O Governo Federal quer aumentar o número de adesões ao Programa Identidade Jovem, política pública destinada a cidadãos de 15 a 29 anos, estudantes ou não, pertencentes a famílias com renda mensal de até dois salários mínimos. Lançado em dezembro de 2016, o programa foi o primeiro que se seguiu à vigência do Estatuto da Juventude (Lei 12.852), aprovado no Senado em 2013 e sancionado no mesmo ano.

Por isso, desde março, uma caravana da Secretaria Nacional de Juventude tem percorrido todos os estados com o objetivo de levar informações sobre o documento ID Jovem, que dá direito a passagens de ônibus, trens e embarcações interestaduais gratuitas ou com 50% de desconto, meia-entrada em cinemas, teatros, shows e eventos esportivos, e isenção da taxa de inscrição no Exame Nacional do Ensino Médio (Enem).

De acordo com o secretário Nacional de Juventude, Francisco de Assis Costa Filho, 16 milhões de jovens se enquadram no perfil do programa. No entanto, apenas 230 mil haviam feito a inscrição até julho.

— O programa é recente e tem um público grande para ser atendido. Nosso objetivo é disseminar informações sobre a ID Jovem e aumentar o número de beneficiados. É um número que está em crescimento — analisa.

Dificuldades

A assistente social Natália Cristina de Lima, de 22 anos, de Brasília, foi pioneira na utilização da ID Jovem. Recém-formada, ela conta ser usuária assídua dos benefícios, principalmente das passagens gratuitas, que utiliza para prestar concurso em outros estados.

— Se eu fosse pagar passagens para realizar as provas, não teria como ir. A ID Jovem me dá segurança. Eu posso contar com isso, o que facilita muito meus planos. Com a ID Jovem, não fico limitada a minha condição social — afirma Natália.

O cumprimento desses direitos, no entanto, ainda precisa ser cobrado, lamenta a assistente social, que relata casos de resistência por parte das empresas.

— Um amigo tentou obter uma passagem gratuita e a empresa negou. Denunciamos na Agência Nacional de Transportes Terrestres [ANTT] e a empresa foi notificada. Hoje, nas rodoviárias grandes, a lei já está sendo cumprida. O problema acontece ainda nas rodoviárias do interior — reclama.

Segundo o Estatuto da Juventude, no sistema de transporte coletivo interestadual, as empresas são obrigadas a disponibilizar duas vagas gratuitas por veículo e duas vagas com desconto de no mínimo 50% no valor das passagens. Segundo a ANTT, desde o lançamento do programa até o final do mês passado, foram registradas cerca de 950 reclamações relacionadas a esse direito. Caso o descumprimento da lei seja comprovado pela agência, as empresas podem ser multadas entre R$ 3 mil e R$ 5 mil.

O secretário explica que, em caso de negação dos benefícios, é recomendado que o jovem solicite o motivo da recusa por escrito, com data, hora e local, uma vez que as empresas precisam comprovar que realmente atenderam os espaços reservados pelo estatuto.

Se, mesmo assim, o solicitante desconfiar da conduta da empresa, deve denunciar o ocorrido à ANTT ou à Agência Nacional de Transportes Aquaviários (Antaq), dependendo do caso. Em eventos culturais, se houver recusa na emissão de ingresso com 50% de desconto, a reclamação deve ser feita ao Procon.

Quem paga a conta

A Associação Brasileira das Empresas de Transporte Terrestre de Passageiros (Abrati) ajuizou no Supremo Tribunal Federal em fevereiro uma ação de inconstitucionalidade contra o artigo 32 do Estatuto da Juventude, exatamente o que assegura a jovens de baixa renda vagas gratuitas ou com desconto nos ônibus interestaduais, alegando a falta de subsídio para compensação dos valores das passagens.

Para a Abrati, “o cumprimento do benefício, desacompanhado de mecanismo de ressarcimento ao prestador privado do serviço, faz com que os custos da gratuidade sejam repartidos pelos demais usuários, impulsionando a revisão tarifária, o que, consequentemente, frustra o acesso aos serviços daqueles não alcançados pela graciosidade”.

A tese apresentada pela associação é contestada pela Advocacia-Geral da União, explica o secretário nacional de Juventude:

— A Abrati alega desequilíbrio de contratos. Isso para nós é uma tese jurídica refutável porque o transporte é de origem pública, ou seja, as empresas receberam uma concessão para executar um serviço público. Não dá para a gente falar apenas em lucratividade em um serviço prestado por meio de concessão. A responsabilidade social do país precisa ser de todos.

A polêmica em torno da responsabilidade sobre o custeio dos direitos que o estatuto prevê é histórica, conforme explica o consultor legislativo do Senado Eurico Antônio Gonzalez. Os brasileiros compreendem a necessidade de reformar costumes a partir de uma legislação mais esclarecida, mais includente, que aumente o poder social e econômico do país, mas se recusam a pagar a conta.

— Direitos têm custos. Nós vivemos em uma época social democrata, na qual há a crença, a meu juízo correta, de que existem dívidas sociais, de que não vivemos em uma sociedade igualitária e de que deveríamos nos envergonhar disso. Ainda assim, não existe um consenso de que os recursos públicos, e mesmo os sacrifícios que se peçam das empresas privadas, devam ser voltados para a realização desses grandes ideais políticos de igualdade e de reconhecimento — observa Gonzalez.

O cadastro no programa é feito por meio do site da Caixa ou pelo aplicativo ID Jovem, disponível para smartphones nos sistemas Android e iOS. Para se inscrever, é preciso ter em mãos o Número de Identificação Social (NIS) e o nome da mãe.

Rene Barbosa, de 19 anos, do Ceará, mesmo informando todos os dados exigidos, não conseguiu realizar o cadastro no aplicativo. O NIS não foi reconhecido.

— Faz dois meses que eu tento me inscrever e, quando eu vou concluir, a página mostra “cadastro não identificado”, como se meu NIS estivesse errado — conta o jovem.

O problema de Barbosa, muito provavelmente, está relacionado à atualização do NIS, explica o secretário Nacional de Juventude.

— O NIS é o CPF social. Por isso, precisa ser atualizado a cada 24 meses. O governo quer saber quem realmente se encontra em situação de vulnerabilidade social. Tem gente que há dois anos se encontrava nessa situação e hoje não está mais. Nesses casos, é recomendado que o jovem procure o Centro de Referência de Assistência Social mais próximo — explica Costa Filho.

A meia-entrada em espetáculos artístico-culturais e esportivos é um direito exclusivo de estudantes, idosos, pessoas com deficiência e jovens de 15 a 29 anos comprovadamente carentes, conforme prevê a Lei 12.933/2013. Por isso, todo evento precisa destinar a esse público 40% do total de ingressos.

Para driblar essa exigência, os produtores culturais têm duplicado o preço do ingresso e oferecido a meia-entrada para todos como “promoção”. Para se contrapor a essa estratégia, o presidente Michel Temer deve assinar até o fim do ano um novo decreto com regras adicionais, segundo Costa Filho:

— Se houver promoção de meia-entrada para todos, o estudante ou o jovem com a ID Jovem pagará metade daquela promoção que o empresário está ofertando. A meia-entrada é uma política pública que está na legislação e foi regulamentada. Não existe política pública para todo mundo.


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