de empresas. Ele mencionou  projeto de lei, aprovado na Câmara e em tramitação no Senado, que tem a definição legal para beneficiário final.

— A gente precisa disso para que a gente possa saber de fato quem é beneficiado por empresas que hoje são usadas por laranjas para esconder crimes. Então, não sabemos hoje quem é o beneficiário final dessa empresa, que pode ser um político, pode ser um empresário, pode ser alguém que está envolvido em alguma atividade ilícita — afirmou.

Agência Senado (Reprodução autorizada mediante citação da Agência Senado)