Para analistas, país deve buscar política externa menos ideológica e mais pragmática

Marcos Magalhães | 06/11/2014, 15h25

Em seu segundo mandato, a presidente Dilma Rousseff deveria buscar uma política externa menos ideológica e mais pragmática. Esta foi a principal reivindicação de dois convidados a uma audiência pública sobre o tema realizada nesta quinta-feira (6) pela Comissão de Relações Exteriores (CRE): o jornalista William Waack, da TV Globo, e o analista Murillo de Aragão, presidente da Arko Advice Pesquisas. A audiência foi solicitada pelo presidente da comissão, senador Ricardo Ferraço (PMDB-ES).

Na opinião de Waack, a política externa implantada nos últimos anos estaria levando o Brasil ao que chamou de “irrelevância relativa”. Um dos principais problemas do país, a seu ver, é a indefinição sobre o papel que pretende exercer no cenário internacional. Como vantagens do país ele citou a “extraordinária posição geográfica” e o fato de se encontrar distante de qualquer conflito internacional relevante. Como desvantagem, mencionou a adoção nos últimos 12 anos de uma política externa mais partidária do que de Estado.

— O que o Brasil quer ser no mundo? O que vemos é uma apropriação da política externa por um grupo político, o PT. Na opinião desse grupo, a supremacia de uma superpotência cedeu lugar a uma rearticulação em um mundo multipolar, no qual outros países se juntam para enfrentar a superpotência. Trata-se de uma visão completamente equivocada, que deixa de lado um princípio fundamental, segundo o qual política externa não é feita por amizades, mas por interesses. Um erro de amadores — definiu.

Ele citou como exemplo o Brics, grupo político formado por países considerados emergentes — Brasil, África do Sul, Rússia, Índia e China. Ao contrário do que sugerem os defensores de uma política de aproximação com o chamado Sul, em contraposição a um Norte de países desenvolvidos, o jornalista observou que países como Rússia e China entendem o significado da expressão “balanço de poder” e negociam questões importantes diretamente com os Estados Unidos, quando é necessário.

— Se perguntarmos a russos e chineses se existe um eixo (a partir da formação do Brics), isso vai provocar um sorriso de sarcasmo ou de certa pena — afirmou Waack.

Soft Power

Em sua exposição à comissão, Aragão admitiu que o Brasil obteve maior expressão internacional a partir da abertura econômica, das privatizações, da redução da desigualdade e de um ambiente macroeconômico de “maior qualidade”. Ele alertou, porém, para o fato de que o país permanece muito fechado, com pequena participação no comércio internacional. O analista defendeu a adoção de uma nova relação com os Estados Unidos, sem deixar de lado a aproximação com a América do Sul, a Europa e a Ásia.

Como observou Aragão, o Brasil não pode construir muros para conter possíveis futuros fluxos migratórios em direção ao país. Por isso, advertiu, não há como se estabelecer uma visão de desenvolvimento para o Brasil sem considerar a inserção do país na América do Sul. Em sua opinião, o Brasil deveria inclusive aprofundar o diálogo com os Congressos Nacionais da região e adotar rapidamente as regras necessárias à eleição direta de representantes para o Parlamento do Mercosul (Parlasul). Tudo isso levando em conta o crescente apelo cultural e turístico do país, que em 2016 vai sediar os Jogos Olímpicos.

— Precisamos fortalecer imagem do Brasil como soft power. O Brasil tem uma agenda positiva, não tem inimigos, mas ainda conta com presença ridícula no turismo mundial e no comércio internacional. Somos o país da bossa nova, do samba, do futebol, da moda. A questão internacional não é meramente diplomática ou comercial, transcende tudo isso — disse Aragão.

Ao abrir a reunião, Ferraço ressaltou a importância de promover uma discussão no Senado sobre os rumos da política externa brasileira.

— Ficaremos acomodados com o papel de fornecedor de matéria prima ou vamos desenvolver políticas internas que possam dar competitividade a nossos produtos e serviços? Nossa indústria continua dependente de América do Sul e, sobretudo, da Argentina, que vive problemas estruturais complexos. Nenhum de nós discute a importância do Mercosul, mas é óbvio que o Mercosul está sangrando. Mais de 500 acordos comerciais já foram firmados nos últimos anos, mas nós só temos acordos com Egito, Autoridade Palestina e Israel. O Mercosul também não sabe o que quer ser no mundo — advertiu Ferraço.

Agência Senado (Reprodução autorizada mediante citação da Agência Senado)