Terceirização da gestão da saúde primária no DF é criticada em comissão

Da Redação | 23/06/2016, 15h10

Em audiência pública na Comissão de Direitos Humanos e Legislação Participativa (CDH), nesta quinta-feira (23), o senador Hélio José (PMDB-DF) afirmou que vai pedir informação para o Governo do Distrito Federal (GDF) sobre a decisão de gastar com hora extra em vez de contratar novos servidores para a área de saúde. Segundo o senador, esses dados podem servir de subsídio para a instalação da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) das Organizações Sociais (OSs).

O tema do debate foi a atenção primária na saúde do Distrito Federal, que poderá ser gerenciada por organizações sociais, de acordo com proposta do GDF. Hélio José disse que ele, Reguffe (sem partido-DF) e Cristovam Buarque (PPS-DF) são contrários a essa proposta, que, segundo o senador, vai resultar em prejuízo para trabalhadores e atendimento na saúde.

— Nós somos radicalmente contra a OS na saúde pública do Distrito Federal. Achamos que essa questão de OS é para prejudicar os trabalhadores da saúde e o atendimento à saúde no DF. Organização Social em área complementar é uma coisa. Agora, nós não temos condições de ser coniventes com OS para atendimento primário — disse Hélio José.

Nomeações

De acordo com o vice-presidente do Sindicato dos Auxiliares e Técnicos de Enfermagem do DF, Jorge Viana, os servidores da Saúde no DF “não são tratados como seres humanos, mas como máquinas e horas”. Ele disse que em janeiro de 2016, houve 1.455 nomeações e, em março, 588, para suprir os contratos temporários. Mas, em 2015, houve 800 aposentados e, em 2016, 80.

— Trocando em miúdos, o que foi convocado e o que saiu não cobriu o deficit. E o governo sai dizendo por aí que nós tivemos mais de mil nomeações. Mas essas nomeações não supriram nem os aposentados. E se nós conseguirmos aposentadoria especial de 25 anos de serviço, nós temos aí mais de 30% da Secretaria de Saúde que estão prontos para se aposentar — afirmou.

Viana explicou que a própria Secretaria de Saúde, por meio da Subsecretaria de Gestão de Pessoas (Sugep), fez uma nota técnica mostrando que, há mais de cinco anos, o GDF paga aproximadamente R$ 13 milhões por mês com horas extras. Segundo ele, a Secretaria de Saúde levantou que, com a diminuição das horas extras, seria possível nomear 1.966 novos servidores a um valor de R$ 7,9 milhões e ainda sobrariam R$ 4,5 milhões para completar as horas extras.

Lavagem de dinheiro

Ao criticar o modelo de gestão por meio das Organizações Sociais (OS), a presidente do Sindicato dos Enfermeiros do DF, Dayse Diniz, afirmou que, onde foram instaladas, serviram para lavagem de dinheiro e desmonte do Sistema Único de Saúde (SUS). Por isso, não devem ser aceitas no Distrito Federal, como defende o governo de Rodrigo Rollemberg.

— OS é para quem quer roubar ou deixar roubar para pagar dívida de campanha — acusou.

A profissional criticou a atual gestão da saúde em todo o país, que não se foca na atenção básica. Segundo Dayse, esses cuidados primários seriam a solução para a crise enfrentada pelo setor, já que haveria a proteção integral, com acompanhamento, diagnóstico, tratamento e assistência integral aos cidadãos, sem foco medicamentoso, na doença, mas na prevenção. Para ela, entretanto, esse modelo não vai ser instalado enquanto perdurar o forte lobby das indústrias farmacêuticas e dos empresários do setor hospitalar para manter o modelo “hospitalocêntrico”, que gera mais lucro.

Também crítico do modelo de gestão do SUS, Helvécio Ferreira, presidente do Conselho de Saúde do DF, afirmou que a oferta de serviços do sistema é apartada da real necessidade da população. Um dos principais motivos para isso é o pouco controle dos dados e informações, que são desencontradas, o que afeta a gestão. Segundo Helvécio, nesse ponto, o setor público é refém da tecnologia de terceiros, que sempre agem movidos pelo lucro. Helvécio também reprovou a mudança de política de funcionamento das unidades básicas a cada novo governo e defendeu as equipes interdisciplinares e a possibilidade de outras categorias profissionais, como psicólogos, enfermeiros, fisioterapeutas poderem atuar sem a necessidade de passar pelo médico, porque esse modelo “está exaurido”.

Números

A coordenadora-geral de Gestão da Atenção Básica do Ministério da Saúde, Mônica Kafer, defendeu o sistema de atenção básica como grande redutor dos gastos com saúde. Segundo pesquisa do Banco Mundial, em média 30% das internações hospitalares poderiam ser evitadas com saúde primária forte, o que gera 21% de economia com gastos públicos em hospitais e de 15% das despesas gerais de saúde.

Mônica informou que o país conta hoje com 72% de cobertura da atenção básica, incluindo o Saúde da Família e equipes de atenção tradicional, como ginecologistas, obstetras, pediatras e clínicos gerais. Dessa cobertura, 62% é feita com equipes de Saúde da Família. São 39 mil equipes, 700 mil profissionais atuando na atenção básica e atendendo 120 milhões de pessoas. No Distrito Federal, a cobertura da atenção primária chega a 54,4%, sendo 31,1%, ou cerca de 280 equipes, da Saúde da Família.

O outro lado

O coordenador de Atenção Primária da Secretaria de Saúde do DF, Marcus Quito, reconheceu que a secretaria não está conseguindo garantir o direito à saúde à população. Ele mostrou fotos de unidades de atenção primária à saúde no Distrito Federal sem nenhuma estrutura e de outras que, apesar de uma boa estrutura, não possuem qualidade de atendimento.

Quito disse que 65% dos atendimentos em prontos-socorros nos hospitais poderiam ser feitos em unidades de atenção primária, o que sobrecarrega o sistema. Além disso, mostrou outros problemas, como a falta de profissionais na área de Saúde da Família, e disse que o governo tem o dever de mudar a realidade da atenção primária. Ele defendeu a discussão do modelo de gestão por OSs.

— Ter uma OS não significa reduzir o tamanho do SUS. É isso que nós precisamos discutir. Como isso funciona? Todo mundo tem que participar dessa discussão. Ou nós queremos permanecer do jeito que nós estamos? — questionou.

O senador Hélio José reiterou ser contra o modelo de gestão da atenção primária por OSs, mas disse que é importante discutir o tema e que será feito um seminário no Senado para esse debate.

Agência Senado (Reprodução autorizada mediante citação da Agência Senado)