A permissão para que as companhias aéreas cobrem pela bagagem despachada, prevista numa nova regulamentação da Agência Nacional de Aviação Civil (Anac), recebeu fortes reações de parlamentares, membros do Ministério Público e consumidores. Um dia depois do anúncio das novas regras, em 14 de dezembro, o Senado aprovou um projeto de decreto legislativo vetando a cobrança. O PDS 89/2016 seguiu para a Câmara dos Deputados e, se for aprovado, passará a valer imediatamente, já que o Legislativo tem a prerrogativa de sustar regras de agências reguladoras.

O autor do projeto, senador Humberto Costa (PT-PE), afirma que, ao editar a Resolução 400/2016, a Anac não evidenciou estudos sobre a relação entre a extinção da franquia e a redução dos preços das passagens aéreas. Segundo o senador, a agência também não garantiu que as empresas de transporte aéreo reduzirão as tarifas ou oferecerão medidas compensatórias.

Para Humberto, a cobrança “representa um recuo grave para o direito do consumidor, no que tange à bagagem despachada, evidenciando restrição a direitos já estabelecidos”

O senador Jorge Viana (PT-AC) diz considerar a medida da Anac “abusiva e precipitada” e apoia o projeto.

Mercado

A ideia de pagar pelo serviço desagrada o advogado Raphael Milito. Passageiro frequente, ele teme que a mudança seja uma forma de as empresas aéreas tirarem mais dinheiro dos consumidores. Ele citou um voo local que fez nos Estados Unidos, e o valor do bilhete previa pagamento extra por bagagem despachada.

— Mesmo despachando duas malas, o valor foi ainda inferior ao de uma empresa concorrente. Lá, a competição é grande, e a lei do mercado se impõe. Mas, num país como o Brasil, onde temos poucas opções, fico desconfiado — diz.

O jornalista Maurício Nogueira é outro consumidor que não acredita na redução no preço das passagens. Para ele, embora siga a tendência internacional, a liberação da cobrança por bagagem prejudicará os brasileiros, que pagam cada vez mais taxas.

— A Anac sempre acena com a possibilidade da diminuição dos preços, mas não é isso que a gente vê após um tempo de implementação de uma medida.

A Associação Brasileira das Empresas Aéreas (Abear), que representa Latam, Gol, Azul e Avianca, informa que somente comentará o tema após a validação das novas regras.

O superintendente de Acompanhamento de Serviços Aéreos da Anac, Ricardo Catanant, diz que respeita as críticas, mas considera que elas sejam motivadas pela falta de compreensão sobre o assunto. Segundo ele, a mudança resultou de discussões com representantes da sociedade civil, do Ministério Público, da Câmara, do Senado e de órgãos de defesa do consumidor ao longo dos últimos cinco anos.

— Entendemos que os senadores são extremamente sensíveis aos pleitos da população, mas, ao mesmo tempo, a gente espera que este esforço de comunicação junto ao Congresso traga o entendimento sobre o benefício da medida — afirma.

Clareza

A Resolução 400/2016, apresentada pela Anac em 13 de dezembro, trouxe uma série de mudanças nas relações entre empresas e passageiros sob o argumento de que seria possível diversificar serviços, aumentar a concorrência e baixar preços. A agência considera que a medida colocará o Brasil em um patamar internacional, oferecendo maior clareza sobre os serviços cobrados e tranquilidade ao mercado, diminuindo questionamentos judiciais.

Entre as principais alterações está a desregulação da franquia de bagagens. Atualmente, as empresas são obrigadas a oferecer a todos os passageiros a possibilidade de despachar até 23 kg para voos domésticos e 64 kg para voos internacionais sem cobrança adicional. Com a nova regra, caberá às empresas decidir qual franquia de bagagem será oferecida.

De acordo com a resolução da Anac, as medidas passarão a valer nos casos de passagens vendidas a partir de 14 de março de 2017, quando se completam 90 dias da publicação do texto no Diário Oficial da União. No caso de bilhetes adquiridos antes dessa data, mesmo que o voo aconteça depois da entrada em vigor das novas regras, valem as atuais.

As empresas aéreas argumentam que a flexibilização de bagagens vai baratear as passagens de quem não despachar mala. De acordo com Catanant, a medida ajudará a diminuir os custos das empresas aéreas e, consequentemente, ampliar o acesso da população aos voos, a partir da redução dos preços.

— O número de pessoas que viajam de avião no Brasil ainda é inexpressivo. A aviação precisa crescer, especialmente num país onde o transporte aéreo para muitas regiões é uma necessidade — ressalta.

Ele explica, no entanto, que a Anac não pode garantir que os preços vão cair, porque fatores como o custo do petróleo e a cotação do dólar interferem nos valores repassados aos usuários. Segundo a agência, caso as mudanças não produzam os efeitos esperados, o texto da resolução poderá ser revisto.

Apenas a alteração na franquia de bagagem é alvo da suspensão proposta pelo projeto de Humberto Costa. As outras 18 medidas previstas no novo regulamento da Anac (veja ao lado) também devem entrar em vigor em março.

Mala extraviada

Entre elas, estão o aumento, de 5 kg para 10 kg, no peso mínimo permitido para bagagens de mão, e a redução no prazo para restituição de bagagens extraviadas, que passa de 30 dias para até 7 dias nos voos domésticos e 21 nos internacionais. Após esse prazo, se a bagagem não for localizada, as empresas aéreas terão no máximo uma semana para indenizar os passageiros.

O novo regulamento permite a correção de erros no preenchimento do nome do passageiro até a hora do check-in.

A Anac determinou que o consumidor tem direito a desistir da compra até 24 horas após receber o comprovante, caso ela seja feita com ao menos sete dias de antecedência.


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