Práticas antissindicais da Nissan nos Estados Unidos são denunciadas na CDH

Da Redação | 11/04/2016, 17h34

A montadora Nissan viola princípios e normas internacionais sobre direitos trabalhistas ao obstruir a sindicalização de trabalhadores de sua fábrica de automóveis no estado do Mississipi, nos Estados Unidos.

Denúncia contra a multinacional Nissan, uma das patrocinadoras dos Jogos Olímpicos do Rio de Janeiro, foi feita por sindicalistas norte-americanos que participaram de audiência pública na Comissão de Direitos Humanos e Legislação Participativa (CDH) nesta segunda-feira (11). Segundo os sindicalistas, a montadora Nissan viola princípios e normas internacionais sobre direitos trabalhistas ao obstruir a sindicalização de trabalhadores de sua fábrica de automóveis no estado do Mississipi, nos Estados Unidos.

Quem sugeriu o debate foi o presidente da CDH, senador Paulo Paim (PT-RS), em resposta a pedido de entidades sindicais brasileiras solidárias com a United Auto Workers (UAW), entidade sindical norte-americana que representa trabalhadores do setor automobilístico, e a IndustriALL Global Union (IGU), que congrega federações de trabalhadores da indústria de 140 países.

— Os direitos humanos são universais e lutamos para que os direitos dos trabalhadores também sejam. Estamos juntos nessa caminhada — afirmou Paim, lamentando a postura adotada na filial americana da multinacional de origem japonesa, hoje controlada pela Renault.

Constrangimentos

De acordo com os sindicalistas, os empregados são submetidos a constrangimentos desde que começam a trabalhar na unidade, na cidade de Canton, onde atuam cerca de cinco mil trabalhadores, a maior parte terceirizados. Uma das táticas seria obrigá-los, ainda em treinamento, a participar de sessões de vídeos com conteúdos que desqualificam os sindicatos. Os vídeos também disseminam a ideia de que a fábrica pode até ser fechada, com mudança da linha de produção para o México, se a empresa ficar sujeita a pressões sindicais.

As pressões seriam também exercidas pelos supervisores, obrigados a chamar os empregados para conversas individuais que seriam utilizadas para reforçar a mensagem de que a sindicalização pode resultar em desemprego. Foi o que revelou a diretora de Relações Internacionais da UAW, Kristyne Peter.

— Isso não é problema de alguns supervisores, mas o resultado de uma política corporativa —  acusou Kristyne.

Longas jornadas

Entre as queixas relatadas pelos sindicalistas estão jornadas prolongadas e trabalho por até 22 dias seguidos, sem folga, além de problemas de segurança e saúde no trabalho. A avaliação é de que as negociações coletivas por meio do sindicato seriam mais vantajosas do que acordos negociados diretamente pelos empregados com a empresa.

Betty Jones, empregada da fábrica, classificou de “sombrias” as práticas antissindicais da Nissan. Ativista sindical, ela disse que logo depois da exibição dos vídeos as chefias constrangem o empregado com pedido para que opinem sobre o conteúdo apresentado. Também reprimem o uso de broches ou camisas que citam o sindicato, assim como qualquer tipo de conversa sobre sindicalização, mesmo no intervalo de almoço.

— Sei que não posso me dar ao luxo de perder meu emprego, mas sei também que preciso lutar. Não vou deixar que me calem, não vou permitir — disse Betty Jones.

Manipulação

O diretor de Organização Sindical da UAW, Richard Bensiger, disse que a organização não está em campanha contra a Nissan, mas contra o seu padrão de relações com o sindicalismo, a seu ver na contramão da qualidade de seus carros. Segundo ele, a empresa tem utilizado serviços de escritórios de advocacia para “manipular” empregados e evitar que se organizem em sindicato. A empresa já recusou a oferta de mediação feita pelo governo dos EUA para pôr fim ao longo conflito relativo às práticas antissindicais.

Bensiger criticou ainda a posição assumida pelo presidente da empresa, Carlos Ghosn, quando prestou depoimento no parlamento da França sobre as ocorrências nos Estados Unidos. Ele foi chamado em razão do controle acionário da empresa ser hoje da francesa Renault, que por sua vez tem mais de 30% de participação estatal. Nascido no Brasil, mas naturalizado francês, Ghosn se defendeu dizendo que a empresa cumpre fielmente a legislação trabalhista norte-americana.

Também participou da audiência Frank Figgers, ativista vinculado a organização que reúne clérigos e associações comunitárias do Mississipi, que prestam apoio aos trabalhadores da Nissan. Ele disse que o Mississipi, berço da luta pelos direitos civis sob a liderança de do reverendo Martin Luther King Jr (1929-1968), deve continuar lutando para garantir justiça social para seus trabalhadores.

— Não às ameaças, não à intimidação, não à violência — cobrou.

Olimpíadas

No Brasil, as entidades sindicais engajadas na luta em favor dos trabalhadores do Mississipi estão aproveitando os eventos relacionados às Olimpíadas para campanhas de denúncia contra a empresa. Em fevereiro houve um protesto em frente à sede do Comitê Olímpico, no Rio. A organização dos jogos foi cobrada a exigir da montadora o cumprimento das mesmas regras de responsabilidade social e respeito aos trabalhadores aplicáveis a toda a cadeia de fornecedores do evento.

O brasileiro Marino Vani, que ocupa o cargo de secretário da IndustriALL Global Union, salientou que as organizações sindicais apoiam os Jogos Olímpicos do Rio, mas com participação de empresas que tenham responsabilidade social “como princípio e prática”. Outros sindicalistas afirmaram que as manifestações vão continuar ao longo do evento. Na audiência, um cartaz exibido pelos sindicalistas desafiava a empresa com uma questão: “Cadê o espírito olímpico, Nissan?”

Ao explicar o engajamento das entidades sindicais brasileiras, os sindicalistas salientaram a importância de se evitar retrocessos no Brasil, onde a estrutura sindical conta o apoio de regras protetivas estipuladas em lei. O presidente da União Geral dos Trabalhadores (UGT), Ricardo Patah, salientou o “incômodo” causado por medidas antissindicais praticadas por multinacional dirigida por um executivo sempre lembrado por sua origem brasileira.

— Seu compromisso maior deveria ser com que a empresa se curvasse ao que é o mais sagrado, o respeito aos trabalhadores — cobrou.

Entre as deliberações da audiência, ficou decidido que a CDH buscará o apoio de outros membros do Senado no sentido de sensibilizar o presidente da Nissan, Carlos Ghosn, a abrir caminho para o diálogo entre os trabalhadores do Mississipi e a direção da fábrica nos Estados Unidos. O Comitê Olímpico também será procurado por Paim, que foi convidado pelos sindicalistas norte-americanos a ir ao Mississipi.

Agência Senado (Reprodução autorizada mediante citação da Agência Senado)